Revista de Imprensa
Registos Audio Fotografias
dia 3 - 10.00
Sessão de Avaliação da UNIV
dia 3 - 12.30
Sessão Formal de Encerramento
dia 3 - 14.00
Almoço de confraternização com UNIVs de 2003, 2004 e 2005
O Estado: A máquina vista por dentro
 
Dep. Carlos Coelho
Peço desculpa dos 4 minutos de atraso com que iniciamos esta sessão, é a primeira e a última vez que nos atrasamos em sessões durante esta Universidade de Verão, acho que esta é mesmo a última sessão, portanto não é possível haver mais atrasos.

Vamos dar início a um tema que resultou da avaliação da Universidade de Verão 2005. Os vossos colegas em 2005 nas sugestões que deram no relatório final de avaliação, queixaram-se que não havia um tema sobre uma teoria geral do Estado, dizendo que a maior parte das pessoas, quer jovens quer menos jovens, agentes políticos não percebem como é que o Estado funciona, qual é a relação entre os órgãos de soberania, entre o diversos patamares de poder, etc., daí que tivéssemos incluído na estrutura desta Universidade de Verão pela primeira vez esse tema, chamámos-lhes “O Estado – a máquina vista por dentro”, e convidámos o Dr. Pedro Lomba, que simpaticamente aceitou o nosso convite a estar connosco.

O Dr. Pedro Lomba é conhecido, é um blogista, cronista, tem opinião publicada, é professor na Faculdade de Direito de Lisboa, e é membro suplente do Conselho Superior de Magistratura.

Tem como hobby a leitura, a leitura em casa sem telefonemas ou visitas impróprias, portanto nada de lhe telefonarem ou visitarem durante esses momentos, a comida referida é qualquer coisa que não tenha espinhas, portanto prevenimos que o cabrito essas coisas todas estarão dentro desta definição mais alargada, não tem nenhum animal preferido ou porque não gosta de nenhum ou porque gosta de todos, o livro que sugere é a Montanha Mágica, o filme que nos sugere é Autofocos, a principal qualidade que valoriza nas pessoas é a inteligência, mas a inteligência bem administrada e bem exibida.

Dr. Pedro Lomba muito obrigado por ter aceite o nosso convite, e a palavra é sua.
 
Dr.Pedro Lomba
Faz lembrar aquelas sessões do parlamento em que os deputados pedem para defender a honra.

Em primeiro lugar, queria agradecer o convite que me fizeram para estar aqui ao Carlos Coelho, ao Pedro Rodrigues, e o tema que me propuseram foi justamente falar sobre o Estado, o Estado visto por dentro, e o tipo de intervenção que eu pretendo aqui fazer, que eu vos pretendo propor é essencialmente uma intervenção tópica. A ideia que eu tenho é apresentar-vos um conjunto de reflexões sobre o estado do Estado, pensando que hoje em dia um debate político e a reflexão política e a reflexão ideológica têm no estado um dos seus objectos mais importantes.

E nesse sentido eu para me manter fiel a essa abordagem tópica que quero fazer vou apresentar um conjunto de pistas para nós reflectirmos e para discutirmos.

A primeira coisa que gostava de dizer, é sobre esta ideia de ver o Estado por dentro, que aparece no modo como o tema foi formulado. Há aquela metáfora que é mais ou menos assim: diz que uma árvore pode ser vista de muitas maneiras, mas quem está debaixo da árvore não vê a árvore.

E de facto ver o Estado por dentro e ver o estado por fora são coisas completamente diferentes. Quando falo em ver o estado por dentro, significa as pessoas que estão na máquina estatal, integram os órgãos da máquina estatal, e por outro lado as pessoas que estão fora dessa máquina, que vêm de fora, que a contemplam de fora.

E as duas perspectivas são perspectivas diferentes, porque o Estado visto de dentro não é certamente o Estado visto de fora, aquilo que parece normal para quem vê o Estado por dentro não é seguramente a mesma coisa para quem vê o Estado por fora.

Diria até que quem vê o Estado por dentro, ou para quem vê o Estado por dentro muitas vezes o anormal parece-lhe normal.

E portanto, eu corrigiria de alguma maneira o tema que me apresentaram, ver o Estado por dentro e sobretudo pensaria essencialmente nisto, no fundo o que nós precisamos é de uma reflexão sobre o tipo de Estado que nós queremos, o tipo de Estado, o tipo de problemas que queremos que o Estado enfrente, o tipo de estrutura que queremos que o Estado adopte.

Segunda ideia, dentro desta lógica porque no fundo eu não venha aqui ver o Estado por dentro, mas sim ver o Estado por fora, segunda ideia é a ideia de que o Estado não é uma máquina, não é um organismo. E isto é importante porque esta ideia de que o Estado é uma máquina, um organismo, tem muito a ver construções e metáforas biológicas sobre a origem do Estado, sobre a evolução do Estado.

Não sei se vocês estão a par disso, mas todas estas visões do Estado como máquina, como organismo, são coisas datadas, são coisas muito do século XIX, são coisas muito, há aquele filósofo alemão, o Engels que pensou o estado precisamente nestes termos, o Estado como organismo, o Estado como uma máquina.

E, todas estas ideias organicistas do Estado, têm sempre como pressuposto de que no confronto entre o Estado e a sociedade, nós devemos assumir uma defesa prioritária do Estado, nós devemos encarar o mundo político da perspectiva do Estado, nós devemos pensar a sociedade a partir do Estado.

E esta ideia, volto a repetir, esta ideia organicista, é uma ideia que me parece que acho que teve o seu tempo, é uma ideia que não nos interessa de todo, não nos interessa ver o Estado nesse sentido, como uma máquina. Todos esses tempos julgo eu, estão datados, e que tipo de Estado é que nos interessa? Interessa-nos um Estado que interaja permanentemente com a sociedade, interessa-nos um Estado que viva numa interacção permanente com a sociedade.

E esta interacção é uma interacção dinâmica e é uma interacção que levanta muitos problemas, como é evidente, mas é uma interacção que, na minha perspectiva, é cada vez mais acentuada e é cada vez mais importante para o tipo de Estado do século XXI.

Isto também leva-nos a recusar uma outra ideia, a ideia de um mundo libertário, quer dizer, a ideia de que no fundo, nós não precisamos do Estado, nós não precisamos de viver em nenhum Estado, quanto menos estado tivermos melhor, que é uma ideia muito libertária, por exemplo, muito americana, os americanos pensam frequentemente assim, não querem que o Estado lhes controle a vida, não querem que os Estado lhes impeça de ter armas, por exemplo como sabem o debate sobre o direito de uso e porte de arma na América, é um debate muitíssimo radical, e há organizações e associações nos Estados Unidos que recusam em absoluto que o Estado lhes proíba o direito de uso e porte de arma.

No fundo, esta ideia libertária é uma ideia que eu acho que também não nos interessa muito, porque é uma ideia que aponta para a menorização e para um paradigma segundo o qual o estado é irrelevante. Ora, o Estado não é irrelevante. O Estado continua a ser um factor muito importante para a construção de uma sociedade equilibrada e para a estabilização de uma ordem social.

Portanto, temos aqui dois paradigmas que eu recusaria em absoluto, porque de facto não nos serve, o tal paradigma organicista e o tal paradigma libertário. E hoje em dia o paradigma libertário acho que quem vê por exemplo alguns blogs na Internet, ou quem vê um certo discurso mais liberal da actualidade, é preciso ter algum cuidado, porque o discurso liberal que é um discurso que eu aceito e no qual me revejo, um discurso segundo o qual nós devemos diminuir e enfraquecer, no fundo concentrar o Estado na prossecução de um conjunto de tarefas essenciais. Este discurso é um discurso que levado ao extremo, leva-nos precisamente ao pensamento libertário, e o pensamento libertário é um pensamento que não só não tem grande lugar na Europa, porque é um pensamento muito americano, também não é um pensamento muito vendável. Quem tiver um discurso libertário em Portugal vai ter seguramente dois amigos, não vai ter mais do que isso.

E, portanto, eu preferira aqui assumir uma postura mais intermédia entre estes dois extremos.

Um terceiro tópico, um terceiro tópico para reflexão que eu aqui poria, tem a ver com esta coisa do peso excessivo do Estado. Porque nós, eu de alguma maneira, mesmo que hajam diferenças etárias com muitos de vocês, eu pertenço a uma geração que é parecida com a vossa, foi uma geração pós revolucionária, e o Estado antes do 25 de Abril, era o Estado autoritário, não era uma estado muito complexo nos serviços e nos benefícios sociais que prestava porque prestava poucos, só numa fase mais tardia do marcelismo é que começou a prestar, mas, era um Estado autoritário, e quando passámos para o regime político em que actualmente vivemos, o que houve? O Estado que tínhamos antes, o Estado que tínhamos antes do 25 de Abril era um Estado que não tinha legitimidade para fazer aquilo que fazia. O Estado que aparece depois do 25 de Abril, que é o Estado social que nós conhecemos, o Estado providência, que trata da educação gratuita, da saúde, da segurança social etc., é um Estado que também coloca problemas de legitimação muitíssimo forte.

O que é que é esta coisa da legitimação? É, o que é que justifica que o Estado no actual regime político, no actual regime democrático, tenha assumido tarefas de prestação pública, tarefas sociais que eram profundamente alargadas. Como é que isto se legitima? Que direito ou que justificação é que o Estado tinha para intervir em certa matérias, em certas áreas? Esta questão de legitimação é uma questão que curiosamente ninguém discutia, porque todos nós, pelos partidos políticos, sobretudo os partidos políticos mais à esquerda, consideraram que este Estado que eles tinham ajudado a construir era um Estado que não se discutia, era um Estado que não coloca problemas de legitimidade.

Ora, isto não é nada assim. Toda a intervenção do Estado, toda a intervenção pública precisa de ser legitimada, precisa de ser justificada.

Nós temos sempre que legitimar, que nos preocupar com a questão da legitimação, da justificação da intervenção do Estado.

E por isso, quando nós ouvimos dizer: o estado é gordo ou o Estado é excessivo ou o Estado tem um peso excessivo. É verdade, mas então, o problema tem que ser discutido nestes termos, nós temos que saber se esse peso excessivo tem ou não tem algum fundamento, nós temos que saber se as estruturas que engordam o Estado têm ou não têm algum tipo de legitimação, algum tipo de legitimidade, algum tipo de justificação.

E por isso, é um bocadinho radical às vezes dizermos, nós temos é que arrasar, hoje em dia há uam certa tendência um bocadinho bulldozer para ver os serviços públicos, que é vamos arrasar com todas as estruturas administrativas, todas as estruturas do Estado.

Calma! Vamos ter calma com esta revisão kamikasi de politica, vamos pensar, vamos ver em que área é que a intervenção pública tem fundamento, em que área é que essas estruturas públicas por si têm razoabilidade, e em que áreas é que elas não têm. A questão o peso excessivo do Estado tem directamente que ver com a eficiência.

Onde o Estado é eficiente, o Estado deve existir, e deve ser forte. Onde o Estado não é eficiente o Estado deve desaparecer. E portanto outra ideia que eu aqui traria era exactamente essa, era associar o problema do peso excessivo do Estado a uma reflexão sobre a eficiência desse mesmo Estado.

Até porque a questão da despesa pública tem a ver com isto, por exemplo nós gastamos tanto como a Finlândia em termos em educação, ou quase tanto, mas a Finlândia tem uma Educação fortíssima, e os nossos resultados em matéria de educação são resultados desastrosos. Os Finlandeses gastam cerca de 6% do PIB com a educação, nós gastamos 5,6%. Quer dizer, aqui têm um exemplo como a despesa pública não é uma despesa eficiente, não é eficientemente gerida, e portanto, temos que cortar, mas temos que cortar dentro desta lógica, dentro desta lógica de eficiência, não necessariamente numa lógica de, na tal lógica bulldozer que eu estava há bocado a referir.

Outra coisa, em quarto lugar, ainda nesta coisa do estado como é um Estado pesado que é o Estado que nós temos, e que é um Estado que precisa naturalmente e urgentemente de emagrecimento, se vocês por exemplo compararem o que era a Irlanda em meados dos anos 80, 1985-90, há muitas razões para o sucesso irlandês como é óbvio, uma delas é que os irlandeses falam inglês que é uma língua mundial e o português não é, embora seja uma língua muito falada mas o português é completamente diferente, de qualquer forma o sucesso irlandês tem a ver exactamente com políticas de emagrecimento e de diminuição da despesa pública que foram levadas a cabo na segunda metade dos anos 80, e tiveram frutos. Os irlandeses por exemplo não cresceram tanto como nós em termos económicos no final dos anos 80, mas conseguiram um patamar de crescimento económico à volta dos três virgula qualquer coisa, que lhes permitiu hoje em dia, em 2004-2005, crescer 4%, enquanto nós estamos estagnados.

Ou seja, o emagrecimento do Estado, a diminuição da despesa que os irlandeses seguiram deu resultado, sendo que a despesa pública que eles tinham era muito diferente, a lógica de eficiência que eles procuraram seguir, foi uma lógica que de facto lhes deu resultado.

O grande problema é que, no fundo, isto é uma banalidade, mas engordar é fácil, emagrecer é que é mais difícil, isto é válido para as pessoas e também é valido para o Estado.

Quanto mais o Estado aumenta o seu aparelho e a sua máquina, mais difícil é depois de um momento para o outro, diminuir e voltar a um patamar de racionalidade.

E por isso é que, eu acho que isso é uma coisa que nos interessa a nós, porque nós no fundo em certa medida e não quero aqui apelar em nenhum espécie de revolta colectiva, mas nós em certa medida pagamos alguns erros que foram cometidos por gerações anteriores. Há um princípio que se estuda na economia política que é o princípio que qualquer geração deve pensar nas gerações futuras e deve evitar tomar decisões que responsabilizem ou prejudiquem as gerações futuras.

Algumas decisões das gerações que nos precedem são gerações que nos penalizam directamente. A questão do aumento, da gordura que o Estado ganhou, o aumento da despesa pública resultaram de decisões que levianamente, nalguns casos, foram assumidas por gerações anteriores, e agora nós, em geral, vamos ter de pegar nisto e perceber como é que isso se resolve, sendo que como eu dizia engordar é fácil, emagrecer é difícil.

Porque emagrecer o que é que implica? Implica despedir pessoas, implica fazer transferências ao nível do Estado, implica criar instabilidade, e ninguém quer criar instabilidade. Vocês se falarem com as pessoas e lhes disserem: olhe, lamento imenso mas vamos ter que despedir estes funcionários. Não é o melhor caminho para se ser popular. A criação de instabilidade é um grande problema desta marcha-atrás que é preciso fazer.

No fundo, uma das coisas que nunca consegui perceber é porque é que a criação de um novo instituto público, a criação de um novo serviço público, a criação de uma nova estrutura administrativa nunca foi explicada, nunca foi justificada. Nunca foi justificada perante outros órgãos políticos, no parlamento, ou sempre foi escassamente justificada, ou foi sempre feita como se fosse uma coisa normal.

Para a criação de serviços, de institutos, de novas estruturas públicas, são sempre decisões complicadas, dentro do mesmo princípio que voltar para trás, recuar, emagrecer é sempre naturalmente muito mais difícil.

Aliás, há um exemplo que eu gostava de vos trazer, que é um que tem aspectos caricatos porque, e é um exemplo que ficou há uns tempos, quem está habituado à blogoesfera deve reconhecer imediatamente e identificar este exemplo, que é um exemplo do que é que era, suponho que ainda é, há um ano e tal, o Ministério da Agricultura. O Ministério da Agricultura tem um número muito acentuado de funcionários, são pessoas que trabalham, isso não vamos agora discutir, são milhares de pessoas que trabalham para o Ministério da Agricultura, mas vamos ver o que é que é o organigrama do Ministério da Agricultura, como é que isto está organizado.

E depois percebemos que há, secretários de estado, isso agora não interessa, como há hoje, e depois há serviços centrais, e um dos primeiros serviços só para ficarmos por aqui planeamento e político agro alimentar, isto é um serviço do ministério da agricultura, este gabinete tem várias direcções e divisões, tem uma direcção de serviço de assuntos europeus e relações internacionais, aliás não há serviço público que não tenha uma divisão de relações internacionais, é uma coisa engraçada, as pessoas devem estar constantemente em contacto com o exterior, esta divisão tem uma divisão de assuntos europeus, uma divisão de relações internacionais, uma divisão de cooperação para o desenvolvimento, etc., Depois entramos noutras divisões, isto não acaba, direcção de serviços de gestão e administração, divisão de formação e de gestão de recursos humanos, divisão de gestão financeira e controle orçamental, e por a fora e por aí fora.

Depois destas divisões há os chamados Serviços Operativos, há um que é Direcção de serviços estatísticos e gestão de informação, divisão de estatísticas agrícolas, mercados agro alimentares, como vêem isto é uma coisa altamente complexa.

Depois entramos na direcção de serviços de produções vegetais, a direcção de serviços de produtos vegetais está dividida em várias divisões, divisão de culturas arvenses, divisão para o azeite e azeitona, divisão de açúcar, tabaco, banana, têxteis e outras, divisão de frutas hortícolas e flores.

Porque é que não se une isto tudo numa só coisa, quer dizer, porque é que tem de haver uma divisão para as hortícolas, outra divisão para as frutas, outra divisão para as culturas arvenses, etc.

Isto é um exemplo que vos estou a dar e depois isto é igual para os animais, há uma divisão para os bovinos, para os suínos, isto é um bocado, sou eu que sou esquisito ou isto é uma coisa absurda, o modo como esta máquina foi feita com divisões, subdivisões, direcções-gerais, serviços operativos, nada disto faz sentido. Há uma lógica de irracionalidade que não faz sentido, e é bom que nós percebamos que não faz sentido e é bom que façamos alguma coisa para alterar esta estrutura completamente irracional de organização do estado, e neste caso concreto da organização dum Ministério como é o ministério da agricultura.

Outra ideia que é relevante é evidente que quando nós discutimos estes tópicos que vocês estão habituados a ver serem discutidos, problemas sobre a reforma da administração pública, a reforma do estado etc., há muito uma tendência de utilização de argumentos terroristas contra administração pública, argumentos ad terrorum, vamos fazer isto, aliás, infelizmente os governos em Portugal têm sido muito dados a uma lógica de ameaça, atacam os sintomas, ameaçam, nalguns casos criam, acho que eu por exemplo, eu acho que esse foi um dos grandes problemas dos governos do PSD destes últimos dois governos, foi a utilização de uma lógica excessivamente confrontacional, com a qual é preciso ter muito cuidado, porque não é possível, no fundo reformar a administração pública ou reformar Estado, dentro desta lógica que estamos a ver, quer dizer, eu dei-vos o exemplo do ministério da agricultura, mas há outros exemplos destes, não possível pegar nisto sem no fundo perceber que nem tudo é mau. Ou melhor, há coisas que são muito boas.

Aliás, este é o problema do país. O país tem o muito bom e o muito mau. Em alguns casos tem o muito bom e muito mau lado a lado, é como irmos em Lisboa na Avenida da Liberdade e perceber que há um prédio magnífico e ao lado um prédio que não se percebe porque é que está li.

Portanto, é a lógica do país, infelizmente é exactamente essa.

Ora, qualquer reflexão sobre o estado, da máquina do Estado, é uma reflexão que não pode deixar de distinguir as coisas que funcionam bem e as coisas que não funcionam bem. Há institutos, direcções, serviços da administração central, da administração indirecta, que funcionam magnificamente.

Portanto, é preciso ter algum cuidado com uma lógia ad terrorem de abordagem destes problemas,

Normalmente as consequências e os efeitos dessa lógica são as piores, porque são os de gerar uma reacção, uma revolta junto das pessoas que são directamente interessadas, os que trabalham na administração pública, as pessoas que trabalham no Estado.

E que em muitos casos eventualmente na sua grande maioria trabalham o melhor que sabem e o melhor que podem. E portanto, é outro dos grandes problemas, é outro dos riscos de um discurso sobre essas matérias e convém evitar.

Portugal é um país, não sei se vocês têm essa ideia, Portugal é um país em que há como que duas nações diferentes, essa metáfora das duas nações, é uma metáfora que uma historiadora americana utiliza a propósito dos Estados Unidos a respeito da religião, ela disse que há duas Américas, que há uma América da religião, e há uma América que não é religiosa; é uma ideia que outro escritor e antigo primeiro-ministro inglês, o Disraeli, também aplicava ao universo inglês, também dizia que havia uma nação aristocrática em Inglaterra, e depois havia uma nação inter-classista.

Em Portugal, nós também temos duas nações, é a nação que vive na legalidade e a nação que vive na ilegalidade.

É a nação que viveu numa ilegalidade que no fundo obriga as pessoas que vivem na legalidade a um esforço suplementar, a um esforço adicional, e na administração pública, no Estado é a mesma coisa, há duas nações, há duas administrações. Uma eficiente, outra ineficiente. E o grande problema é que nós às vezes não distinguimos.

Outra ideia que tem a ver com isto também, que é uma ideia sobre a qual eu não falarei muito porque não sei muito, que é no fundo a ideia de que nos temos que caminhar para a adopção de lógicas de empresarialização na administração pública, empresarialização do Estado. Utilização de patamares de eficiência e de qualidade do sector privado para o Estado. Do sector privado, mas do sector privado ideal, porque há sectores privados que como sabem funcionam ainda pior que o Estado.

Não sei muito sobre estas coisas da gestão, pública e da empresarialização e do new public management, que é uma filosofia de organização dos sérvios públicos que os ingleses aplicaram com os governos de Blair, e que tem dado resultados na melhoria da qualidade de serviços públicos.

Mas essa é uma tendência do nosso tempo, é um paradigma do nosso tempo, e tem que ser cada vez mais. A adopção de técnicas de organização empresarial do mundo privado para o sector público, para o Estado, para os serviços públicos, para a administração pública. Tudo isto tem exigências completamente novas, completamente diferentes, isto exige um esforço de adaptação de pessoas que trabalharam durante décadas num determinado registo e que subitamente têm que se adaptar.

Mas a questão é: no nosso tempo quem não se adapta morre, a adaptação, a adaptabilidade é uma característica fundamental que as pessoas têm que ter para se poderem instalar num determinado sector, numa determinada profissão.

Outra reflexão, outro tópico, que é o problema da politização do Estado, a da politização da administração. E isto é uma coisa que a mim me preocupa em especial. Porque como ainda tenho uma visão pouco tradicionalista de achar que os políticos são uma coisa, os burocratas são outra coisa, trazia um livro, uma coisa que vos recomendo vivamente é lerem um ensaio do Marx Weber, que está neste livro que é uma coisa da editora Tribuna e que vos interessa seguramente, que se chama “A política como vocação”, que é um ensaio muitíssimo interessante e muito clássico em que ele explica precisamente o que é que significa viver para a política, viver da política, o que é que significa as duas coisas, o que é que significa esta ideia da política como vocação. E um paradigma do Weber é precisamente a distinção entre o universo dos políticos que não tem nada a ver com o universo dos burocratas. Os políticos surgiram assistidos por burocratas profissionais. O que acontece é que, sobretudo em Portugal, depois no regime democrático – esse é um dos problemas do nosso regime democrático -, foi a politização da administração pública, foi a captura do Estado por designadamente pelos partidos políticos, e aí a responsabilidade inicial é dos partidos da esquerda sobretudo por exemplo do PCP que começou por se especializar nisso, mas também de outros partidos políticos, o PS e o próprio PSD também , é preciso dizer isso.

Para utilizar uma expressão que alguém utilizou, do que se trata aqui é das chamadas OPA’s – operações políticas de apropriação. Quer dizer, há uma lógica de apropriação político-partidária do aparelho administrativo. É pior coisa que pode acontecer, a pior coisa que pode acontecer, e nós pagamos um bocadinho isso, e não pagam por exemplo os ingleses que têm uma cultura de funcionários públicos, uma cultura administrativa que não é politizada, não estou aqui a dizer, a realidade não é a preto e branco, mas a Inglaterra tem essa virtude, nós não temos, e essa politização o que é que gerou? Gerou, paradoxalmente gerou a fraqueza do próprio Estado quando tem de lidar com interesses corporativos. Por exemplo, quando o Estado tem de lidar com sindicatos, os sindicatos da saúde, com os sindicatos dos juízes, com os sindicatos da educação, com os sindicatos dos enfermeiros, etc., que representam facções e interesses corporativos muito fortes, e que naturalmente não querem mudar quando o país precisa de mudar, o Estado quando tem que se confrontar com esses interesses surge, aparece mais fraco. E aparece mais fraco porque precisamente está também ele refém de uma lógica politizada, corporativa, e partidária na forma como a administração funciona. Porque aliás, tem como consequência outra ideia. Teve como consequência uma certa degradação da cultura administrativa. Hoje em dia, ao contrário do que muitas vezes se diz, é verdade que a profissão de funcionário público por exemplo, ou pessoas que trabalham directamente no Estado, ainda têm prestigio social, ainda concede uma grande segurança e um grande conforto, mas já não é a mesma coisa do que era antes. Hoje as pessoas tendencialmente procuram à partida outras vidas, a política, fora da política, mas procuram outras vidas.

A politização do aparelho administrativo, da máquina do Estado, levou de facto a uma degradação da cultura administrativa a uma degradação do pessoal administrativo, do seu estatuto, da sua importância e da sua capacidade de confronto contra interesses corporativos externos.

Outra ideia que eu gostava de dizer é no fundo acho que há dois princípios na forma como podemos encarar os Estado visto por dentro, um deles é o princípio da fidelidade, outro é o princípio do mérito. São dois princípios muito diferentes. Infelizmente o país funciona muito com uma lógica assente no princípio da fidelidade, em vez de funcionar com uma lógica assente no princípio do mérito. O que é que é, digamos, o princípio da fidelidade? O princípio da fidelidade é aquilo que muitas vezes acontece, quer dizer, todos nós temos amigos, todos nós conhecemos uma pessoa que conhece outra pessoa que por sua vez conhece outra pessoa, e às tantas conseguimos aquilo que queremos com esta teia e com esta rede de fidelidades pessoais.

E se calhar é bom ter estas fidelidades pessoais, estas fidelidades partidárias, estas fidelidades clientelares. Só que a lógica assente no princípio da fidelidade é uma lógia como se está a perceber, é uma lógica que não trás de todo bons resultados, porque é uma lógica injusta, porque é uma lógica completamente avessa a uma ideia, uma concepção, uma visão meritocrática da sociedade, não sei se virem esta semana por exemplo os jornais, isto veio por exemplo no Diário de Notícias, o Diário de Notícias por exemplo, noticiava um estudo recente de alguns sociólogos sobre a mobilidade social em Portugal, e esses sociólogos concluíam que o crescimento económico em Portugal tem aumentado a mobilidade social, quer dizer as pessoas tendencialmente conseguem mudar da classe social onde nascem, e abro aqui um parêntesis para dizer que para mim a política tem dois objectivos fundamentais, primeiro, garantir que ninguém nos assalta na rua, garantir a nossa segurança, o segundo objectivo é permitir que as pessoas subam na vida, esse é o grande objectivo da política, é permitir, é criar condições para que as pessoas subam na vida, quer dizer, não há outra, quer dizer, não sei se alguém, o que é que vocês acham, eu acho que se a política não servir para isto, não serve para nada, é uma brincadeira que não terá outro tipo de importância.

A conclusão deste estudo sobre a mobilidade social, é a de que Portugal é uma sociedade muito pouco meritocrática, em que a capacidade que os indivíduos têm se pelo seus próprio mérito, pelo seu próprio esforço, e pelo seu próprio trabalho conseguirem subir, está muito condicionada. Está muito condicionada porquê? Pela lógica de fidelidade com as estruturas e com que os partidos, com que infelizmente ainda se funciona.

Aliás, nesse sentido é verdade, a blogoesfera e é um universo que nós conhecemos bem, não é assim necessariamente, embora às vezes funcione de uma forma imitativa desta filosofia da fidelidade que estou aqui a referir, mas por exemplo é muito frequente uma pessoa parecer, cria um blog e tem coisas interessantes para dizer e tal, e escreve etc., e depois começa a ser solicitada, começa a ser conhecida, há imensos casos em que isso acontece, precisamente porque é um espaço curiosamente muito meritocrático.

Não é assim noutros sítios, não é assim nas universidades, não é assim nos partidos infelizmente, no fundo a fidelidade ou o facto da fidelidade substituir, ocupar um terreno que devia ser um terreno do mérito, para mim parece-me ser uma coisa absolutamente a combater e absolutamente a erradicar. E Portugal infelizmente é um país muita vítima disso, até porque é uma democracia do sul, somos uma democracia sulista que criamos laços afectivos entre as pessoas, somos todos muito exagerados. Isto é assim, não se vai mudar, não nos vamos tornar em filandeses e noruegueses como é evidente, quem pensa nisso está a cometer um grande disparate, mas vamos ser sempre um povo e uma sociedade com um comportamento um pouco esquizofrénico como os portugueses são Nós somos uma sociedade muito esquizofrénica, não sei se alguma vez pensaram nisso, a nossa reacção com os políticos por exemplo, ou a nossa reacção com a autoridade, a reacção que as pessoas têm com a autoridade é muito engraçada porque por exemplo, uma pessoa vai na estrada, um carro que está ànossa frente e que não fez o pisca para a esquerda, a nossa primeira reacção é “este tipo devia ser preso”, há uma intolerância com o erro dos outros que é absurda, mas depois logo a seguir estamos a fazer exactamente o mesmo e estamos a ser repreendidos por um polícia, e estamos a dizer “o sr. saia daqui”. Há uma lógica contraditória, esquizofrénica e de entender a autoridade, que é uma coisa que tem a ver, que eu acho que vai demorar a desaparecer. Mas tem a ver sobretudo com a herança autoritária, com o faço de termos estado sobre o domínio de um ditador como o Salazar durante meio século, e no fundo durante uma certa fase desse período termos gostado mas ao mesmo tempo aquilo ser uma coisa opressiva e tal. Enfim, chega de reflexão sobre a alma portuguesa.

Mas esta ideia fidelidade e mérito acho que é uma ideia importante que gostava de aqui de trazer.

Outro aspecto que gostava de dizer, tem a ver com o conjunto de ilusões que esta visão estadualista da política, que esta visão que há bocado falávamos, é uma visão que em vez de fazer o enfoque na interacção constante entre o Estado e a sociedade, não tenhamos dúvidas que é só assim que Portugal vai conseguir sair da estagnação, é se nós conseguirmos fazer coisas sozinhos, se nós conseguirmos ser dinâmicos, por exemplo, se este tipo de iniciativas for mais frequente, mas multiplicado, mais disseminado.

O nosso esforço e a nossa capacidade de organização é como sabem limitada, e infelizmente reduzida mas há três ilusões que esta visão estadualista cria, e gostava de referir exactamente essas três ilusões, deste Estado pesado que temos que estado a falar, que é também o nosso Estado social, que eu não defendo necessariamente o fim do estado social, como é obvio.

Mas as três ilusões são estas: primeira ilusão, é uma ilusão financeira, é evidente que não há dinheiro, não há dinheiro para suportar uma despesa pública ao nível que a nossa despesa pública está, todos temos a noção disso, não dinheiro para suportar as despesas administrativas e as despesas correntes como elas estão, isso é impossível, portanto, as pessoas dizem, bom mas nós temos que manter tudo como está, organizamos melhor, não é verdade, infelizmente o país não produz para o nível de despesa que tem. E portanto, a única solução é reduzir, a única solução é acabar com esta ilusão financeira. É uma ilusão, convém que percebamos isso, não conseguimos garantir o tipo de Estado que temos com os pressupostos de que temos.

A segunda ilusão, é uma ilusão (puxando agora um bocadinho para as minhas áreas) é uma ilusão muito mais normativa ou constitucional, é a ideia de que as pessoas, as pessoas ficam muito contentes porque têm leis que lhes dizem “o sr. tem direito a isto”, ou a constituição diz-lhe “o sr. tem direitos..”, há um artigo na constituição que é um dos meus artigos preferidos que diz que as pessoas têm direito a uma habitação em condições de conforto e de higiene adequadas, uma pessoa fica sem saber se aquilo é o t2, t3, o que é que a Constituição está a pensar, que tipo de habitação é que é aquela. Mas, toda esta lógica dos direitos, toda esta lógica que aqui está, é uma lógica completamente ilusória, porque não é pelo facto de eu ter uma lei que me diz que tenho o direito a isto, que tenho verdadeiramente esse direito, que eu tenho condições objectivas para ter esse direito. No fundo quando os governos criam leis altamente protectoras, altamente benéficas, estão a vender uma completa ilusão, porque não há condições objectivas para a realização, para a materialização daqueles objectivos. Não é possível. A consequência desse entendimento é aquela que já estamos a ter, é a ideia de que ninguém em Portugal sabendo que tem de perder alguma coisa, ninguém em Portugal quer verdadeiramente perder. Vocês não sei se já alguma vez prestaram atenção a isto, é muito frequente ouvir as pessoas, os grupos sociais com este tipo de discurso “porque é que não começam, por mim, tem de cortar mas porque é que começam por mim, porque é que não vão a todos”, ou seja, os grupos sociais só aceitam perder algum direito que têm no pressuposto que todos percam. Quando na realidade tem que se começar por algum lado e as políticas fazem-se de pequenos passos, naturalmente, mas o que isto gera é muito uma lógica de reivindicação dos meus direitos contra os direitos dos outros. Os direitos dos médicos contra os direitos dos enfermeiros, os direitos dos advogados contra os direitos dos juízes. E o que acontece é que, nenhuma sociedade, uma sociedade que assenta lógica dos meus direitos contra os direitos dos outros, contra os seus direitos, não é uma sociedade muito coesa, pelo contrário é uma sociedade que me parece um pouco doente, e é o principal perigo que a sociedade portuguesa hoje tem; é ser uma sociedade em que as pessoas adoptando uma lógica estritamente egoísta de defesa dos seus interesses, se revelam uns contra os outros. E no fundo só aceitam rever alguma das suas posições no pressuposto de que os outros também tenham revisto, ou que as posições dos outros também tenham sido revistas.

Acho que esta ilusão é uma ilusão normativa ou constitucional, como quiserem, e é uma ilusão e convém que as pessoas percebam que é uma ilusão.

Há uma terceira ilusão que acho igualmente preocupante, que é a ilusão comunitária. O grande problema do tipo de Estado que nós temos hoje, do Estado pesado, carente de reformas que nós temos hoje, é que esse estado não tem correspondência, esse Estado forte não tem correspondência com uma sociedade forte, uma sociedade coesa. O Estado que nós temos nunca criou uma sociedade coesa, organizada, disciplinada, etc. Este é o grande problema. Há uma parte dos portugueses, como eu há pouco dizia, que não respeita o Estado, não tem grande respeito pelo Estado, os portugueses são muito aquelas pessoas que não sabem se gostam mais o pai ou da mãe, quer dizer, estão entre os dois, precisamente por causa desta indefinição.

Este aspecto, o facto de nós nos últimos 30 anos, infelizmente não termos conseguido estruturar uma comunidade coesa, uma sociedade coesa, uma sociedade civil forte, é um dos grandes problemas em que nós temos que pensar e que temos que corrigir. Porque há aquela ideia na qual eu acredito que se fala muito em Inglaterra, que se fala no chamado little platoons, no fundo que as sociedades fortes, as sociedades mais bem sucedidas, são sociedades em que existem estes little platoons, quais são os little platoons, são associações, são movimentos, partidos também, igrejas. Ou seja, isto é que faz o vigor de uma sociedade, infelizmente nada disto foi feito, nada disto foi permitido porque a lógica puramente estadual de abordagem dos problemas políticos e a gordura que o Estado adquiriu, impediu ou falhou na criação daquilo que o país devia ser hoje que era uma comunidade de pessoas responsáveis, cientes dos seus direitos, cientes dos seus deveres, é isso que se pretende, e muito organizada na lógica deste little platoons, destes pequenos movimentos que devem nascer e que devem brotar da sociedade civil.

Pretendi deixar-vos aqui um conjunto de pistas de reflexão sobre o modo como devemos entender o Estado, o Estado como máquina, o Estado como aparelho.

O Estado é, por um lado somos todos, mas também por outro lado não somos todos. Há determinadas estruturas que corporizam esse mesmo Estado e para retomar aquilo que há pouco tinha dito, no fundo de tentarmos, de sermos fieis a um paradigma de interacção entre o Estado e a sociedade que é aquilo que devemos fazer, nós devemos reflectir, devemos pensar sobre todas as questões e todos os problemas à volta do Estado sempre de acordo com esta perspectiva, sempre de acordo com uma perspectiva que permita uma simbiose, vou utilizar esta palavra feia, entre o Estado e a sociedade sem ter uma perspectiva estadualista, sem ter uma perspectiva libertária do género o Estado no fundo é uma coisa desprezível e vamos mas é acabar com o Estado. Nada disto, estas duas visões estão erradas, e portanto, aqui apontaria para uma tal perspectiva de interacção intermédia e reflectiria sobre todos estes problemas com as considerações que vos acabei de trazer.

Obrigado pela vossa atenção.

 
Dep. Carlos Coelho
Muito obrigado nós pela sua presença, Dr. Lomba, vamos dar inicio então às questões dos grupos. Nesta conferência começa o Grupo Bege, Pedro Esteves.
 
Pedro Esteves
Em nome do Grupo Bege, começo por cumprimentar o dr. Pedro Lomba, também não poderia deixar de cumprimentar o nosso magnífico reitor e também o nosso caro amigo Daniel Fangueiro.

Devido ao crescimento desmesurado da administração pública, nomeadamente a administração pública prestadora de serviços, surgiram fenómenos de insuficiência e burocracia, aumento das despesas com a máquina do Estado e a falta de competência e imparcialidade.

Por tudo isso, começo a por em causa o próprio crescimento do Estado e as suas funções, repensando-se assim, a dimensão da máquina administrativa e o tipo de tarefas colocadas a seu cargo.

Será que o recurso à privatização e revalorização da sociedade civil, é a melhor solução para encontrar a eficiência?

Obrigado
 
Dr.Pedro Lomba
Acho que sim. Qual é o tipo de Estado em que provavelmente as sociedades do futuro devem assentar, devem assentar num modelo de Estado que está a ser trabalhado, que é o modelo do Estado regulador, de um Estado que se concentra na regulação dos agentes económicos.

Um Estado regulador o que faz é, criar regras e procurar que os agentes sociais, que os agentes económicos cumpram essas regras. É evidente que o Estado regulador precisa que se esclareça este conceito que é o conceito de regulação, o que é que é a regulação, para que é que serve a regulação, quais são os objectivos e as funções da regulação. A regulação engloba um complexo de poderes diferentes, de fiscalização, de supervisão, orientação, inspecção, informação.

Tudo isto, curiosamente precisa de alguma despesa pública, como é evidente, é preciso que o Estado tenha organismos fiscalizadores em condições, para não acontecer aquilo que recentemente me contaram de que por exemplo a comissão nacional de protecção de dados em Portugal tem duas pessoas que fiscalizam, duas, só tem dois, que é um bocadinho inacreditável. Como vêem aqui têm um exemplo de completa falta de racionalidade na gestão da despesa e na organização das despesas.

O cumprimento destas funções, daquilo que eu aqui estou a dizer informação, fiscalização, supervisão, requerem alguma despesa, requerem um Estado forte, requerem um estado respeitado.

E portanto, a consequência, a privatização não é uma entrega, o Estado não se expropria das suas funções, o Estado, evidentemente privatiza aquilo que os outros, que os privados sabem fazer melhor, mas o Estado permanece com as funções de regulação, de orientação, de fiscalização, de supervisão, de informação.

E a informação hoje é uma coisa fundamental, fundamental, não é só para nós, hoje em dia nós temos 300 milhões de sites onde podemos aceder a toda a informação de qualquer espécie, mas para isso temos de escolher, temos de saber quais são os melhores sítios que devemos procurar. O Estado é a mesma coisa. O Estado tem que garantir que a informação circula internamente da melhor maneira, o Estado tem que ter um conhecimento actualizado sobre o que acontece nos mercados, o que acontece nas actividades económicas que criam riscos, etc.

Portanto, a lógica de tipo de Estado em que as sociedades do futuro começam a assentar e devem assentar, é de facto um Estado de tipo regular concentrado nas funções de regulação.
 
Maria Alexandra Teixeira
Bom dia a todos. Como é sabido o estado português tem-se mostrado inoperante na resolução dos problemas mais cruciais da actualidade, assim, como alternativa não seria mais eficaz o Estado abandonar a sua complexidade e burocracia excessiva e tornar-se num Estado de proximidade para com o cidadão, servindo os seus interesses primários. Assim, na opinião do Grupo Encarnado acabando com a fraudulência e invasão fiscal, o Estado assumiria uma forma de no futuro se tornar um poderoso estimulador de confiança social e económica, se todos pagarem, todos pagam menos, gostaríamos de saber qual é a sua visão?
 
Dr.Pedro Lomba
No fundo levantou aí três problemas, acho eu. O primeiro foi a ideia de um Estado proximidade, isso é uma ideia em que eu também acredito, por exemplo as lojas do cidadão foram boas ideias, criaram essa lógica de um estado proximidade, serviços mais públicos mais perto dos cidadãos a aproximação do poder às populações cria essa lógica de proximidade.

Mais, uma ideia ou paradigma que eu acho que é muito importante que é o localismo. As coisas se puderem ser  locais, devem ser locais, na medida do possível, é melhor que assim seja, isso aumenta a tal democracia de proximidade, o Estado proximidade para utilizar a expressão que utilizou, que me parece muito bem.

A segunda ideia que referiu é a ideia da redução da burocracia, aí acho que é difícil todos não pensarmos o mesmo, a burocracia é um mal de que o Estado português sofre e felizmente a preocupação começa hoje em dia a ser a de diminuir substancialmente essa burocracia, mas é uma coisa que tem que ser erradicada, e sobretudo há um teste que eu nunca compreendi porque é que os poderes públicos não fazem, quando criam leis que criam determinadas obrigações dos cidadãos relativamente ao Estado. Porque é que não fazem um teste no sentido de reduzir a burocracia ao mínimo. Porque é que por exemplo, quando um imigrante se quer legalizar em Portugal tem de apresentar 500 documentos diferentes, ou quando uma pessoa quer um licenciamento para uma coisa qualquer, precisa de apresentar documentação que nunca mais acaba. Porque é que não há uma racionalização nisto? Porque é que a obrigação de prestação de informação às pessoas não é reduzida àquilo que é essencial, aquilo que é verdadeiramente essencial, em vez de no fundo de se fazer aquilo, aquela coisa do sketch do gato fedorento, do papel, é um bocadinho isso não é, constante referência ao papel, ao papel que falta, etc.

Depois a outra questão que levantou que tem a ver com a invasão fiscal. É engraçado que o problema fiscal do Estado português tem muito a ver com o défice de legitimidade, com a tal crise esquizofrénica que o estado tem, que o Estado ganhou neste últimos  20-25 anos, no actual regime constitucional, no actual regime democrático, porque um Estado que assume cada vez mais funções, cada vez mais tarefas, é um Estado que precisa de ser legitimado, é um Estado que precisa cada vez mais de legitimação, e infelizmente o Estado não teve essa legitimação, não foi legitimado para a prossecução, para o cumprimento das tarefas que lhe foram atribuídas. A consequência disso é que as pessoas quando podem, há pessoas em Portugal que podendo fogem ao fisco, porque não reconhecem nalguns, não reconhecem ao Estado legitimidade para o cumprimento das suas tarefas, das suas tarefas mais alargada, das suas tarefas mais vastas.

E porque é que em Portugal é tão difícil ou tem sido tão difícil, implementar reformas que conduzam ao aumento da receita fiscal e à diminuição da evasão fiscal? Tem a ver com isto, é difícil convencer as pessoas, de que pagar impostos é uma obrigação cívica, é um dever fundamental, é difícil, nalguns caso é de facto difícil. Nuns casos porque as pessoas têm impulsos naturalmente criminosos, noutros casos porque há um problema de legitimação do peso do Estado, porque o peso do Estado reflecte-se como sabemos na carga fiscal. E nós não falámos sobre isto aqui nem eu sou especialista para poder falar, mas essa é uma das principais vantagens que adviria da redução do peso do Estado, é a possibilidade do Estado reduzir a carga fiscal.
 
Joana Lopes
Muito bom dia, em nome do Grupo Verde gostaria de agradecer a presença do dr. Pedro Lomba aqui na Universidade de Verão, de uma forma especial e muito particular por ser um professor da Faculdade de Director de Lisboa que muito prezamos e também por de alguma forma contrariar esta ideia que os cronistas têm todos uma tendência de esquerda. A geração de 70 é prova de que pode não ser bem assim, e é muito importante pelo menos para nós, jovens, e eu considero isso, que alguém venha dar esse exemplo.

Gostaria de em nome do Grupo Verde colocar uam questão: como tão bem disse nós estamos a pagar aquilo que a geração anterior, os erros que a geração anterior cometeu, está enraizado, chamou-lhe agora, ainda há pouco na resposta o regime esquizofrénico, esta história do Estado previdência, que o estado tem que prestar serviço, prestar serviços de uma forma desmesurada, como é que nós, que estamos aqui numa perspectiva de tentar perceber como é que politicamente chegamos à população, nós que não temos culpa dos erros que foram cometidos e não vivemos com aquilo que costumo chamar “o fantasma do 25 de Abril” e ainda bem, como é que conseguimos mostrar à população que este Estado regulador não é voltar à ditadura, esta loucura que vem associada à ditadura? Muito obrigada.
 
Dr.Pedro Lomba
Em primeiro lugar, deixe-me dizer, hoje em dia há muitas pessoas a escrever nos jornais que já não pensam como no passado, isso é uma grande vantagem, há a ideia de que os jornais continuam a ser de esquerda mas a opinião é de direita, talvez seja exagerada, porque quando vamos ver os jornais a Joana Amaral Dias também escreve, mas de qualquer maneira há outras pessoas e pessoas da nova geração, que não têm medo, já não têm medo de… eu quando tinha 15 anos era um bocadinho mais reaccionário do que sou hoje, sinto que hoje já não sou tanto, e na altura a pessoa era acusada, tinha as suas acusações de ser fascista, quer dizer, e tudo isto era uma forma um bocadinho envenenada de encarar o debate público e o debate político. Não sei se acontece a alguns de vocês mas acho que é uma maneira um bocadinho empobrecedora de ver isto tudo.

De qualquer forma para abordar a questão que a Joana colocou, acho que essa questão é muito difícil, porque eu só vejo uma alternativa, é apostar profundamente nas pessoas que têm 20 anos agora, 20-25 anos, eu já estou perto, quase perto dos 30, por isso já estou, digamos já não sou novo, mas no fundo acredito absolutamente nisto, a geração que tem 20 anos agora é uma geração fundamental. Porque não é possível, reparem, é obvio que nós só governamos, só ganhamos, só podemos governar em Portugal se ganharmos eleições, e para ganhar eleições é preciso convencer as pessoa, mas é muito difícil convencer as pessoas que tiveram nalguns casos vidas complicadas em termos sociais, e que conseguiram à custa precisamente do crescimento da despesa pública em muitos casos, conseguiram subir o seu nível de vida, é muito difícil convence-las de que isso agora vai acabar. É muito difícil.

As pessoas vão ao Brasil, esgotam as viagens no Brasil, quer dizer, há 30 anos não podiam fazer isso, agora estão a poder fazer, vamos censurá-las por isso? Tem 40, 50, 60 anos não puderam fazer isso quando tinham 20, vamos agora censurá-las? É muito difícil. Vamos dizer-lhes. Isso acabou, porque não há dinheiro. Ninguém fazer isso, não é possível.

Quer dizer, a única maneira é apostar em quem tem 20 anos e tentar formatar, não é formatar, é tentar fazer com que todos tenhamos mais ou menos um consenso sobre estas coisas, sobre o tipo de Estado, sobre a ideia que temos de assumir a responsabilidade pelas nossas vidas, de conduzir as nossas vidas, de prosseguir, digamos os nossos próprios projectos de vida. E de no fundo querer assumir nas nossas mãos a nossa própria vida e não querer que seja o estado a decidir, que seja o poder a decidir, que seja o poder a intervir, sermos nós a criar as coisas que queremos criar.

E isto é uma coisa que tem que ser feita a partir de agora, precisamente porque as sociedades fazem-se assim, fazem-se através da renovação das gerações e da renovação das ideias. Quando se puder passar de uma geração para outras, só assim é que eu vejo possível que não sejam cometidos os erros que foram cometidos de facto antes, e que foram cometidos erros antes precisamente ignorando-se a tal lógica de futuro e onerando excessivamente as gerações futuras.

Todos nós que estamos aqui, estamos perfeitamente cientes de que aquilo que muitos de vocês ainda estudam, provavelmente não é, mas as nossas pensões em termos de segurança social não estão garantidas, nada está garantido, o futuro é uma completa incógnita.

Portanto, a principal pista é esta, porque quanto ao resto eu sou mais céptico, quando à possibilidade de perante as pessoas as convencer e sobretudo pessoas que têm este registo, este registo de vida, esta biografia, é mais difícil convencê-las do ponto de vista político que elas têm de mudar.

Porque atravessaram demasiados sacrifícios ao longo da vida para de um momento para o outro voltarem ao status ex anti, quer dizer, para voltarem atrás, acho mais difícil.
 
Francisco Macedo
Bom dia a todos, em especial ao nosso conferencista de hoje, ontem, o sr. Presidente da Comissão Europeia salientou a excelência da organização da União Europeia, porque não adoptar na medida do possível as regras de gestão, planeamento e transparência da União Europeia para reorganizar a máquina do Estado?
 
Dr.Pedro Lomba
Vamos lá ver, não quero discordar com o Presidente da Comissão Europeia, mas acho que por exemplo, tudo aquilo que vou dizer é assente em conhecimentos que são um pouco superficiais devo confessar, mas, nós podemos dizer por exemplo que a administração pública comunitária é extraordinária, é excelente, todas as informações que tenho, os contactos profissionais que já tive com funcionários comunitários, funcionários europeus, são absolutamente excelentes, estamos a falar de pessoas espalhadas, dos mais diversos sítios da União Europeia que trabalham extraordinariamente.

Portanto, desse ponto de vista parece-me que as tais regras de organização, funcionamento, competência e mérito que existem na administração comunitária são excelentes.

Agora, a União Europeia não é nenhum modelo de governação, ou não é nenhum modelo de organização que possa ser aplicado a um Estado. Isso parece-me evidente. Para já porque é uma coisa completamente diferente do Estado, o Estado é, a organização administrativa de um Estado necessariamente comporta problemas e especificidades que a União Europeia não tem. A União Europeia é por outro lado, se nós nos queixamos que o nosso estado é um Estado pesado, um dos grandes riscos da União Europeia em termos de organização e de filosofia, de organização é precisamente a de conduzir à criação de um super Estado. De um Estado igualmente pesado, com orçamento comunitário também mal direccionado ou deficientemente direccionado para aquilo que deveria ser.

Portanto. Vamos ter alguma cautela nessas comparações e vamos sobretudo pensar que as reformas que temos de fazer na máquina estadual portuguesa, são reformas que têm de vir de dentro, não têm de vir de fora. Somos nós, que pensando nos nossos problemas e tentando chegar às nossas soluções devemos assumir essas mesmas reformas e não copiar modelos de organização que são específicos e que não são importáveis, e que obedecem a lógicas especificas.

A chamada governação comunitária, para já é demasiado complexa e que (um minuto inaudível na gravação)
 
Rita de Barros e Vasconcelos
Bom dia a todos, queria desde já em nome do grupo azul saudar a mesa e em especial o dr. Pedro Lomba, a nossa pergunta vai no sentido, é recorrente de tempo a tempo ouvirmos falar na revisão da Constituição portuguesa, na sua opinião pensa que é fundamental para o processo da reforma do Estado, e quais as principais mudanças que entendia fazer?
 
Dr.Pedro Lomba
Obrigado. O que é que eu acho sobre isso, acho duas coisas, acho e não são necessariamente contraditórias embora possam parecer, porque hoje em dia numa certa ala do espectro político há uma tendência, no fundo se chegar a esta conclusão, a Constituição portuguesa que temos é para rasgar, rasguem, façam outra, que aquilo não serve, e depois há uma outra tendência que é a tendência de no fundo de não mexer, ou de mexer paulatinamente que é aquilo que tem sido seguido, que é o tal paradigma de desenvolvimento sem roturas, que tem sido aquele que tem guiado a vivência constitucional.

O que eu acho, acho o seguinte: acho que a Constituição devia ser revista em muitas das suas coisas, por exemplo, há uns tempos estive num debate em que isto se estava a discutir a quantidade de referências que há na Constituição portuguesa às cooperativas é completamente inacreditável, há para aí 10/15 referências às cooperativas na Constituição portuguesa - que devem ser mais do que as cooperativas que realmente existem -, e depois as referências à iniciativa económica ou à iniciativa privada são completamente ínfimas, diminutas. Nada disto faz de facto grande sentido.

Acho que uma revisão dos aspectos económicos e que estão desajustados da realidade da Constituição impunha-se, acho que era relevante.

O que eu acho também é que nós isto por exemplo o CDS tem muito esse discurso e não é um discurso que me pareça muito inteligente acho eu, é a ideia de que mudando a Constituição nós vamos atingir o país, ou o melhor dos mundos possíveis, ou que no fundo no fundo basta ter uma Constituição nova para as coisas subitamente enfileirarem, encarreirarem pelo caminho certo. Isso é uma ilusão, é uma ilusão porque é a velha ilusão de que bastam as leis, basta mudar as leis para os comportamentos mudarem.

Ora, os comportamentos é que têm de mudar não são as leis, as mentalidades é que têm de mudar não são leis, a filosofia de vida é que tem que mudar não são as leis.

Portanto, mudar a Constituição sim, esperar que da mudança da Constituição surja o tipo de estádio e sociedade que nós queremos e que nós achamos os mais desejáveis é que me parece uma enorme ilusão. No fundo, teria alguma cautela no modo como este discurso deve ser apresentado, mas acho que a Constituição deve ser mudada. Deve ser mudada de facto nestas questões que são mais desajustadas.

Até posso ir mais longe, se nós fizermos uma nova Constituição qual é o problema? Não há nenhum problema, não há nenhum problema, isto tem sido assim os países também fazem isso. Os franceses fizeram reformas constitucionais irrelevantes durante a V República, a Finlândia por exemplo, a Irlanda por exemplo, a Irlanda teve uma reforma constitucional muito importante no final dos anos 90, a Finlândia teve uma reforma constitucional muito importante no final dos anos 90, e a Finlândia e a Irlanda são neste momento os dois países do ponto de vista económico que são mais estudados, e aliás as minhas informações de S. Bento dizem-me que são os países que o eng. Sócrates mais estuda, manda lá as pessoas que trabalham para ele e com ele estudar especificamente estes dois sistemas.

Precisamente porque se calhar as reformas constitucionais que estes países tiveram contribuíram para o crescimento económico que de facto eles adquiriram, mas acho que esta explicação acaba por ser simplista, isto é um resultado de muitas causas, de muitos factores.
 
Bráulio Torcato
Bom dia, dr. Pedro Lomba obrigado pela sua presença. Se olharmos a máquina do Estado, parece-nos que o Estado está a ficar oco, primeiro verificamos a perda de poderes pelo princípio da descentralização, falo por exemplo das autarquias locais e mesmo de algumas funções do Estado que têm passado para as empresas através das privatizações. Segundo, vemos também que o Estado perde o poder de fiscalização passando para entidades reguladoras. Terceiro, está a perder ao nível do câmbio. Por último, em quarto lugar, o próprio Estado legislativo está a emagrecer, referimo-nos por exemplo à produção legislativa externa, estamo-nos a referir às directivas da União Europeia. Face a estas e outras razões pelas quais não enveredámos, considera que assistimos a uma diluição sod poderes de soberania?

Gratos pela atenção.
 
Dr.Pedro Lomba
A pergunta que fez é muito complicada acho eu, porque à partida sim a resposta é sim, mas isso por um lado é o retrato dos tempos, isto é, a crise do poder soberano é um retrato do nosso tempo e não é um fenómeno especificamente português, é um fenómeno de todos os países.

Todos os sintomas de crise do Estado, do vazio do Estado, da desmaterialização do Estado que referiu são sintomas reais, o Estado sofre por cima, sofre por baixo, sofre pelos lados, por baixo sofre porque tende a descentralizar o seu poder para unidades políticas inferiores, sofre por cima porque se está integrado em sistemas políticas internacionais como no caso português a União Europeia tem de se sujeitar, tem de adaptar a sua soberania ao que vem dos órgãos próprios dessa mesma União, internamente também relativamente às funções de regulação que há bocado falávamos tende a concentrá-las em entidades reguladoras que são independentes.

Portanto a pergunta é: o que é que sobra para o Estado, ou em que é que o Estado se transforma? Bem, acho que a ideia de ter a última palavra, quer dizer a ideia de, é evidente que o Estado não regula directamente, nalguns casos regula mas em muitos casos não regula directamente, e são as entidades reguladoras que regulam directamente, e só regulam directamente porque a regulação exige um conjunto de conhecimentos de natureza técnica que o Estado não consegue ter. Quer dizer, regular a concorrência, regular o mercado de capitais, regular enfim outro tipo de áreas da actividade económica, hoje em dia necessita de um conjunto de conhecimentos técnicos que provavelmente exigem uma entidade autónoma com poderes autónomos.

Agora, o que é fundamental é que o Estado tenha sempre através dos seus órgãos, através dos governos legitimamente eleitos tenha sempre a última palavra para decidir conflitos sociais, conflitos entre. Aqui há pouco tempo houve um conflito entre a autoridade da concorrência e, salvo erro, os bancos em Portugal, é preciso que o Estado tenha a última palavra na resolução deste conflito. O Estado deve ter de facto a última palavra na resolução destes conflitos, mesmo que não seja ele concretamente a exercer as funções sociais e as funções públicas que  exerce como as funções de regulamente. O caso da descentralização é a mesma coisa. O Estado tem de garantir tem de intervir que não obstante que apesar da autonomia das autarquias locais, das regiões autónomas, o Estado tem que intervir porque essa autonomia não é ilimitada. Porque não há poderes, não pode haver poderes ilimitados numa sociedade política, e portanto o que o Estado tem que fazer é ter de facto como eu dizia, a última palavra na resolução desses conflitos procurando garantir e salvaguardar o interesse público. Eu acredito que se o Estado tiver essa capacidade para resolver conflitos, e para garantir e fazer impor o interesse público quando esse interesse público esteja em causa, a sua legitimidade será substancialmente maior.

Isto é um pouco a lógica como as pessoas vêem o Presidente da República, as pessoas sabem que o Presidente da República é uma figura que não decide nada de relevante, pode dissolver o Parlamento mas não decide nada de relevante. Ou seja, nós não somos melhor ou pior governados por causa do Presidente da República, mas as pessoas sabem e por isso não querem dispensar a eleição do Presidente da República, as pessoas sabem que o Presidente da República é uma espécie de garante da reserva de funcionamento das instituições.

O Presidente da República deve ser o homem mais saudável do país, se for um louco é um perigo, porque no limite as decisões mais complicadas, mais difíceis é ele que as tem que tomar. E é por isso que quando há pessoas que se candidatam à Presidência da República que não dão garantias de sanidade mental completas, uma pessoa deve temer de facto o pior.

Mas eu estou a brincar porque estou a fazer uma comparação com aquilo que eu acho que o Estado também é, o Estado deve ser a reserva, o garante do interesse público, do bem comum se quiser.
 
José Baptista
Muito bom dia a todos. Caríssimo Prof. Dr. Pedro Lomba, Caro Reitor Carlos Coelho e Caro companheiro Daniel Fangueiros. Primeiro de tudo em nome, em representação do grupo castanho quero saudar o Prof. Pedro Lomba que tenho o gosto desde há um ano para cá de conviver a nível da Universidade, porque foi meu professor durante um ano, e algumas teorias que o professor espelhou aqui nomeadamente o artigo da Constituição já era por nós conhecido, o T2 e tal é um marco do professor, mas nós temos uma questão para lhe colocar em relação à Administração Pública e ao desempenho da Função Pública, que é a seguinte: tendo em conta a nova realidade de abordagem do problema da Administração Pública o que entende da problemática da avaliação do desempenho na Função Pública como factor essencial para a racionalização do serviço público e consequente melhoria daquele, que o Estado pode dar aos cidadãos. Obrigado.
 
Dr.Pedro Lomba
Acho o seguinte, há pouco eu falava sobre a empresariliazação da Administração Pública, disse muito pouca coisa por ser pouca coisa, mas acho que isso é inevitável, a adopção de sistemas de avaliação na Administração Pública no Estado em geral, são absolutamente  inevitáveis. É insólito, é estranho que as pessoas não pensem que isso tem que ser assim.

Reparem, quando eu estou a dizer isto eu devo dizer, às vezes as pessoas quando falam na avaliação e no mérito estão a falar de cima, eu não gostava que, porque no fundo elas sabem que elas são bem avaliadas e por isso mesmo querem sujeitar os outros a esse processo de avaliação e a essa visão meritocrática da sociedade. Devo dizer-vos pessoalmente eu detesto ser avaliado, eu detesto ser avaliado, não gosto nada que me avaliem, porque quando me avaliam, uma pessoa quando é avaliada tem que estar preparado para, olhe isto não foi tão bem feito como devia ter sido feito, e na realidade muitas vezes não foi, ou foi menos, ou foi pior do que aquilo que devia ter sido. Ser avaliado não é bom, mas o problema é que as sociedades não devem ser feitas à medida dos nosso caprichos ou da nossa sensibilidade, da nossa hipersensibilidade e os portugueses em geral, não é para querer fazer mais uma generalização sobre o pais, mas os portugueses me geral são altamente hipersensíveis, quer dizer há um problema de hipersensibilidade feroz que atinge as pessoas, que não sei como é que isso se explica, é uma aversão à avaliação, uma aversão, uma coisa que se nota muito na educação por exemplo. Ainda me lembro de ter assistido há uns anos a discussões entre professores sobre uma coisa tão simples quanto a obrigatoriedade de um professor ser avaliado.

Que é uma coisa que me parece evidente, que me parece básica, não se percebe porque uma coisa tão básica oferece ou encontra tantas resistências. Porque é que docentes universitários não são avaliados, do ponto de vista pedagógico.

Eu por exemplo, custa-me um bocadinho ser avaliado pelos alunos porque depois vou lá ver, há lá umas pessoas que fazem comentários negativos e em vez de darem uma boa nota dão um 2, depois há uma pessoa que dá 1 a todos e a gente percebe, mas porque é que isto é assim, depois vamos confrontar com a nota que lhe demos e percebemos como lhe demos negativa ela respondeu assim. Ser avaliado é uma coisa nalguns casos é desagradável, mas é uma coisa necessária. É absolutamente necessária.

E na realidade nós estamos sob avaliação permanente, uma das coisas que eu digo aos meus alunos e não pretendo ter nenhuma espécie de paternalismo a dizer isto é, a questão da imagem que nós transmitimos é sempre fundamental. Uma pessoa que dá uma imagem, até pode ser muito inteligente, muito competente etc., nalguns casos até é, mas que dá uma imagem, chega muito tarde, há sempre alunos e alunas nas minhas aulas que chegam sistematicamente 10m, 15m atrasados, até são bons alunos mas chegam sempre atrasados, é uma técnica de marketing que eles utilizam para se tornarem notados, mas não faz sentido. Transmitem uma imagem que não faz sentido nenhum, é uma coisa absurda.

Portanto, a predisposição para avaliação permanente é uma coisa que me parece não só, não é uma coisa só do Estado, não é uma coisa só da Administração Pública, dos Funcionários Públicos é uma coisa geral, é uma coisa das empresas, é uma coisa dos escritórios, é uma coisa das universidades, é uma coisa que toda a gente tem que ser avaliada.

Agora é evidente que nalguns casos é complicado, porque nalguns casos quem nos está a avaliar é um idiota, mas o mundo não é justo, a sociedade não é justa e às vezes, mas alguns casos não é.
 
Sandra Pimentel
Bom dia a todos, gostaria em nome do grupo amarelo de cumprimentar o Dr. Pedro Lomba por aqui estar, a título pessoal gostaria de cumprimentá-lo como docente dessa grande instituição que é a Faculdade de Direito de Lisboa. Gostaria de perguntar-lhe se é possível acabar com a utilização da Administração Pública como mercado de trabalho ao serviço das estruturas partidárias e o que é que seria preciso mudar para que isso aconteça. Obrigado.

 
Dr.Pedro Lomba
O que é que se pode mudar, por um lado os dirigentes partidários devem ser particularmente zelosos nesse tipo de questões, no modo como formam os seus dirigentes, acho que tem que haver uma preocupação de passar a mensagem de que o carreirismo em geral é uma coisa errada, é uma coisa má. Porque o carreirismo é incompatível com critérios de justiça e de mérito de esforço que são critérios fundamentais, essa é uma ideia que acho que tem que passar, que os dirigentes partidários devem passar.

Depois outra ideia fundamental é a introdução do concurso público como método de recrutamento dos dirigentes públicos, dos funcionários públicos. O concurso público foi inventado para isso, e o concurso só cede, só pode ceder perante circunstâncias excepcionais. Se é necessário contratar para a divisão de informática não sei de aonde, um génio qualquer que vem da Ucrânia, aí parece muito bem. Agora este princípio é um princípio que deve ser mantido, que deve ser salvaguardado.

E portanto, acho que estas duas linhas, estes dois caminhos, são caminhos que me parecem muito importantes para se evitar essa lógica de encarar o trabalho público como um asilo. Quer dizer, as pessoas adquirem uma posição e agarram-se a essa posição e sem pensar que é bom, é bom que o poder tenha as suas próprias janelas, para poder respirar, para poder olhar para o mundo, para o mundo poder olhar a ele. Portanto, estes dois caminhos são caminhos que me parecem os possíveis e os necessários para fazer isso.

Depois é necessário também que as pessoas pensem se querem exactamente isso, se querem exactamente conduzir as suas vidas nesse registo, mas isso já é um terreno mais  moral que não nos interessa agora discutir, do ponto de vista da organização, do ponto de vista político acho que estas duas questões são fundamentais.

O concurso público, regras claras no concurso público, regras claras de justificação das contratações que se fazem, porque é que se vão buscar esta pessoas, fundamentação das decisões administrativas, tudo isso, todas estas coisas são muito importantes para evitar essa lógica que referiu, essa lógica de apropriação do Estado que referiu.
 
Bruno Rodrigues
Bom dia dr. Pedro Lomba, em nome do grupo rosa gostava de lhe agradecer a presença aqui nesta Universidade de Verão.

Portugal tem andado sempre em contra ciclo com o resto da Europa, quando os países da Europa começaram a emagrecer os seus Estados, Portugal começou a engordar de forma abrupta, como planeamos a dieta do estado e como relacionar o seu emagrecimento com os direitos adquiridos? Obrigado.
 
Dr.Pedro Lomba
Quando diz que Portugal tem estado sempre em contra ciclo tem e não tem, infelizmente é verdade, mas também é verdade que durante os últimos 20 anos conseguimos inverter um bocadinho essa tendência lógica de facto estar em contra ciclo, mas hoje em dia o problema português não é um problema diferente do problema francês, não é um problema diferente de outros estados europeus, a França tem um estado pesado também tem de o emagrecer, a Itália, a Espanha já se antecipou e tomou medidas muito importantes tanto que tem uma situação de equilíbrio financeiro bastante apreciável.

Mas eu diria eu o nosso problema é um problema que é semelhante ao problema europeu e é de certa maneira um problema europeu, é um problema da Europa em geral. Agora como é que se compatibiliza este princípio de que é fundamental reduzir a despesa pública e para isso é fundamental reduzir o peso excessivo do Estado com os tais direitos adquiridos que há pouco referiu. Uma das maneiras é evitar essa teoria dos direitos adquiridos que é uma teoria que se inventou e que se inventou em Portugal e que se usa para tudo.

Usa-se quando as pessoas querem construir um prédio de 10 andares num sítio completamente bizarro, usa-se quando as pessoas querem um subsídio por razões e com fundamentos que também não fazem sentido, usa-se quando as pessoas têm um determinado estatuto remuneratório não querem naturalmente perder, usa-se quando as pessoas trabalham com determinadas funções e não querem passara a trabalhar noutras que é uma coisa normal nas profissões que é, eu estou a fazer uma coisa essa tarefa acabou, eu tenho que ser transferido, tenho que me ser dadas novas funções, novas tarefas. As pessoas têm uma enorme resistência a isso, têm uma enorme resistência quando fazem uma coisa a passar a fazer outra coisa. Uma enorme resistência em aprender, quando temos que aprender, temos que aprender permanentemente.

E de facto uma das soluções para mim está em evitar essa construção, em evitar em apontar a perversão que há nessa teoria dos direitos adquiridos.

Agora como é evidente isto não significa que não haja situações que mereçam atenção, quer dizer quando as pessoas apostaram uma vida inteira num determinado modelo de expectativas e depois subitamente essas expectativas, percebem que face às circunstâncias essas expectativas que tinham estão completamente frustradas, é óbvio que se calhar há situações de confiança, boa fé, expectativas que se devem ser legitimamente consideradas, que devem ser legitimamente atendidas. O que não pode haver é uma lógica de permanente invocação dos direitos adquiridos por tudo e por nada.

E é isso que tem que ser combatido. Porque antes na Constituição portuguesa estava um princípio que era o princípio, ainda está aliás, mas que antes tinha um nome esquisito, é o princípio do “Não retrocesso social”, quer dizer não se podia fazer nada, criava-se uma coisa, garantiam-se uns direitos sociais não se podia recuar, porque se se recuasse era inconstitucional, violava-se a Constituição. Ainda hoje é assim. E faz sentido que assim seja até certo ponto. Se nós agora acabássemos com o sistema Nacional de Saúde isso não só seria uma injustiça e uma tragédia, mas seria uma coisa do ponto de vista constitucional errada e inconstitucional porque não é possível, porque há esse princípio, porque se estaria aqui a privar um conjunto de pessoas da garantia de um bem que é um bem fundamental que é a saúde.

Agora esta lógica hoje em dia foi substituída por outra, foi substituída pela tal abundante e constante invocação dos direitos adquiridos. Só que isto tem um problema como eu há bocado referia, é que as pessoas invocam tanto os direitos adquiridos que no fundo criam, conflituam uns com os outros invocam os seus direitos contra os direitos dos outros.

Porque o que nós estamos a falar é que é um conflito, é que é um genuíno conflito entre direitos. Pessoas que invocam determinados, pessoas que invocam direitos que lhes foram concedidos para construir um determinado prédio, por exemplo, numa zona que é uma área protegida, ou que tem sensibilidade ambiental, ou que não tem nada a ver com a paisagem, ou com o contexto e isso infelizmente foi a pratica comum durante décadas em Portugal, tanto que como sabem o nosso urbanismo e em Portugal as nossas cidades estão nalguns casos destruídas porque, o Algarve por exemplo, é evidente que as pessoas podem ter um determinado direito que algum autarca, que algum presidente da câmara lhes concedeu por razões que não vamos agora conjecturar, mas há os direitos das outras pessoas, há os direitos das pessoas que moram naquela zona, há os direitos dos vizinhos.

Quer dizer, a lógica dos direitos adquiridos leva à criação de um clima de conflitualidade social que não é comportável, que não é sustentável. Portanto, é preciso não ter nenhuma espécie de dúvida em condenar, acho eu, essas teorias, essa invocação constante, gratuita dos direitos adquiridos.

Porque há situações que são complicadas, há situações de tensão e de conflito em que alguma coisa vai ter de ceder, e aí receio que não haja soluções inteiramente justas, o que nós temos que fazer é tentar minimizar a injustiça da melhor maneira possível.

Tentar fazê-lo, isso há formas de o fazer, uma forma de o fazer é explicar bem às pessoas o que é que se quer fazer. Não é dizer: os senhores não trabalham, não fazem nada e por isso acabou, é a tal lógica ad terroren que eu há bocado falava. As pessoas muitas vezes dos poderes públicos tratarem os Funcionários do Estado de uma forma que não é, não me parece ser a melhor para os persuadir sobre as mudanças que eles têm de enfrentar.
 
Ana Sofia Carvalho
Antes de mais gostaria de cumprimentar o dr. Pedro Lomba e os restantes presentes, gostaria de colocar uma questão que está relacionada com o direito urbanístico.

A nível dos planos directores municipais todos sabemos que existem comissões técnicas de acompanhamento, onde por vezes, diversas entidades têm que dar pareceres sobre a mesma parcela, além disso há um infindável número de pareceres não vinculativos de outras entidades externas, o que faz com que seja um processo burocrático muito complicado e, ao mesmo tempo, o facto dos pareceres não serem vinculativos, também prejudica o andamento do processo e as resoluções de acordos. No nosso entender isto provoca um atraso por vezes irreversível nalguns municípios.

Gostaríamos de saber o que pensa desta problemática, e que soluções consegue vislumbrar para este problema? Obrigado.
 
Dr.Pedro Lomba
Em primeiro lugar, temos o diagnóstico que de alguma maneira referiu que é, em muitos destes procedimentos administrativos urbanísticos não só urbanísticos, o licenciamento de actividades etc., são procedimentos em que há formalismo a mais, há um peso excessivo da intervenção de entidades externas, pareceres não vinculativos, admito que nalguns casos isso é inevitável, porque nalguns casos é preciso, estamos a falar de situações transversais, de problemas transversais, é preciso que haja uma entidade que trata do ambiente, outra entidade que trata da economia, outra entidade que trata dos consumidores, etc.

Admito que isso seja nalguns casos inevitável.

Agora, é preciso ver procedimento a procedimento, ver caso a caso e acho que temos é que estudar - isso é um trabalho óptimo para vocês fazerem nas universidades, etc., os juristas, os que estão nestas áreas, é pegar por exemplo, nestes procedimentos, licenciamento industrial, licenciamento camarário, licenciamento de estabelecimentos comerciais, de grandes unidades comerciais, etc., pegar nisso e perceber onde é que está o essencial e onde é que está o acessório, o que é que se pode fazer para mudar.

Por exemplo, há países europeus em que estes procedimentos são feitos, em que se procura racionalizar estes procedimentos criando instâncias próprias que concentram todos esses actos que são exigidos, quer dizer, procuram centralizar a informação, em vez da informação estar dispersa por pareceres de todas essas entidades, o que conduz a uma demora brutal dos procedimentos, essas instâncias são elas próprias que centralizam a informação e que vão pedindo os pareceres relevantes e assegurando que em vez do procedimento demorar 30 mais 30, mais 30 dias, em vez disso demora metade.

Nalguns procedimentos administrativos e urbanísticos de grande dimensão, no estrangeiro, é assim que as coisas se fazem, é assim que as coisas se fizeram e já se fazem há algum tempo.

Portanto, aqui acho que é preciso ver procedimento a procedimento, acho que é inevitável a intervenção deste tipo de entidades porque elas velam pelos interesses públicos eu prosseguem. Agora, o que me parece é que para quem estuda isto, para quem tem de aplicar isto deve haver aqui um esforço crítico, e aí o vosso o nosso contributo é muito importante para perceber o que é que eventualmente se poderia alterar, de que forma é que estes procedimentos poderiam estar mais concentrados, de que forma é que se poderia simplificar.

No fundo a preocupação que está subjacente à sua pergunta é a simplificação, é simplificar, o que é preciso é simplificar, o que é preciso é em vez de complicar, nós infelizmente temos um grande complicómetro, vamos simplificar.

Não lhe consigo dizer mais sobre isto e já entramos num domínio que é muito técnico, e portanto julgo que estas preocupações são preocupações que acho que são comuns e que no fundo permitiriam atingir esse paradigma de simplificação administrativa, que me parece que é fundamental.

 
Dep. Carlos Coelho
Bom, terminaram as questões dos grupos e dei agora início às questões livres e dizer que temos cerca de 50m para efectuar questões, portanto penso que poderão ser satisfeitos todos os pedidos, eu vou anotar todos os nomes, depois farei uma leitura dos nomes todos a ver se falta alguém e daria início às questões, quem me quisesse responder que me fizesse sinal.
 
Dinis Filipe Carvalho
Antes de mais bom dia, gostaria de felicitar o nosso convidado o dr. Pedro Lomba por se ter disponibilizado para vir aqui fazer uma excelente conferência à Universidade de Verão. Posteriormente, queria referir que estamos todos muito cansados porque foi uma semana extenuante, trabalhámos todos muito mas estamos todos satisfeitos porque crescemos tanto como políticos e como pessoas. A minha pergunta o dr. Pedro Lomba já referiu o tema é sobre Portugal e a Irlanda.

Portugal e a Irlanda encontrava-se mais ou menos no mesmo estádio de desenvolvimento quando entraram para a União Europeia, sempre receberam as mesmas quantidades de fundos comunitários, porque é que eles cresceram enquanto que nós quase estagnámos, terá isto a ver com o espírito latino em detrimento do espírito anglo-saxónico. Desta forma somos um país saudosista devido às glórias do passado, como é que podemos mudar este facto?
 
Luís Sampaio
Bom dia a todos, em primeiro lugar gostaria de saudar a mesa em especial dr. Pedro Lomba e de agradecer a sua disponibilidade para estar aqui hoje connosco. A questão que gostaria de lhe colocar tem a ver com o programa de reforma da administração central do estado, em que no âmbito desse programa uma das principais conclusões foi que o Estado para reduzir o seu peso deveria implementar serviços partilhados, isso é uma reforma que alguns dizem que demoraria muitos anos e que é uma coisa absolutamente megalómana já que o governo pretende implementar esse conceito em toda administração pública portuguesa. Para 2007 está previsto um programa piloto para o Ministério das Finanças, que o governo pensa que o vai conseguir estender a todos os organismos do Ministério das Finanças, num único, ano e depois em 2008 alastraria esse conceito a todos os organismos da administração pública, o que eu gostaria de saber é qual é a sua opinião sobre o tema e se acha que a medida é ou não megalómana e é possível ou não de implementar. Obrigado.
 
Dr.Pedro Lomba
Então vamos começar pela Irlanda. Ora bem, há pouco eu referi alguns aspectos que ajudam a perceber um pouco a diferença, o sucesso do tigre celta como se chama hoje à Irlanda.

A Irlanda em meados dos anos 80 tanto quanto eu sei, em meados dos anos 80 tinha de facto um nível de despesa pública que era muito próximo do nível português. Era um país agrícola, era um país com um tipo de economia com grandes semelhanças com a economia portuguesa. A Irlanda a partir da segunda metade dos anos 80 começou a fazer um conjunto de reformas, e também que duraram para o princípio dos anos 90, que procuraram reduzir substancialmente o peso da despesa pública e o peso do Estado. Essas reformas foram reformas que de facto deram frutos, e foram reformas muito importantes. Em segundo lugar, houve como se sabe uma aposta muito importante na educação, educação técnica, é evidente que educação técnica tem uma grande vantagem é que eles falam inglês e, portanto, conseguem estabelecer pontes com os Estados Unidos e com o universo anglo-saxónico que nós por exemplo, nós não conseguimos fazer e não conseguiríamos fazer, mas estas duas realidades ajudam a perceber porque é que os irlandeses conseguiram alterar radicalmente o paradigma económico em que tinham assentado.

E têm hoje uma economia que é bastante dinâmica, porque consegue conjugar níveis perfeitamente razoáveis da despesa e de endividamento do Estado com uma fortíssima preparação técnica das pessoas, com um sistema educativo que funciona, e portanto todas estas ideias acho que ajudam a perceber o milagre irlandês de alguma maneira.

Agora, nós preferimos de facto um modelo de desenvolvimento que foi diferente, e que fez sentido provavelmente durante um certo período de tempo, aquele modelo do Estado construtor, o modelo das obras públicas, o modelo do investimento público, etc. Esse modelo é um modelo que de facto fez sentido porque foi preciso, os governos do Prof. Cavaco Silva, que foi preciso que o país na altura se dotasse de infra-estruturas que não tinha, mas cedo ou mais tarde esse modelo teria que ser substituído por outro.

E não substituímos esse modelo por outro, infelizmente, ou só mais recentemente é que percebemos que esse modelo terminou. E, por outro lado, a nossa aposta no sistema educativo, na educação é uma aposta que tem sempre a burocracia do Ministério da Educação, as confissões de enamoramento que os políticos fazem em relação à educação, mas depois os resultados práticos dessa paixão pela educação, como diria o eng. Guterres, acabam por ser bastante mais pobres do que nós esperaríamos.

E isto de facto é uma diferença que nos separa da Irlanda. Mas como há uns tempos dizia o Vasco Pulido Valente num artigo que ele escreveu, também devemos ter algum cuidado com isso, porque a Irlanda tem circunstâncias que nós não temos, a Irlanda está ao pé da Inglaterra, pode fazer a ponte entre os Estados Unidos e o reino Unido. Os países têm condições objectivas e têm vantagens comparativas, e há vantagens comparativas que a Irlanda tem que nós não temos. Portanto, esta ideia de que no fundo temos que nos transformar todos numa Irlanda, temos que ter algum cuidado também com este discurso, não só porque é um pouco provinciano nalgumas coisas, mas também porque não me parece que nos vá levar a grande sítio.

Segunda questão, sobre a Reforma da Administração Central e sobre essa temática complicada dos serviços partilhados. Não tenho elementos para compreender se o princípio, o princípio parece-me à partida correcto, não sei se o horizonte temporal que se fixa para a implementação deste princípio é ou não megalómano, é ou não exagerado ou ambicioso. Acho uma coisa, é que é preciso que o governo esteja preparado para a resistência que vai encontrar, nomeadamente porque como sabemos, há uma resistência, uma oposição enorme no aparelho de Estado, no aparelho administrativo do Estado, sobretudo por parte de sectores muito significativos dos funcionários públicos em ver alteradas as suas funções, ou a orgânica em que se inserem. No fundo há uma resistência à instabilidade.

A implementação deste programa de serviços partilhados vai implicar instabilidade. E, portanto, por um lado, vai precisar que os governos, este ou outro, sejam suficientemente capazes para enfrentar essa resistência, para convencer as pessoas disto mesmo, e vai obrigá-los a cumprir calendários. Uma coisa que nós temos apercebido deste governo é que não há um único calendário, o melhor é eles não fazerem calendarizações temporais, porque eles não as cumprem. Portanto, que ao menos nos fixem as ideias porque relativamente à implementação e à calendarização temporal há grandes dúvidas. Onde é que está o plano tecnológico, onde é que está o MIT, onde é que isso está?

E aquilo que eu lhe posso dizer sobre este assunto, não sendo eu um especialista em reforma administrativa e em gestão pública em nenhuma dessas matérias como sublinhei desde o início aqui, parece-me que pode ser uma coisa relativamente ao calendário que pode ser uma coisa um pouco ambiciosa.

Agora, o que também não podemos esquecer é que há coisas que têm que ser feitas, e têm que ser feitas já, não se trata de encarar isto como um choque, como aquela lógica do choque tecnológico, choque fiscal etc., mas há coisas que têm que ser feitas. Têm que ser feitas imediatamente. Aí admito que o inevitável vá acontecer, que é a resistência, as dificuldades de concretização, etc.

Quanto à própria justeza e bondade dessas soluções confesso que teria que estudar um bocadinho mais para responder a isso, não sei, teria que estudar um bocadinho mais para perceber se de facto essa visão se aplica, é uma visão que se aplique, que faz sentido nesse Ministério se faria sentido noutro, se há alguns sítios em que não faz sentido de todo, o que é que o Governo pode fazer, julgo que é uma questão que teria de estudar melhor. Muito obrigado.
 
José Pedro Salgado
Muito bom dia. Gostaria de saudar o dr. Pedro Lomba por vir cá brindar-nos com a sua sapiência e correndo um risco de criar um ódio visceral à Faculdade de Direito de Lisboa, queria dizer que também me é particularmente caro que esteja cá e venha pelo menos mostrar a qualidade da nossa Academia. A minha pergunta trata de um assunto que falou há pouco, sobre a politização da Administração Pública. Quando falou sobre uma eventual profissionalização da Administração Pública eu lembrei-me quase imediatamente do “Sim, Sr. Ministro” da figura do Sir Humphry, aquele funcionário público que já conhece os vícios, as manhas todas do sistema, e da subversão com que ele consegue operar as decisões que acabam por nunca acontecer praticamente, tendo em conta que já assim a Administração Pública acaba por ser um lobby digamos com alguma força, com algum poder e com alguma ineficiência que muitas vezes é culpada também por muitas boas decisões não chegarem a bom porto, não tem medo de que com uma profissionalização da Administração Pública este problema ainda se venha a agravar? Muito obrigado.

Esse problema de uma força excessiva da Administração Pública que não seja eventualmente saudável para o nosso sistema político.
 
Frederico Carvalho
O chamado little platoon como há bocadinho o dr. Pedro fez referência, é constituído pelos movimentos estudantis, pelas associações juvenis, pelos grupos de reflexão, elas (…) do ensino superior com cerca de 1000, 10 000 ou mais alunos. Como é que vê ao nível das juventudes partidárias nos diferentes ideais e planos políticos, elas lidam com o triplo ou dez vezes mais das pessoas  e elas não têm nem a mesma participação cívica, não têm a mesma visibilidade e têm muito menos actividades sociais e culturais. Obrigado.
 
Dr.Pedro Lomba
Bem a primeira questão. Defendo naturalmente uma cultura administrativa tendencionalmente profissionalizada, no sentido em que acho que a Função Pública deve de facto ter um certo, um prestígio, uma relevância social, uma relevância pública que se está a perder e que perdeu também graças a essa politização excessiva de que há bocado falava.

Mas não estou a dizer que isso vá ser a panaceia para resolver naturalmente todos os problemas e para resolver o problema do peso dessa administração. Até porque há um outro aspecto que não discutimos aqui, que me parece que é muito importante que é, e sobre a qual eu também só conheço de ler coisas, não sou nada especialista nisto, pelo contrário. Mas, como é que as organizações funcionam essa é a questão, como é que as organizações funcionam, e as organizações funcionam hoje em dia de acordo com critérios e princípios de grande informalidade. Não sei se vocês têm a noção de que hoje em dia, para agora discutirmos uma coisa diferente, o peso da inteligência emocional na vida das organizações é fundamental, muitas vezes as organizações não querem tanto pessoas extraordinariamente competentes mas que tenham mau feitio, não querem é pessoas que se adaptem e que sejam emocionalmente flexíveis, que consigam agir em momentos de tensão, que consigam adaptar-se a situações de crise. Isso aliás é uma coisa que é fundamental nos nossos tempos. Há uns tempos lia uma entrevista, um desses gurus da gestão, ele dizia isso, falava sobre o peso das emoções na capacidade que as pessoas têm de se inserir em organizações, e isto é válido para o sector privado e válido para o sector público.

É válido para o sector público porque é preciso que as pessoas que trabalham no sector público, por mais profissionalizadas que sejam, reagem desse ponto de acordo com aquilo que se espera delas. Por isso, aliás, é que há uns tipos ali no Economist que o mundo hoje em dia é muito mais favorável às mulheres do que aos homens. Que a nossa civilização é muito mais favorável às mulheres do que aos homens por causa do peso da inteligência emocional, isto vinha no Economist aqui há duas ou três semanas e dizia basicamente as mulheres é que ganharam, é que estão a ganhar por causa disso mesmo: por causa da relevância que a inteligência emocional tem nas organizações.

Acho que esta ideia é uma ideia que é engraçada, mas respondendo directamente à sua pergunta, o que eu acho é que isto tudo, a organização, o sector público naturalmente de informalidade, precisa de formas de simplificação, de adaptação, a tal inteligência emocional dos seus funcionários, tudo isso é absolutamente fundamental. E isso tem a ver com uma espécie de código de conduta, daí existir uma espécie de conduta, código de comportamento das pessoas que trabalham no sector público que lhes permita de facto mudar mentalidades, mudar hábitos.

Há pouco falava do Sir Humphrey, manhas, e expedientes e esquemas, isso há em qualquer sítio, em qualquer sítio, no sector privado também há, no sector público também há, no sector público no sector privado, em qualquer organização há pequenos pormenores, as organizações não funcionam racionalmente. Isso é uma ilusão muitas vezes dos gestores e dos especialistas em organizações que nos vendem sempre promessas de mundos racionais, porque as pessoas não são racionais, e se as pessoas não são racionais as organizações também não são racionais. Portanto, hoje em dia a questão da adaptação é fundamental, é como nos clubes de futebol, quer dizer, uma pessoa pode ser um péssimo jogador num sítio e depois a seguir muda para outro clube e transforma-se num grande jogador. Tem a ver com a capacidade que as pessoas têm de se inserirem nas organizações nas quais se integram. E isso é tão ou mais importante do que a própria forma como a estrutura está organizada, da questão de saber se a Administração Pública está ou não está profissionalizada, etc.

Quanto à outra questão sobre os tais Little Platoons, que é aquela expressão daquele filósofo não sei se vocês conhecem que é o filósofo Edmund Burke que escreveu aquele livro contra a Revolução Francesa, muito bem escrito e cuja leitura vos recomendo vivamente, ”Reflexões sobre a revolução em França”, que é uma espécie de ensaio fundamental sobre o que é o conservadorismo moderno. E o conservadorismo moderno é isso, é a defesa de uma sociedade que assenta em células, em unidades. Há pouco estava a falar sobre movimentos estudantis, etc., isso é uma pequeníssima parcela do que aqui está em causa. O que aqui está em causa é a criação de associações, fundações, sociedades, etc.

Nos Estados Unidos todos os meses há um número muito considerável de sociedades que entram em falência, acabam, mas também há um número muito considerável de empresas que são criadas. A vida é isto, morre-se, nasce-se e está sempre neste ciclo, nesta dinâmica permanente.

No fundo, é este universo de alguma maneira que nós nos temos de habituar. E um dos nossos problemas é de facto, o escasso peso do associativismo em Portugal, que é uma coisa que eu não sei como é que se combate. Tem que se combater através, têm que se encontrar formas de estimular, de se incentivar o associativismo de muitas maneiras, financeiras, fiscais, profissionais, etc. Podemos pensar nisto, mais uma semana aqui e pensávamos nisto.

Mas há um problema português que é difícil de ultrapassar, que é a ideia de que as pessoas em Portugal confiam pouco umas nas outras. E sem confiança no chamado tecido social, como se diz, sem confiança no tecido social não é possível a criação destes little platoons, mas isso é fundamental.
 
Frederico Carvalho
Mas a minha pergunta estava mais relacionada com o facto das associações e os movimentos terem poucas pessoas mas fazerem muito e as juventudes partidárias têm mais pessoas mas fazem menos, têm menos visibilidade, era mais relacionado com isso e não tanto com os little platoons.
 
Dr.Pedro Lomba
Eu acho que isso é uma reflexão que as juventudes partidárias devem fazer, por exemplo. Será que as juventudes partidárias, o modo como estão organizadas, será que hoje em dia faz sentido que estejam organizadas nestes termos. Por exemplo, será que faz sentido que as juventudes partidárias sejam uma réplica dos partidos? Mimetizem os partidos? Sejam o partido mas composto por jovens? Não seria conveniente pensar-se num tipo de organização. Eu não sou daquelas pessoas que vem para aqui dizer extingam-se as juventudes partidárias. Não. Acho que isso é importante e tudo aquilo que afaste as pessoas de vidas ilícitas é importante, e no caso das juventudes partidárias acho que há duas coisas que ajudam a formar políticos, a experiência local e a experiência nesse tipo de organizações, muito honestamente acho que isso é importante. E por exemplo, acho que infelizmente o recrutamento de políticos em Portugal não é feito nas condições mais adequadas por isso, porque se desvaloriza muito o peso local que permitiria um melhor recrutamento dos políticos.

Acho que esse diagnóstico que fez, é um diagnóstico que deve ser objecto de reflexão por parte das juventudes partidárias, saber se de facto elas se organizam como eu dizia da melhor maneira, que é que podem fazer para alterar.  E eu tenho dúvidas que uma forma de mimetizar, mimetismo entre as juventudes partidárias e os partidos seja a forma mais adequada. Eu acredito mais numa coisa mais informal, se quiserem mais.. Hoje, aquilo que faz falta em Portugal é pessoas que tenham estudado os assuntos e que nos digam coisas nas quais não pensámos, ou que nós verdadeiramente não sabemos, e para isso só há uma maneira de fazer isso, é ter as pessoas a estudar, essa é uma das críticas que eu faço às juventudes partidárias, porque é que elas não estudam mais, porque é que os membros das juventudes partidárias não fazem o que vocês estiveram a fazer aqui durante esta semana, foi precisamente isso. O que é preciso é estudar os assuntos, o que é preciso é estudar os temas para se poder oferecer soluções alternativas, programas alternativos, etc.

Isto não significa que a política não deva ser uma actividade lúdica também, e eu acho que é. Mas a política tem que ser também uma actividade consequente as pessoas fazem política para oferecer e criar soluções alternativas, e é isso que me parece que falta.
 
Pedro Esteves
Bom dia mais uma vez, uma das discussões que está na berlinda e que faz parte dos nossos dias dentro das nossas instituições do ensino superior, é a lei da autonomia. Durante estes dias ouvi várias pessoas a defenderem a gestão profissionalizada. Hoje em dia as instituições de ensino e engana-se quem julgue que não é assim, tantos os Conselhos Directivos, como as Reitorias, como as Presidências das instituições não são mais do que o centros de decisão em que se definem políticas, definem-se estratégias e normalmente a longo prazo, em paralelo normalmente existe um Conselho Administrativo e este por norma, este sim, é dos quadros e faz parte das instituições.

Existe uma lei de financiamento paralela a esta lei de autonomia, essa acreditamos e julgo que sim é um entrave à boa gestão das instituições. Não seria mais benéfico aproveitar o que estas instituições já têm de bom, porque da mesma forma que existe e está demonstrado que há más gestões em algumas instituições, há outras que têm boa gestão e acabam por chegar ao final do ano e ainda têm um resultado positivo líquido. Resultado esse que devido à sua lei de financiamento normalmente é automaticamente congelado para a o ano seguinte.

Ou seja, não era mais benéfico valorizar as boas instituições e as boas gestões, aquelas que têm bons resultados no final darem-se incentivos para que sejam ainda cada vez melhores, ao contrário daquelas que são boas tenham de alguma forma algum entrave depois e alguns obstáculos para o próximo ano seguinte. Ou seja, quem é má se mantenha má, quem é boa cada vez seja melhor.
 
Dr.Pedro Lomba
Eu concordo e subscrevo inteiramente o que disse. Eu acredito muito na autonomia universitária. É evidente que todas as nossa convicções têm sempre, quando uma pessoa pensa verdadeiramente numa convicção que tem descobre sempre defeitos, e naturalmente que há defeitos, as universidades também funcionam segundo lógicas de fidelidade não só de mérito, também funcionam segundo lógicas corporativas e aliás por princípio. Mas acho que disse duas coisas que são muito relevantes.

Em primeiro lugar, a ideia de que, julgo que isso estava subjacente ao que disse, a ideia de que as universidades do ponto de vista financeiro têm que ser geridas segundo critérios de gestão. Quer dizer, não faz sentido nenhum que uma universidade pública não tenha por exemplo, um gestor. Um gestor. Como aliás as escolas do ensino secundário não tenham também um director, e depois dentro da direcção alguém que se responsabilize pela gestão do dinheiro que a escola tem. No caso das universidades naturalmente que comporta outro tipo de custos.

Acho que é fundamental que as universidades tenham gestores, porque o que é que acontece é que os professores que supostamente deviam dar aulas, deviam investigar são eles que têm que gerir a universidade, não têm nenhuma competência para gerir, não sabem o que é que é gerir, nunca geriram, porque é que são eles a gerir. Porque é que por exemplo, na Faculdade de Direito de Lisboa, há professores de Direito Romano que estão a gerir, uma pessoa que ensina Direito Romano por princípio não sabe gerir. Há casos desses, isto até é verdade e a pessoa de quem eu estou a falar até se queixa disso, portanto não estou aqui a fazer nenhuma crítica.

Ou seja, as universidades têm que ter que ter gestores é assim que as universidades estrangeiras funcionam, têm gestores. Pessoas especificamente vocacionadas para os aspectos financeiros, para a gestão dos recursos da universidade. Para a gestão de recursos e para a procura de novos recursos, para tentar novas angariações. Porque é que as universidades portuguesas não têm gabinetes externos no sentido de tentar arranjar parcerias com outros institutos de investigação, outras universidades, planos, projectos externos, porque é que isso não é feito? E não é feito porque muitas vezes quem dirige são os professores e os professores têm que ensinar, têm que investigar e depois já não lhes sobra tempo naturalmente para avançar com projectos dessa natureza.

Outra coisa que disse que acho que é muito importante, e que acho que entronca numa coisa em que eu acredito, eu acredito na liberdade, eu acredito absolutamente na liberdade em tudo. Porque é que as universidades não hão-de ter liberdade? Têm superhavits como se diz na linguagem, administraram bem os seus recursos, devem ganhar por isso, devem ser valorizadas por isso e devem gozar esse dinheiro que pouparam, devem ser autónomas, absolutamente autónomas no dinheiro que pouparam. Porque senão, a que é que isso conduz, conduz a exercícios menos transparentes em que as pessoas escondem o modo como geriram as suas contas, porque sabem que se apresentarem determinados resultados financeiros positivos e superiores, no próximo ano têm menos orçamento, no próximo ano são penalizados, o melhor é eu não vou demonstrar que geri bem, vou demonstrar que geri mal para no próximo ano reivindicar ainda mais, e é assim que as universidades portuguesas funcionam.

Isto é uma coisa completamente irracional. As universidades que gerem bem, devem poder colher os frutos e os benefícios da sua boa gestão, os outros devem arcar com as consequências. Mas sobretudo deve haver liberdade. E devo dizer-vos que eu se tiver algum dia responsabilidades públicas em Portugal, e não vou ter porque não me vão dar isso, não confiam responsabilidades públicas a lunáticos, mas se eu algum dia tivesse responsabilidades públicas em Portugal, em matéria educativa fazia grandes razias nessa matéria, mas grandes.
 
Francisco Mestre
Bom dia a todos bem-haja ao dr. Pedro Lomba. Tendo em conta o elevado número de estruturas administrativas no nosso país, algumas com funções bastante gerais, umas com mais peso, mais influência que outras. Gostava de saber qual é que é o papel dos Governos Civis neste momento no nosso país. Obrigado.
 
Tiago Sá Carneiro
Bom dia a todos os presentes na sala e em especial ao dr. Pedro Lomba. Na sua qualidade de conhecedor experiente dos assuntos que abrangem o nosso Estado, não reconhece uma falta de conhecimento e apoio por parte dos nossos dirigentes governamentais para com as nossas forças de segurança pública, tais como a PSP, a GNR e os Bombeiros. Estes grupos considerados soldados da paz não se sentem protegidos, e as suas acções por socorro do nosso país têm sido incompreendidas, limitadas e restritas. Estes profissionais acusam baixos ordenados, falta de condições nos locais de trabalho, a resposta à responsabilização por actos cometidos no cumprimento do dever e a falta de apoio do Estado. Na sua opinião a credibilidade e o respeito destas forças não estará cada vez mais fragilizada, e não estarão os portugueses a sentirem-se cada vez mais inseguros? Obrigado.
 
Dr.Pedro Lomba
As duas perguntas, não sei se tenho respostas completamente satisfatórias para as perguntas que fizeram. Quer dizer a primeira pergunta sobre os Governos Civis, pergunta-me a importância dos Governos Civis, eu não sei muito bem porque os Governos Civis são a sobrevivência de um determinado modelo de organização administrativa em que o Estado queria estar presente em todas as áreas do território para poder fazer a interacção com os órgãos locais, etc.

Será que são indispensáveis os Governos Civis para essa interacção? O que é que fazem hoje os Governadores Civis? Fazem muita coisa, autorizam os concursos, têm um conjunto de poderes da lei também de autorização para outro tipo de actividades, depois têm poderes importantes em matéria de emergência, que salvo erro, se eu estou bem recordado da lei, aqui há uns tempos andei até a estudar isso, mas em matéria de poderes não fazem de facto muito. São pessoas que do ponto de vista social, respeitadas ou consideradas nos distritos, tenho algumas dúvidas. Será que são conhecidos, tenho algumas dúvidas que sejam conhecidos. Há um facto que milita a favor deles é que muitas vezes as populações quando se querem queixar vão ter com os governadores civis. Às vezes isto é importante, às vezes esta coisa de haver alguém que nós sabemos que é se eu tiver, se eu quiser queixar-me, se eu quiser protestar devo dirigir-me àquela pessoa, isto tem um efeito positivo.

Eu acho que é, que este é o principal efeito positivo dos governadores civis é o de servirem, de fazerem instâncias sobre as quais as pessoas podem exercer o seu direito de protesto se alguma coisa lhes corre mal, não vejo honestamente outra. E até certo ponto, pensando numa reforma global do Estado, eu julgo que eles podiam ser dispensados, julgo que os Governos Civis podiam ser claramente substituídos. Mas isto é uma visão pessoal, é aquela que eu gostava de transmitir aqui.

Segunda questão, sobre as forças de segurança, a GNR, Bombeiros, também podia falar das Forças Armadas não é!? Sim, mas excepto os Bombeiros, caso da PSP, a GNR as Forças Armadas também todas estes serviços de soberania dependem de um determinado estatuto, há um estatuto social que lhes tem de estar associado, um dos grandes problema, hoje em dia, do Estado lidar com as Forças Armadas em Portugal e as Forças Armadas durante muito tempo também cresceram demais, engordaram, são um bom exemplo dos vícios do Estado, um dos grandes problemas é como é que o Estado diz a um militar que não lhe pode pagar mais, e ao mesmo tempo lhe diz que o seu estatuto e a sua condição social, a sua importância social se mantêm intactos. Porque as Forças Armadas, historicamente precisam disso, as Forças Armadas precisam de uma determinada noção da sua própria importância. Se isso lhes é retirado, se no fundo aquilo que lhes é dito é, os senhores não passam de uma categoria de funcionários públicos igual, na prática, aos outros funcionários públicos, eles não aceitam. O que acontece hoje em dia no caso das Forças Armadas é isso, e isso é válido também para as polícias. Eles precisam dessa mesma condição e prestígio social permanentemente garantidos. Agora, isto exige que sejam naturalmente bem pagas e o que acontece é que, aquilo que eu acho que tem que existir é em primeiro lugar, tem de haver um discurso público da parte dos políticos de credibilização e de respeito e de motivação por parte destas pessoas, não pode haver um discurso que minimize as Forças de Segurança, não pode haver um discurso que minimize as Forças Armadas, não pode haver um discurso que minimize a GNR, não pode haver um discurso neste género, não pode haver um discurso. E aliás os governos de esquerda sabem lidar pior com isso, porque os governos de esquerda o que acontece, os governos PS, sobretudo, têm um preconceito em lidar com estas matérias porque não conseguem, para eles são manifestações de autoridade. E onde eles vêm autoridade vêm autoritarismo, ora autoridade autoritarismo são coisas diferentes, autoridade não se tem de exercer com autoritarismo, autoridade tem que ser respeitada, porque a sobrevivência do Estado depende dessa autoridade.

Portanto, a adopção de um discurso de credibilização dessas instituições parece-me ser fundamental. A dignificação do modo como elas funcionam, do modo como elas exercem as suas tarefas também me parece fundamental, há certas coisas que eu acho que têm que ser garantidas, há certos subsídios de risco, coisas dessas que só em concreto é que podemos saber, podemos estudar e eu só consigo dizer generalidades sobre isso, mas todas essas coisas parecem-me que são relevantes e que devem ser estudadas, devem ser vistas. Isto não significa abrir espaço a todas as reivindicações, porque também se deve evitar que as Forças de Segurança actuem numa lógica corporativa, elas não devem actuar numa lógica corporativa, elas não defendem interesses próprios, defendem um interesse que é público, que é o interesse da segurança, que é capacidade que o Estado tem de ter forças capazes de responder a ameaças que concretamente pesem sobre a sociedade. Mas sem se cair nesse lógica corporativa, parece-me muito importante crias condições que permanentemente dignifiquem o cumprimento por parte desses profissionais das suas funções. E a ideia que há bocado referi da credibilização permanente parece-me ser uma coisa muito importante, nenhum Ministro da Administração interna actuará com inteligência e sentido da realidade se não respeitar, se tiver este preconceito sobre o exercício da autoridade, porque se for assim, o mais certo é naturalmente fracassar.
 
Dep. Carlos Coelho
Bem, é altura de, em vosso nome, em nosso nome, agradecemos ao Dr. Pedro Lomba o facto de ter estado connosco na Universidade de Verão o debate em que participou esta manhã. Recordo a todos que o almoço é há uma hora como de costume, que as assembleias começam às catorze horas e quarenta e cinco minutos, a um quarto para as três em ponto, o Daniel e eu vamos despedir de costume á saída do nosso convidado e Alexandre a equipa de avaliação para proceder aos procedimentos.

Sr. Dr. Pedro Lomba, muito obrigado.
 
Dr.Alexandre Picoto

Antes de terminarmos, pedia-vos agora cinco minutos da vossa atenção, bem sei que estamos todos muito cansados, a semana foi dura, vi aqui maioria de vocês teve a trabalhar até tarde, em todo o caso há alguma considerações e há aqui um elemento que gostávamos de apresentar antes de finalizarmos os trabalhos da manhã.

O nosso reitor, não sei se a maioria leu a biografia dele quando foi distribuída no “falar claro”, além de Eurodeputado, prestigiado, foi responsável já há uns anos pela Comissão Echelon que se prendia principalmente com a avaliação feita às intersecções de comunicações que potencialmente poderiam existir por parte dos Estados Unidos, e neste momento presido à Comissão da CIA. Nesse sentido e em alguma forma a prestigia-lo e a reconhecer todo o esforço que ele dedicou a esta Universidade de Verão, o Rodrigo acompanhado de mais dois ou três elementos, que ele posteriormente poderá identificar, prepararam um vídeo em homenagem ao nosso reitor, que vamos passar, mal os audiovisuais estejam prontos.

É um vídeo essencialmente informativo e que se prende com a nossa preocupação, com a pessoa, nosso companheiro e amigo.

“A Universidade de Verão tem a honra de apresentar.

Na década de oitenta o Governo Americano começou a desenvolver um super sistema de segurança, uma rede intersecção de conversações que durante estes anos evoluiu como mecanismo de controlo dos cidadãos, ?? os interesses da América, interesses de segurança, interesses ?? mas também económicos. Agora o sistema está nas mãos das forças do mal. Mas este alguém usou levantar a voz contra o Império, esse alguém é Carlos Coelho. (falta uma parte)

Bush tremeu, ficou sem resposta (….) Depois tomou o escândalo, chegava notícia de uma luta suja contra o terrorismo, voos secretos, prisões secretas, raptos e tortura. Quando a Europa e o Mundo ficaram sem saber o que fazer, chamaram o único homem à altura da missão, Carlos Coelho, um campeão na luta pelas liberdades direitos e garantias dos cidadãos, mas desta vez as forças do mal não se vão deixar enganar, desta vez vão querer limpar o assunto. Os americanos seguem-no para todo o lado, ouvem-lhe todas as palavras, não o vão deixar escapar, esta é a careca mais conhecida em Wembley, mas também a mais desejada.”