Revista de Imprensa
Registos Audio Fotografias
dia 3 - 10.00
Sessão de Avaliação da UNIV
dia 3 - 12.30
Sessão Formal de Encerramento
dia 3 - 14.00
Almoço de confraternização com UNIVs de 2003, 2004 e 2005
As Funções do Estado: Há gente a mais na Função Pública?
 
Dep. Carlos Coelho
Como sabem, em todas as Universidade de Verão, desde 2004, temos um painel oponente sempre. Ou seja temos um debate com pessoas com opiniões diferentes sobre um tema, de forma a que vocês tenham a oportunidade não apenas de debater uma questão da actualidade, mas de ver como é que dirigentes políticos de primeiro plano esgrimem argumentos e exercem a oposição (eu já lhes pedi) de forma contundente. São duas pessoas muito civilizadas, vamos a ver se ganham pelo menos um nível de contundência próximo daquele que tivemos no ano passado a propósito do aborto, em que tivemos aqui a Paula Teixeira da Cruz e o António Pinheiro Torres, a morderem-se um ao outro com muita elegância, mas também com muita contundência. Este debate é sobre o tema “Há gente a mais ou não na função pública”, e discutir se temos ou não funcionários públicos a mais é indissociável de saber o que é que cabe ao Estado fazer, quais são as funções do Estado. Temos duas pessoas entre nós, a quem agradecemos de forma expressiva o facto de terem aceite o nosso convite. Começo pela minha direita de acordo com o resultado do sorteio: 

Manuel Lancastre é actualmente Vice-presidente do PSD, mas não é nessa qualidade que aqui está, nem na de ex-membro do governo, ex-Secretário de Estado, está aqui porque foi responsável da missão de reforma da administração pública. É um homem que conhece muito bem a problemática da máquina da administração pública em Portugal. O Eng.º Manuel Lancastre tem como hobby a leitura, como comida preferida as favas guisadas, como animal preferido o cão, o livro que sugere é The Fontainhead de Ayn Rand, o filme que sugere é “A missão” de Franco Zeffirelli e a principal qualidade que aprecia nas pessoas é a honestidade.

João Proença: - está à minha esquerda. É também um amigo, que nos distinguiu com a aceitação do convite para estar aqui. Deputado do Partido Socialista. Está aqui como Secretário Geral da UGT, a quem agradecemos muito o facto de ter aceite o nosso convite para participar nesta universidade de Verão. O Eng.º João Proença tem como hobby a leitura, como comida preferida o cozido à portuguesa, o animal preferido é o cão (acho que aliás a única coisa que une os nossos dois contendores é a preferência pelo mesmo animal) o livro que sugere é de Umberto Eco, “Como fazer uma tese”, provavelmente aqueles que estão em humanidades já se “divertiram” a ler este livro que não é grande e é curioso, e o filme que sugere é “Norma Rae”, a história de uma sindicalista norte americana, e a principal qualidade que aprecia nos outros é a lealdade. 

Senhores engenheiros muito obrigado por terem aceite o nosso convite. Vamos fazer o debate. O que está previsto é que cada um fará uma apresentação de 20 minutos, a que se seguirá o debate. O primeiro por sorteio foi o Eng.º Manuel Lancastre, a quem eu dou a palavra. 
 
Eng.Manuel Lancastre
Bem em primeiro lugar, muito boa tarde. Fiquei muito, muito lisonjeado com este convite, e é com muito gosto que também estou aqui para falar sobre um tema que me é particularmente caro, e vou tentar ser o mais claro possível no sentido também de contribuir para aperfeiçoar, no fundo, a opinião aqui da plateia sobre um tema que é um tema muito importante, e é um tema que é colocado de uma forma que traz água no bico. Vamos lá ver: “As funções do Estado”, portanto, e depois, “Há gente a mais na função pública”...Porque é que estes dois temas são relacionados? Porque eventualmente há quem pense que quanto mais funções o Estado tem, mais gente, ou quanto mais funções o Estado assegura, mais gente deve haver, ou que provavelmente os problemas do nosso país, que resultam aqui num défice excessivo e num descontrolo da despesa pública, têm a ver também com gente a mais na função pública e que o mal de tudo isto é o Estado exercer funções a mais. Portanto, há aqui vários temas misturados, e vou tentar aqui nesta intervenção separá-los um pouco, para que entendamos exactamente do que é que estamos a falar.

Em primeiro lugar, e para ser rigoroso, para sermos rigorosos, não podemos responder concretamente se existe gente a mais ou não na função pública, se não definirmos que tipo de Estado é que nós queremos. Se quisermos um Estado que preste muitos, muitos serviços, então vamos precisar de, provavelmente, muita gente; se quisermos um Estado que presta menos serviços, então provavelmente vamos precisar de menos gente. Mas vamos agora pensar num Estado que assegura muitíssimos serviços, mas não os presta directamente. Se calhar esse Estado também precisa de menos gente. Portanto não é possível responder a esta pergunta de uma forma rigorosa, sem tentarmos pensar primeiro que tipo de funções é que gostaríamos que o Estado tivesse. E aí, nessa matéria, apesar de eu não estar aqui a falar pelo PSD, pelo que me foi pedido, mas aí nessa matéria o PSD tem uma posição tremendamente clara e, por coincidência ou não, a minha posição pessoal é muito parecida com a posição do PSD. Mas então vamos lá pensar aqui um pouco, reflectir aqui um pouco sobre as funções do Estado. Por analogia vou dar um exemplo da distribuição alimentar, mercearias e supermercados. Algum de vocês já concebeu a ideia das mercearias e supermercados do nosso país pertencerem todas ao Estado? Ninguém concebe essa ideia, porque de facto não estamos habituados a ver mercearias e supermercados do Estado. Agora se pensarmos bem, a função que as mercearias e supermercados desempenham é uma função fundamental para todos nós, é a função da distribuição alimentar. Nós sem comida não vivemos, morremos não é? E então, quer dizer, uma função tão importante, porque é que não cabe dentro do Estado? E a razão é muito simples: o Estado não intervém no negócio e no sector da distribuição alimentar porque esse sector económico é um sector que funciona bem, onde existe muita concorrência, e o próprio sector se auto regula. Mais ou menos, porque de vez em quando, o Estado, como é evidente, para assegurar que não existem azares, exerce o seu poder de regulação, depois de ter regulamentado muito bem o sector, e depois obviamente, fiscaliza as mercearias e supermercados no sentido de verificar que de facto o sector está a funcionar bem. Mas pronto, isto é um exemplo de um sector, portanto de um serviço que é fundamental para a vida de todos nós, provavelmente o mais importante porque é aquele que nos dá comida, e que não está nas mãos do Estado, isto é, este serviço não é assegurado directamente pelo Estado. E aqui a questão é se este raciocínio não pode ser aplicado a muitos outros sectores, eventualmente menos “importantes”. E a resposta é que sim. Pode ser aplicado a todos os sectores desde que, desde que esses sectores da economia respondam àquilo que o Estado e os cidadãos pretendem deles. Portanto, vamos perguntar, por exemplo, porque é que na saúde os hospitais não são todos privados? Provavelmente porque a iniciativa privada não teve até agora condições para assegurar esse mesmo serviço. Mas se o sector da saúde funcionar não há razão nenhuma para que continuem a haver hospitais públicos, e centros de saúde públicos. Basta, para isso, que o sector económico da saúde funcione de forma concorrente. E, portanto, isto para concluir esta primeira parte, que é um Estado mais leve e melhor, não é porque um sector ou porque um serviço é fundamental para a vida de todos nós que o Estado deve intervir muito mais nesse sector. E, portanto, aqui com este exemplo mostramos claramente que o Estado pode sair, e deve sair, de muitos dos sectores no sentido de intervir directamente e no sentido de gerir directamente as unidades desses sectores, desde que esses sectores funcionem bem. Qual é que é a posição do PSD agora relativamente a isto? Já agora mostro-vos aqui um quadro com a posição formal do nosso partido. É esta, está numa resolução, eu não vou ler isto. Mas o PSD tem, se quiserem podem ler isto na diagonal, tem uma posição muito concreta relativamente à transferência de funções para a iniciativa privada, para sectores sociais, para actividades educativas e culturais, e também no âmbito das atribuições económicas e depois portanto tenho aqui alguns exemplos. Por exemplo como o apoio à família, o apoio aos idosos, o apoio a doentes crónicos, o apoio a deficientes ou então nos sectores da educação, o Estado deve contratualizar com as autarquias e a iniciativa social a rede pública de estabelecimentos do ensino pré-escolar, e por exemplo no sector dos transportes, o Estado deveria concessionar a iniciativa privada, actividades, empresas como a Carris, a Transtejo, o metro de Lisboa, as linhas ferroviárias da CP na área metropolitana de Lisboa, portanto os STCP no Porto e nos portos, deve-se avançar em pleno para a gestão privada dos nosso portos. Portanto o PSD tem ideias muito concretas relativamente à transferência para a iniciativa privada de múltiplas funções actualmente desempenhadas pelo Estado. Agora, porque é que relacionamos este tema com o tema dos funcionários públicos? Porque provavelmente podemos achar que, com a transferência de um conjunto de funções e de serviços para a iniciativa privada, o Estado aligeira na prática a carga de funcionários públicos. Não é bem verdade, porque estes serviços quando são concessionados normalmente levam os seus trabalhadores com eles, e portanto o Estado não pagando de uma forma paga de uma forma diferente, portanto não tem a ver com a transferência para a iniciativa privada, um fenómeno de aligeiramento do número de funcionários públicos. Agora relaciona-se muito um tema com o outro, o tema das funções do Estado com o número dos funcionários públicos, porque se acha, e vamos lá tentar também entender esta questão, porque se acha que um dos grandes males do nosso país é o problema do déficit, e que a causa principal do déficit é o Estado gastar muito mais do que aquilo que deve, e as pessoas também acharem que o Estado gasta muito mais do que aquilo que deve porque existem funcionários públicos a mais. Portanto, isso é o que está normalmente na cabeça de todos nós. E eu vou mostrar que não é bem assim. Muito cuidado com aquilo que normalmente vamos absorvendo das várias fontes de informação. Não é bem assim, mas antes disso vamos também mostrar aqui alguns números só para enquadrar um pouco o que eu vou dizer daqui a pouco. Portanto, vocês não devem ver isto, mas isto são duas barras para cada país, sendo que uma é o crescimento da economia entre 95 e 2005, e o outro mais escuro, aliás o mais claro é o do crescimento da despesa pública e o mais escuro é o crescimento da economia. E vamos ver que entre 95 e 2005, Portugal, portanto a economia portuguesa, cresce 69%, e a despesa pública cresce 89%. Portanto, o crescimento da despesa pública, nos últimos 10 anos, é muito, muito superior ao crescimento da economia. E só há mais um país na Europa em que isto aconteceu: foi a Grécia. Em todos os outros países da Europa, o crescimento da despesa pública foi inferior ao crescimento da economia. E agora vamos lá ver o que é que acontece aqui com a massa salarial no Estado. Acontece exactamente a mesma coisa. Portanto em Portugal a massa salarial aumenta cerca 90%, e também em conjunto com a Grécia, portanto contra 69% de aumento da economia, e também sucede que é também em conjunto com a Grécia, são os únicos dois países em que isso sucede. Portanto Portugal é um dos 2 países na Europa dos 15 em que, nos últimos 10 anos, a despesa pública e os salários dos funcionários públicos, cresceram muito acima da riqueza produzida a nível nacional. E portanto isto é um indício que provavelmente estamos a gastar não só dinheiro a mais como a tendência é para gastar cada vez mais, não só na despesa pública em geral mas também nos salários. Portanto temos aqui um indício, um indício que talvez relacione uma coisa com a outra. Talvez relacione os problemas que sentimos que temos com a questão dos funcionários públicos. Vamos aqui ver mais uns numerozitos. E, por comparação com a Irlanda, e atenção que estas comparações são sempre muito delicadas de se fazerem porque, por exemplo, a Irlanda tem um modelo de Estado muito diferente do nosso. Mas vamos lá ver, para que nós, para que a nossa despesa corrente primária sobre o PIB atingisse os níveis da Irlanda, tínhamos que reduzir em 1/3 a nossa despesa, a nossa despesa pública, isto é brutal. Teríamos que reduzir em cerca de 40% as nossas despesas com o pessoal, na função pública, para atingirmos os mesmos níveis da Irlanda. E o peso dos salários com o pessoal da administração pública corresponde a 15% da riqueza produzida em Portugal, todos os anos, e na média europeia são 10%. Portanto nós estamos a gastar mais 50% em salários com funcionários públicos do que a média europeia, do que a média da Europa dos 15 gasta. E para além disso, a Irlanda tem menos quase 40% de trabalhadores na função pública, quando comparamos com o emprego total gerado no país. E, portanto, isto são tudo números que indicam e indiciam que de facto, talvez tenhamos funcionários públicos a mais, mas com certeza, que temos talvez despesa pública a mais. Talvez, porque mais uma vez tudo isto tem de ser relativizado, e tem de ser contextualizado dentro do modelo de Estado que nós queremos. Portanto, eu talvez resumisse, e aproveitava o resumo para tentar identificar algumas razões pelas quais isto acontece. Vamos lá ver. Em resumo nós podemos dizer que há Estado de facto a mais, temos um Estado maior do que a nossa economia aguenta, temos um Estado mais pesado do que praticamente todos os países da União Europeia, e temos um Estado que cada vez gasta mais. Mas, isto é muito importante, eu penso que temos gestão a menos. Temos Estado a mais mas temos gestão a menos. E quem é que é responsável pela gestão do Estado, por este estado de coisas? Em primeiro lugar são os governantes, e já vamos aqui laborar um pouco sobre isso, em segundo lugar os dirigentes, e só finalmente os funcionários públicos, funcionários públicos que eu nem sequer coloquei aqui, tendo colocado aqui outra questão relacionada com os modelos de gestão. Mas vamos lá ver, há de facto Estado a mais e há gestão a menos. E muito pior do que o problema de termos despesa a mais, e eventualmente alguns funcionários públicos a mais, muito pior do que isso é que a despesa continua a aumentar, está certo? Portanto há fenómenos dentro do modelo de gestão do próprio Estado que permitem que a despesa cada vez suba mais, aparentemente de forma incontrolada. Não só a despesa global como também a despesa com os funcionários públicos. Ora, e quem é que é responsável pela gestão desta despesa e, no limite, responsável por este número de estado? O primeiro responsável são os governantes, e daí os políticos que governam não estão isentos de responsabilidades. Um político, e sobretudo um governante, e isto é muito importante, para além de estar preocupado em regulamentar, em elaborar decretos de lei, ou leis, tem um função tremendamente relevante, que é a função de gerir os organismos que tutela, e essa competência de gestão tem que se aprender ou apreender. As pessoas muitas vezes não nascem com ela. Portanto um governante é também um gestor. E muitas vezes aquilo que se observa, e nos sucessivos governos, é um déficit desta competência, é um déficit de competência de gestão. E quando há déficit de competência de gestão ao mais alto nível, esse déficit, esses problemas depois repercutem-se por aí abaixo. E por isso é fundamental olhar primeiro para a forma como os governantes gerem a administração pública. Eu posso-vos dar aqui alguns exemplos que não abonam muito em média em favor dos governantes, e posso dizer-vos muito, dar aqui 2 ou 3 exemplos. Os governantes têm que saber mobilizar as tropas. Portanto, a gestão é também um acto de gestão de exércitos, e a gestão de exércitos passa pela mobilização das pessoas que estão abaixo do governante. Muitas vezes observam-se dirigentes desmotivados. Dirigentes desmotivados também não conseguem motivar as suas tropas. Então como é que se motiva um dirigente? Envolvendo-o muitas vezes nos processos de decisão. O que observamos é que por exemplo muitos Ministérios têm gabinetes enormes, em que a maior parte das decisões são tomadas a nível dos assessores e os próprios dirigentes não são envolvidos no processo de tomada de decisão. Isto causa desmotivação. Mas também há o processo de selecção dos dirigentes. A politização dos dirigentes faz com que muitas vezes o critério de selecção de um dirigente não seja o critério da competência, seja ultrapassado por outro tipo de critérios. E se o Estado não conseguir atrair para dentro do próprio Estado os melhores dirigentes e os melhores gestores do país, em concorrência inclusive com o sector privado, atenção, em concorrência inclusive com o sector privado, eu penso que vamos continuar a estar condenados a não ter uma gestão da administração pública como pretendemos. Os funcionários públicos no meio disto tudo, têm culpa de ser contratados? Não, não têm culpa nenhuma de ser contratados, o acto de contratação é um acto do dirigente e do governo. O que é se pode, pode acusar-se os funcionários públicos de quê? Muitas vezes de resistência à mudança, talvez para “defenderem” os seus direitos, não entendendo muitas vezes que a defesa dos seus direitos passa, pode passar por alguns sacrifícios conjunturais. Mas aquilo que, a mensagem que eu queria transmitir é que do meu ponto de vista, a principal razão pelo descalabro das contas públicas, a principal razão e a razão mais profunda pelo descontrolo da despesa, não está tanto no excesso de funcionários públicos, que é uma consequência de um mal muito mais profundo. E o mal qual é que é? O mal é, tem sido, em média e em geral alguma incapacidade dos governantes e dos dirigentes gerirem, motivarem e mobilizarem a função pública. E sem mobilização da função pública não há qualquer tipo de reforma, portanto. E, numa empresa, isso também é muito verdade. Não se consegue mudar profundamente uma organização sem os colaboradores dessa organização, ou contra os colabores dessa organização. Portanto eu queria posicionar na prática a mensagem a este nível: provavelmente há funcionários públicos a mais. Mas provavelmente existem funcionários públicos a mais, e não aqueles que nós precisaríamos em muitos dos casos, porque há um déficit de gestão, e o déficit de gestão também resulta na incapacidade de controlar na prática as admissões. Portanto, em resumo, há Estado a mais, há que aligeirar o Estado, há que transferir funções do Estado para a iniciativa privada, e há gestão a menos, e portanto há que tornar, e há que assegurar que a gestão por parte do governo do próprio Estado é muitíssimo mais competente, há que assegurar também que os dirigentes são as pessoas e os gestores mais competentes que eventualmente possamos encontrar no mercado e há que assegurar que para as funções que vão ficando no Estado, que os modelos de gestão também são adequados. E aí faria uma pequena nota só relativamente à proposta do PSD relativamente à profissionalização da gestão das escolas e das universidades. Muito obrigado.              

 
Eng.João Proença
Bem, boa tarde a todos. Em primeiro lugar gostaria de felicitar o PSD, a JSD e o Carlos Coelho por esta magnífica iniciativa da universidade de Verão. E justamente porque estarmos numa magnífica iniciativa, agradecer o convite que foi feito para estar aqui presente, que muito me honra. Foi referido um pouco até, digamos, estar aqui como dirigente do PS, como PS, eu de facto sou do Partido socialista, sou da comissão política há mais de 20 anos, mas não desempenho neste momento o cargo de deputado. Saí da direcção do Partido e saí do cargo de deputado em 95, quando fui para Secretário Geral da UGT. E quero dizer que é como Secretário Geral da UGT que eu me considero que estou aqui, como sindicalista. Até porque teria alguma dificuldade em, como dirigente partidário, marcar distinção com o PSD, porque eu acho que relativamente à administração pública, independentemente quando um está no governo ou da oposição diz mal das medidas do governo, mas na prática, quando um diz mata o outro diz esfola, e portanto teria alguma dificuldade em me distinguir. E distingo-me de facto como sindicalista, e distingo-me também como funcionário público que me orgulho de ser. Quando acabei o curso em 70 comecei como docente universitário, fazia investigação na altura. Desde 70 que estou ligado a uma organização de investigação e, com muita honra me considero funcionário público. E eu quero dizer de facto, também chamar a atenção para esta questão da importância da administração pública para a actividade política. A actividade política é na base de eleições democráticas, dirigentes eleitos. Para os dirigentes eleitos exercerem as suas funções, contam com o aparelho de Estado, contam com a administração pública. A administração pública funciona bem e de facto o aparelho político poderá funcionar bem, mas se a administração pública funciona mal, há problemas de ligação entre digamos os eleitores e os eleitos. E isso marca um pouco, até, o desgaste da classe política nos últimos anos, o mau funcionamento da administração pública. E como foi referido, e marco desde já uma concordância: os governos têm desleixado completamente a administração pública. A lei, por exemplo, fala que um gabinete de um membro do governo deve ter 6 ou 7 pessoas em termos de gabinete. Bem os gabinetes dos membros do governo têm 50, 60, 100 pessoas. E o problema não é terem tantas, o problema é que eles baseiam a sua actividade no gabinete e ignoram completamente o funcionamento da administração pública. Muitos directores gerais nunca reúnem com os membros do governo respectivos, 2, 3, 4 anos, ou seja isto não funciona. Portanto há uma actividade política que se centra em medidas ditas de reforma, que na prática é fazer decretos-lei, não se sabe se os decretos-lei depois têm algum impacto no terreno, se mudam alguma coisa, mas considera-se que a reforma se faz por decreto-lei. Mas na prática, ignora-se de facto a gestão do aparelho de Estado da administração pública. E há aqui claramente um problema de gestão, há um problema de instabilidade. Bem, quando muda um governante, muda a lei orgânica de um ministério, quase sistematicamente. Não é quando muda um governo. O governo pode ter 4 anos, se teve 3 ministros do trabalho, provavelmente os ministérios vão ter 3 leis orgânicas. E leis orgânicas significam organismos organizados de modo diferente, significam uma instabilidade permanente da administração. É de facto também de dizer que os trabalhadores acabam por criar, ser vítimas do sistema, e criar grande desmotivação. A administração pública é fundamental em termos de funcionamento. Eu gostava de referir aqui, portanto tinha aí muita coisa, não vou falar sobre tudo, sobre isto, mas dar-vos alguns dados, que depois vocês poderão consultar na Internet, em primeiro lugar da administração pública, depois falar ligeiramente das funções do Estado, dos desafios da modernização, e sobretudo a tal questão se haverá ou não trabalhadores a mais e como melhorar o funcionamento do aparelho do Estado, e também ter uma gestão com menos custos.

A caracterização de administração pública, têm aí vários quadros, vários quadros que caracterizam a administração pública que eu ia muito rapidamente apresentar. E dizer que, à partida, não há nenhum dirigente de uma empresa que não saiba quantos trabalhadores tem. Mas o problema é que não há nenhum ministro que saiba quantos trabalhadores tem, dependentes. E em termos gerais da administração é a mesma coisa. Não há um acompanhamento permanente dos trabalhadores da administração pública. E, por isso, ainda se continua a funcionar com dados de Dezembro de 99. Entretanto, em Março de 2005, o governo da altura pôs cá fora uns dados mas que se estão a revelar claramente desajustados. O governo actual diz que vai publicar uns dados, agora até 15 de Setembro, que vai fazer publicar o recenseamento até final do ano...Não há conhecimento da administração pública, não há actualização dos dados. E também há dificuldades em comparações internacionais. Ia abordar rapidamente esta questão. Primeiro, em termos de dados, só chamar a atenção, quando se fala em administração pública, está-se a falar de coisas muito diversificadas. E para se falar de reforma da administração pública, tem que se falar da reforma da educação, da saúde, da reforma disto e daquilo. Falar em reforma em geral é de facto um erro sistemático das tais medidas por decreto-lei, que depois têm pouca consequência no terreno. E o que é a administração pública?  Vê-se ali que é administração directa e indirecta do Estado. Administração pública tradicional: 560.000; administração regional: 33.000; administração local: 116.000; num total de 716.000, segundo os dados do tal recenseamento de 1997, o único dado credível que existe. Mas dentro da administração central, dos 560.000, vê-se que 228.000 são da educação. Quase metade é educação. Depois há a saúde com 115.000; a defesa militar com 51.000; a administração interna, sobretudo forças de segurança, com 50.000; a justiça com 24.000. E o que é que sobra? 89.000. A tal coisa de que muito se fala, do funcionamento e do pessoal ligado aos ministérios, são 89.000 em 560.000. O resto são funções específicas. E reparem no mapa cá em baixo, da administração central, dos tais 89.000, que do trabalho e solidariedade - significa emprego e segurança social - estão lá 27.000; nas finanças, 17.000; na agricultura, que é claramente um Ministério, comparado até com os outros países da Europa, com muitos funcionários, tem 14.000; sobram 30.000 para os outros ministérios todos, ciência, cultura, etc. Portanto, temos uma administração pública sobre a qual temos de ter a noção que muitas vezes falar da administração pública em geral, sem abordar os problemas particulares, conduz a erros de análise. Depois tinha aqui justamente a evolução, os tais dados discutíveis, mas têm sobretudo Março de 2005. Vieram nos jornais, não são dados oficiais, mas verifica-se que, por exemplo, de 1997 até Março de 2005 ou até Julho de 2006, segundo o actual governo anunciou, nos tais dados que irá publicar dentro de dias, que são 580.000. Portanto a administração pública de 1997 a 2006 em vez de ter diminuído aumentou 19.000. Mas aumentou 19.000 porque aumentou 18.000 com a profissionalização das forças armadas. Porque aumentou 3.000 na área dos professores, porque aumentou 4.000 na área da justiça. Porque a administração tradicional diminuiu em cerca de 14.000. Esperemos agora pelos dados publicados no mês que vem, para ver a realidade dos números. Também nas habilitações literárias a administração pública é cara. O que é a administração pública portuguesa? É uma administração pública que tem muitos licenciados. Não há nenhuma empresa portuguesa, nem que se aproxime sequer da metade, que tenha 43% dos seus efectivos com um curso superior. E porque é que há 43%? Porque a administração pública é muito saúde, é muito, sobretudo, professores. E portanto isto dá um grande peso em termos dos docentes. Porque é que hoje o desemprego dos docentes, o desemprego do ensino superior aumentou brutalmente? Porque a administração pública deixou de ser o recrutador habitual na área do ensino superior, portanto temos um peso muito grande dos docentes. Não há nenhuma empresa que chegue aos 20%, em princípio, salvo pequenas empresas. Vejamos os funcionários públicos por alguns grandes grupos profissionais: docentes, professores dos ensinos básico, secundário e superior, 164.000; médicos, 20.000; enfermeiros, 29.000; e depois chamava a atenção, o administrativo de que muitos falam, 68.000, embora no administrativo também está frequentemente o técnico profissional e, sobretudo, o auxiliar, no total de 121.000. E quanto a estes 121.000 auxiliares, porque é que lá se chegou? Lá voltaremos. Depois, em termos de comparação entre países, existe uma dificuldade. Por exemplo, o Eng.º Manuel Lencastre referiu que a Irlanda tem menos 40% de trabalhadores da função pública do que nós. Bem, segundo o último relatório comparativo que eu conheço, da OCDE, a Irlanda tem 14,1%, Portugal tem 14,5% segundo os dados de 1997. Este quadro mostra o que é a realidade da administração. Por exemplo, a defesa, em todos os países, está ligada à administração central, mas por a saúde vê-se que varia de país para país, podendo ser administração central, regional, local ou estar simultaneamente em vários lados. Portanto, está aí o exemplo de alguns países, países de referência publicados no tal relatório da OCDE de Outubro de 2002, e os dados comparados nesse mesmo relatório. Estão ali vários países, incluindo Portugal, com 14,55% no ano 2000. Por exemplo, neste mapa não aparecia a Irlanda mas já aparece noutro mapa. Vê-se também a Dinamarca com 14,26%. Quanto a Portugal, o ano passado tínhamos 15,1%. No relatório do pacto de estabilidade e crescimento está a diminuir para 14,5% em 2007 e 13,8% em 2009. Isto são os custos salariais, não é o número de efectivos. Em termos de número de efectivos está neste mapa. Ou seja, estão ali de facto os vários países. Vê-se que Portugal tem, de facto, em média, valores relativamente elevados, embora nos países nórdicos em geral hajam valores superiores. O relatório da OCDE compara os vários países, apresentando no fim do relatório a análise país por país e traz um disparate total relativamente a Portugal: refere que o número de funcionários é de 496.000. Tal número não coincide nem com uma coisa nem com outra. Por exemplo, vê-se o ministério do emprego com mais de 1.900 trabalhadores. Ora, só o IFP estava com mais de 3.000. Portanto, há erros sistemáticos de comparação, mesmo num organismo importante como a OCDE. Aqui, Portugal está ligeiramente superior à média mas praticamente na média. Países nórdicos com valor superior em termos de emprego, outros países com valores inferiores, embora alguns bastante próximos, incluindo a Inglaterra que é apontada como a referência mais importante em termos de gestão da administração pública. Outro relatório da OCDE publicado pouco depois, no ano seguinte, apresenta dados bastante diferentes. Embora se aproximem em termos comparativos, os valores absolutos são bastante diferentes, o que demonstra a grande dificuldade de comparação. Quanto à organização da administração pública, dizer também que é uma organização muito complexa. Por exemplo, em termos de órgãos de soberania e organismos independentes, há 77 organismos diferentes; na administração directa do Estado são 1.546; na administração indirecta do Estado são 459; na administração regional são 97 e nas autarquias locais são 1.947. Portanto, uma grande diversificação de organismos. Isto também são dados da Direcção Geral da Administração Pública sobre os organismos que existem, sobre os dirigentes que existem. Relativamente às funções do Estado, dizer que de facto, também aqui é evidente que estão muito ligadas àquilo que é definido pela Constituição, e também diria o que foi a prática dos partidos políticos. Por exemplo, lembremo-nos que havia em Portugal, como na grande maioria dos países europeus, um grande sector empresarial do Estado, muitas empresas públicas ligadas ao Estado. Hoje, esse sector empresarial praticamente desapareceu. Em todos os países diminuiu muito, o sector empresarial é muito mais pequeno, há um maior efeito regulador do Estado. Mas as funções são de carácter político, económico e social, são funções de soberania, ligadas ao funcionamento do aparelho de Estado mas também às questões de justiça, segurança e defesa. As funções distributivas, coesão económica, social e territorial, as funções sociais, educação, saúde e segurança social. As funções económicas, a tal passagem do Estado patrão a Estado regulador. Portanto, há sobretudo diversos institutos públicos, mas podemos dizer que, de facto, não há um Estado que se possa dizer um Estado modelo. Cada país tem o seu modelo de funcionamento do Estado. Aliás, se virem o mapa lá atrás, sobre os Estados Unidos, o que é que se vê? Que os Estados Unidos, em termos de emprego, aparece com 14,1% da população activa. Portugal tem 14,2%. Fala-se muito do modelo dos Estados Unidos. Por exemplo, no modelo dos Estados Unidos toda a saúde é privada. A saúde custa 14% do PIB. Na Europa a saúde é basicamente pública. Custa, em geral, 8% a 9% do PIB. Ou seja, será que o modelo privado é melhor? Nos Estados Unidos há mais de 30 milhões de habitantes sem acesso a cuidados básicos de saúde, justamente porque a Europa tem serviço nacional de saúde, que é mais barato e melhor. Não é o problema de ser público ou ser privado. É evidente que talvez os melhores hospitais do mundo sejam nos Estados Unidos, mas também os piores serviços de saúde, a maior dificuldade de acesso à saúde, nomeadamente para os pobres, é nos Estados Unidos. Portanto, há pouco quando eu via ali a posição do PSD a dizer que se devia privatizar a área social e passar a área fiscalizadora, ainda bem que é só discurso político, não tem nada a ver com a realidade. Nunca vi o PSD a privatizar a área social, nem a educação, nem a saúde, nem a segurança social. Ainda bem que é só discurso político. Mas, portanto, há de facto questões centrais nesta discussão. É evidente que um Estado de um país comunista, de um país com o plano, que já quase não existe, é totalmente diferente de um estado liberal. Cada partido político tem uma visão das funções do Estado. Portanto, não se pode dizer que se tem que discutir as funções do Estado para depois construir o Estado modelo. Não há 2 países europeus com o mesmo modelo de Estado, apesar de muitos se aproximarem em termos de modelo político e em termos até de classe dirigente, de partido no poder. Mas não 2 países iguais. Eu acho que há questões centrais hoje a discutir relativamente ao papel do Estado, nomeadamente os sectores de concorrência pública/privada. O caso da saúde e o caso da educação são 2 sectores que são quase 50% do emprego público. Qual é o papel do Estado? Qual é o papel da iniciativa privada? Nas áreas sociais, por exemplo, na acção social do ensino obrigatório. É que muitas vezes as áreas sociais aqui são sobretudo privadas, mas quem as paga é o Estado. Portanto é um privado financiado pelo Estado. No apoio a empresas e organizações, em que o Estado também tem grande modelos de apoio, ligados a fundos comunitários mas muito para além disso. Veja-se por exemplo os apoios concedidos pelas autarquias às organizações da sociedade civil. Portanto, acho que uma questão central é de facto a modernização do Estado. A modernização do Estado põe em primeiro lugar a questão da gestão, a gestão como foi referida, a questão da gestão política, mas também a gestão dos dirigentes, a qualidade dos gestores. E no modelo de gestão há outra questão central que é a descentralização da responsabilização. A responsabilização ser descentralizada. Por exemplo, há uma grande tendência em Portugal para todas as decisões relativamente à organização do aparelho de Estado serem tomadas pelo ministro das finanças, teoricamente para controlar a organização. Bem, se o ministro das finanças assina todos os despachos, por exemplo, de recrutamento, o ministro das finanças devia poder dizer-nos, automaticamente, quantos são os contratados a prazo ou quantos funcionários existem, mas nunca sabe! Porque é um controle teórico. Fundamental seria que o ministro das finanças, o Governo, assumisse decisões globais, preparadas pelo ministro das finanças, mas depois dizer, por exemplo, ao ministro do trabalho ou ao ministro da economia, ou a qualquer outro ministro que vão sair não sei quantos trabalhadores, logo o seu ministério tem capacidade para admitir tantos trabalhadores. E era fundamental que ele centralizasse depois nos directores gerais e nas sucessivas unidades de gestão. Há dias vinha um artigo de Manuel Antunes dizendo que se discute muito hoje a questão dos hospitais, da gestão dos hospitais empresarializados e da responsabilidade dos gestores, mas que nunca funcionará enquanto essa responsabilidade dos gestores dos hospitais não chegar aos directores de serviço, relativamente à gestão do pessoal, e não chegar, por exemplo, às chefias intermédias. E esta é uma questão que não funciona minimamente no aparelho de Estado em que há uma grande tendência a centralizar no ministério responsável pela administração pública, neste caso o ministério das finanças, sendo que os outros ministros são mais ou menos irresponsáveis relativamente a esta ideia de gestão do aparelho de Estado. Nunca nenhum director geral foi demitido por violar a lei. Toda a gente sabe que hoje sistematicamente se viola a lei nas admissões. Salvo nos grandes grupos profissionais, os médicos, os professores, não há concursos de admissão. As pessoas entram como tarefeiros ou com vínculos diversos e depois têm de se legalizar as ilegalidades.

Segunda questão de facto: a estabilidade de gestão. É fundamental que haja uma estabilidade orgânica. É evidente que cada governo muda a administração, mas as grandes estruturas organizativas do governo, as grandes estruturas da administração pública, deviam manter-se com os sucessivos governos. Ora, o actual governo criou uma comissão de sábios - ditos sábios, pelo menos – os quais, na prática, em vez de fazerem um trabalho de sábios, reuniram-se como os ministros, não sei quantas reuniões, para dizerem o que é que entendiam sobre a reestruturação de cada ministério. Portanto em certa medida traduziram aquilo que os ministros disseram. E o governo vai pôr em vigor esta comissão, chamado PRACE, sem qualquer discussão pública e sem qualquer discussão política. É evidente que os partidos da oposição não se sentem minimamente vinculados a isso. Quando o governo deixar de ser PS e passar a ser outro, é evidente que vai fazer outro PRACE, que vai fazer outra estruturação orgânica. Não há estabilidade no funcionamento da administração. Tinha que haver de facto um consenso político nesta matéria, em termos das grandes linhas gerais do funcionamento, da estabilidade orgânica. Não estou a falar do número de trabalhadores, da privatização de funções. A gestão dos recursos humanos tem grandes deficiências. Quanto à garantia do Estado de Direito, há um papel central do Estado a vários níveis, dentro da própria administração. Por exemplo a questão das admissões, as questões que têm que ver com o direito à participação e informação, com o cumprimento da lei pelos dirigentes da administração, nomeadamente na gestão de recursos humanos, etc. E o Estado deve velar pelo cumprimento da lei. A lei se está bem feita ou mal feita, é para cumprir enquanto não for alterada. E é um grande desrespeito sistematicamente pela lei que desacredita os partidos políticos, a actividade política.

O Estado social. Levanta-se hoje a questão se se deve ou não privatizar a saúde, a segurança social, a educação. Mas quem é que a paga? A privatização não é para melhorar a eficiência da gestão, porque se estivesse em causa a eficiência de gestão admitiam-se as experiências inovadores, nomeadamente entregar, por exemplo, as parcerias públicas/privadas agora na construção de novos hospitais. O problema é que a privatização directa, na prática, significa simplesmente que o Estado passou a pagar e passou a pagar mais, porque uma actividade não lucrativa passou a ser uma actividade lucrativa e, portanto, não diminui os custos. Concluindo, o melhor Estado é o mais eficiente, com maior qualidade e virado para o cliente, que são as pessoas e as empresas, e para os resultados. A redução de despesas com pessoal não pode pôr em causa a motivação e a participação dos trabalhadores. A questão da estabilidade orgânica, da responsabilização e de centralização da gestão. Menos legislação e mais acção.

Para acabar esta questão do “se há trabalhadores a mais”, no meu entendimento não há trabalhadores a mais, estão é claramente mal distribuídos. Por exemplo, este mês o ministério das finanças e o ministério da educação vão decidir se mantêm ou não os contratos a prazo de largos milhares de trabalhadores do pessoal auxiliar das escolas. Sem esse pessoal auxiliar as escolas não funcionam. Mas existe muito pessoal auxiliar a mais noutros sítios. Não foi feito nenhum esforço para haver mobilidade de onde há a mais para onde há a menos. Portanto é fundamental incentivar o mecanismo de mobilidade. Aparentemente, o governo quando fala em mobilidade está sobretudo a falar do mecanismo de pôr as pessoas nos quadros de excedentes para lhes pagar menos. E isso de facto é a mobilidade totalmente perversa, é uma mobilidade que não interessa nada. O que interessava era identificar onde é que há trabalhadores a menos, onde é que há necessidade de reforçar quadros. Por exemplo o pessoal administrativo auxiliar das escolas. Há problemas gravíssimos nas escolas. Há algum tempo eu questionei o ministro sobre como é que é admissível que uma Inspecção Geral de Trabalho tenha lá trabalhadores em contrato, contratados a agências de trabalho temporário. Como é que é possível que, havendo uma grande falta de inspectores de trabalho, eles estejam a desempenhar tarefas administrativas por falta de apoio administrativo? Ou seja, se há pessoal a mais nas secretarias gerais, no ministério da agricultura e noutros ministérios, porque é que não há mecanismos de mobilidade? Segundo, é evidente para mim, e há muitos anos que o venho dizendo - não é só neste momento em que o discurso político faz um grande acento nisto - que razões orçamentais impõem redução gradual dos efectivos. Por razões orçamentais, não por razões de necessidade de gerirmos um Estado a funcionar melhor, e um Estado que garantisse melhor as suas funções. Eventualmente esse Estado precisava de mais gente mas, por razões orçamentais, não é possível. Pelo contrário, devemos reduzir o número de funcionários. Mas essa redução deve ser gradual. Tendo em conta que todos os anos saem da administração cerca de 20.000 pessoas, é possível promover uma substituição gradual, uma substituição parcial.

A Terceira questão é a da externalização de funções sem aumento de custos. Nós concordamos, mas o modo como se faz é um modo normalmente errado. Vejamos, há uns anos, e já foi há mais de 10 anos, decidiu-se que as funções de limpeza e de segurança eram assumidas pelo sector privado. Como é que se fez? Todos os trabalhadores que estavam na limpeza e segurança passaram a desempenhar outras funções no Estado, e contrataram-se empresas de segurança e limpeza. Os custos aumentaram, e muitos trabalhadores deixaram de saber o que é que haviam de fazer. Daí que exista aquela brutalidade de pessoal auxiliar no Estado. Há 2 anos tomou-se outra decisão brilhante: privatização dos notários. A privatização dos notários até tinha implícito aquilo que o Dr. Lencastre referia, ou seja, o pessoal passava para os notários privados portanto as funções seriam desempenhadas de modo diferente. Mas não foi isso que foi feito. É que praticamente nenhum pessoal passou, porque não se criaram condições para que passassem. Perante a opção, ficaram todos. E portanto o Estado diminuiu as receitas e aumentou os custos porque agora tem trabalhadores para fazer funções que eram antigamente feitas e, portanto há uma externalização de funções que não é devidamente pensada em termos, de facto, de diminuição de custos. Há de facto, também, a questão da renovação e da qualificação. Não é possível prever que não vai haver novas admissões. É o problema, que qualquer empresa tem, da pirâmide etária. Não pode haver um envelhecimento sistemático das empresas e é um problema de qualificação. Os novos quadros, os novos, os jovens aparecem com um maior nível de qualificação. Tem que haver uma aposta na formação, na qualificação e na requalificação. E portanto este também é outro dado que tem de estar em cima da mesa quando se discute a administração. Logo, a questão central é a da permanente aposta numa melhor administração. É saber se, de facto, os governos estão empenhados na administração ou continuam o discurso puramente  político partidário de mais administração, menos administração, mais Estado, menos Estado, quando a questão central é o melhor Estado, independentemente de saber que eventualmente diferentes sensibilidade políticas conduzem a diferentes resultados. Muito obrigado.
 
Dep. Carlos Coelho
Vamos dar início às nossas questões. O primeiro a questionar é o Grupo Roxo, a Marlene Cigarra.

 
Marlene Cigarra
Boa tarde. Eu quero dar os cumprimentos da parte do Grupo Roxo à mesa e a todos os presentes. Um obrigado ao Eng.º João Proença e ao Dr. Manuel Lencastre por estarem aqui presentes. Então a minha pergunta é a seguinte: na passada Quinta-feira foram aprovadas pelo governo as novas regras da lei da mobilidade, em relação à gestão de funcionários públicos. Será este novo Decreto-lei uma mais valia para a reorganização do Estado, para a diminuição da sua despesa? Obrigado.

 
Eng.Manuel Lancastre
Antes de responder directamente à sua pergunta que agradeço, vou só fazer aqui um brevíssimo comentário à intervenção do Eng.º João Proença, que apreciei bastante, mas fiquei um pouco aflito porque acho que estamos de acordo os dois relativamente a tudo, inclusive sobre o facto de existirem funcionários públicos a mais. Portanto, o Eng.º João Proença primeiro afirma que não existem mas depois admite a necessidade de reduzir. E também, por outro lado, constatar que está de acordo com a transferência de funções do Estado para a iniciativa privada porque acaba por admitir, a “externalização”. Acabou por a admitir, não concordando eventualmente muitas vezes com a forma como é que é feito. Portanto queria só fazer aqui estas duas notas, porque são os dois temas principais aqui em debate, e espero que o debate encontre outros pontos de debate para além destes dois que são os principais com os quais estamos de acordo.

Relativamente à pergunta que foi feita, à lei da mobilidade, eu muito honestamente penso que é um mau decreto-lei. Vamos aqui tentar elencar um conjunto de razões pelas quais é mau. É uma lei, em primeiro lugar, muitíssimo mais violenta do que aquilo que é previsto para o sector privado. É uma lei que visa não tanto a mobilidade, mas sim reduzir o salário das pessoas. E portanto é uma lei que vai causar uma grande entropia e uma grande confusão e animosidade no âmbito da função pública. E com animosidade e com entropia não há qualquer tipo de governo que consiga fazer qualquer coisa e por isso eu acredito num processo totalmente diferente: uma redução do número de funcionários públicos, em primeiro lugar, baseado num congelamento total das admissões. O “total” não significa que a excepção não confirme a regra. Podem haver excepções e devem haver excepções. Agora, por regra, não entra ninguém na função pública. A excepção depois é casuisticamente aprovada, depois de vários filtros. Em segundo lugar, colocar à disposição dos colaboradores da função pública um programa de saídas amigáveis e voluntárias, porque ninguém vai sair a mal. As pessoas vão sair se quiserem sair. Por outro lado também é bom que o Estado só aceite as saídas se o próprio Estado quiser, porque é natural que hajam pessoas que queiram sair e que não interesse ao Estado que elas saiam. Portanto o processo tem de ser um processo amigável, pelo menos no início. Ora eu penso que o governo entra logo “a matar”, para ver se pega, mas eu julgo que o tiro, infelizmente para todos nós, lhe vai sair pela culatra porque este programa vai ser de uma tremenda complexidade e de muito difícil implementação, porque não vai ter a colaboração da maior parte da função pública nem dos próprios governantes.

 
Eng.João Proença
Então também rapidamente, e repetindo aquilo que disse e o que está escrito, não há funcionários públicos a mais. Estão é mal distribuídos, e por razões orçamentais. Há muito que venho dizendo que a administração pública devia ter algum emagrecimento, por razões orçamentais, muito gradual e anualizado. Mas também não acredito no que o actual governo disse. Que ia reduzir em 4 anos, 75.000. Eu contestei os números dizendo que na regra por cada 2 que saem entra 1. Bem, os números estão errados porque em 4 anos não saem 150.000, saem quando muito 80.000 a 100.000, portanto os números estão completamente errados. Mas o governo confessou que estava errado, que eventualmente as contas seriam até 2010. O problema é que as contas nunca são respeitadas, porque se entra todos os dias pela porta do cavalo. E, de facto, é muito difícil gerir isto. As vagas já estão congeladas, como foi referido. Ninguém pode ser admitido sem haver descongelamento de vagas, mas o problema são aqueles que passam ao lado e que tornam, portanto, a gestão incontrolável. Quanto ao diploma da mobilidade que referiu, eu fiquei um bocado baralhado porque não vi a notícia. Mas o diploma da mobilidade está em discussão na Assembleia da República, portanto já foi aprovado pelo governo há uns meses. E, aliás, já foi aprovado na generalidade na Assembleia da República em Julho. Vai ser aprovado agora em Setembro ou Outubro, em discussão final global. Logo, o governo tinha um diploma que já anunciou que tinha aprovado, que está ligado à mobilidade, que é a extinção de organismos públicos. Teoricamente já o aprovou há uns meses, já devia estar na Presidência da República, temos algumas dúvidas sobre esta matéria, mas não sei se é desse diploma que se fala. Mas agora o diploma do governo é um diploma totalmente errado, porque o diploma em vez de fomentar a mobilidade, fomenta é o pôr os trabalhadores como “desempregados” no chamado quadro de excedentes. Ou seja, como é que se fomenta a mobilidade? A primeira questão é identificar para onde é que quero levar os trabalhadores. Se eu quero que vão de um sítio para o outro, tenho que dizer onde é que os quero pôr. Depois, ao saber para onde eles querem ir, abrem-se concursos em geral. Se querem ir vão, se não querem ir, podem-se discutir mecanismos de mobilidade forçada. Mas na mobilidade voluntária, o governo não identificou onde há necessidade de trabalhadores. E essa é a primeira questão para a mobilidade falhar. E o que é que o diploma basicamente prevê? Que se se extinguir ou reorganizar um organismo, se houver redução de efectivos, vão parar ao quadro de excedentes. E o que é que se passa no quadro de excedentes? Passados 2 meses têm o vencimento reduzido em cinco sextos, passado 1 ano têm o vencimento reduzido em dois terços. Ou seja, passado 1 ano os trabalhadores teoricamente recebem 67%, mas nem recebem isso porque para manter os direitos à Segurança Social têm que descontar 10% ou 11% para a Segurança Social. Logo, o que recebem é 50 e tal por cento. Ora, um desempregado em Portugal, e o diploma até vai revisto em breve, recebe dois terços do vencimento, recebe 65%. Portanto, recebem menos do que um desempregado, e ainda por cima pagam mais impostos porque o subsídio de desemprego não conta para efeitos de impostos e isto é um salário, conta para efeitos de impostos. É de facto claramente inaceitável este conceito de mobilidade forçada. E por trás desta mobilidade está a tal restruturação de organismos. E o que é que se diz da restruturação de organismos? O governo decide. É um poder constitucional. São os governos que organizam a administração. A Assembleia não tem qualquer poder sobre esta matéria. Mas o Governo decide e avança sem nunca ouvir os trabalhadores envolvidos. Por exemplo, se houver em Portugal um despedimento colectivo, obrigatoriamente os trabalhadores que estão envolvidos têm que ser consultados nos termos da Constituição. Não é negociado o despedimento colectivo, têm de ser ouvidos. Tem que haver informação e consulta. Neste caso, não há qualquer informação e consulta. A nós, isto parece-nos claramente violador de princípios básicos. Esperemos que isto não passe. E se passar no Governo, que não passe na Presidência da República.
 
Gonçalo Gaspar
Boa tarde a todos. Gostaria de aproveitar a oportunidade para agradecer a presença do Dr. Manuel Lencastre e do Eng.º João Proença, por nos contemplarem com as vossas presenças. A minha pergunta é destinada ao Dr. Manuel Lencastre. Mais do que a defesa da iniciativa privada, interessa uma gestão eficiente e competitiva. A iniciativa privada é apontada como uma grande resolução deste problema, não haverá outras soluções? Parcerias público/privadas ou até concessões?  Não será aceitável a gestão pública, desde que essa seja eficiente? Obrigado.
 
Eng.Manuel Lancastre
Bem em primeiro lugar eu agradeço muito esta pergunta porque também com o comentário que o Eng.º João Proença fez relativamente à privatização dos serviços socais, eu tinha que fazer aqui um esclarecimento. Eu penso que há vários graus de transferência de funções para a iniciativa privada. Temos um grau 0 e temos um grau 100. O grau de transferência depende muitíssimo da capacidade de resposta do sector privado a essa mesma transferência. Portanto, não há uma solução única. No grau 0, por exemplo, temos uma função desempenhada por uma direcção geral. Então está totalmente assegurada pelo Estado. A direcção geral assegura a função, assegura que o serviço é prestado e presta o serviço - vamos supor. Depois há o instituto público, que tem um pouco mais de autonomia mas também é 100% Estado. Depois temos as empresas públicas que também são 100% Estado, mas ainda com mais autonomia. Depois entramos nas parcerias público/privadas, onde o serviço é assegurado pelo Estado, financiado pelo Estado, mas executado ou gerido pela iniciativa privada. Nós estamos a falar de um serviço público, que é apenas gerido pela iniciativa privada. Depois temos ainda um grau onde a iniciativa privada entra mais um bocado que é o das concessões, ou dos projectos em concessão. Aí o financiamento já pode ser feito também pela iniciativa privada, mas dentro de uma regulamentação muito forte do próprio Estado. Finalmente, em última análise, vem a privatização. É o último grau de transferência. De todos os exemplos que eu dei há bocado, não há um único que tenha o rótulo de privatização. E porquê? Porque em todos eles, os sectores relacionados com esses exemplos, de uma forma ou de outra não são capazes, no nosso entendimento, de responder de forma conveniente àquilo que o Estado pretende. Portanto, penso que nesses casos o Estado deve manter alguma capacidade de intervenção. Assim, quando se fala em todas aquelas funções sociais, obviamente que a solução será sempre uma solução, no início, assente numa parceria público/privada, ou na contratualização pelo Estado com a iniciativa privada, do exercício de um determinado conjunto de serviços. Mas por exemplo, quando se fala da Carris, já se fala em contratualização de uma concessão. Mas porque não uma privatização? A Carris não tem concorrência em Lisboa. Mas mesmo assim, podíamos pensar numa privatização, altamente regulada em que os preços eram regulados também. Não vale a pena estar a criar um modelo de privatização em que depois ele conceptualmente é muito mais próximo de uma concessão ou de uma contratualização. E por isso, para cada um dos sectores, e para cada um dos serviços a serem transferidos, há uma forma óptima, e essa forma óptima deve ser ponderada e trabalhada.
 
Eng.João Proença
Então, se me permite também uns comentários muito rápidos até para clarificar há bocado uma questão. Eu aceito e acho positivo muitas vezes a externalização de funções, ou até experiências de gestão. Sou claramente contra a privatização de serviços públicos. Portanto, temos de distinguir bem o que são serviços públicos, o que são empresas públicas, empresas em termos de sector empresarial do Estado. Relativamente às empresas públicas, acho que nos temos que preocupar sobretudo que sejam bem geridas, que funcionem bem e que sejam rentáveis. Por exemplo, a Quimigal foi uma empresa pública. Se o Estado controlar os preços e não deixar aumentar os preços da empresa, o Estado arruina a empresa. A constituição proibia as privatizações do sector empresarial do Estado. Ora, quando um governo era contra o sector empresarial do Estado, estrangulava-o. Não lhe permitia investir, controlava os custos e até houve uma empresa pública ou semi-pública que faliu, que foi o caso da CMN-CTM, colocando em grandes dificuldades os trabalhadores porque o Estado nem indemnizou os trabalhadores e os pensionistas. Mas portanto, um partido político que ganhou as eleições tem o direito de privatizar. Agora, tem que defender o conceito de serviço público. Por exemplo, a Carris é uma empresa da área de Lisboa. Mas há sectores de serviços públicos geridos pelas câmaras, como o caso de Coimbra, o caso do Barreiro, o caso de Braga. Outras têm empresas privadas. Por exemplo Cascais, o meu município, foi até uma questão abordada na última Assembleia Municipal, em que é uma empresa privada que presta um mau serviço, diga-se de passagem. Portanto, em certo tipo de serviços, nomeadamente nos serviços públicos urbanos, como no lixo, como nas águas, como noutras situações, tem que haver um grande controle do sector público. Mas somos claramente contra a privatização de hospitais, de universidades, de escola, etc. Agora, admitimos também experiência públicas de gestão, como referiu. Por exemplo, se eu entregar a gestão a privados, vai dar melhores ou piores resultados? Agora discute-se muito, por exemplo, no centro se saúde entregar a gestão aos médicos, aos enfermeiros, ou até a outras pessoas. Dá ou não melhores resultados? Para haver experiências de gestão tem que haver avaliação, e o grande problema em Portugal é que se fala em experiências e nunca se avalia. Por exemplo, o ministério de educação tem dezenas de experiências piloto, eu não conheço nenhuma que tenha sido devidamente avaliada. O próprio ministério da saúde por vezes tem feito experiências piloto mas dificilmente as avalia ou pelo menos torna públicas as avaliações. Mesmo quando se passou da gestão pública dos hospitais para uma gestão privada, essa avaliação não foi devidamente feita.
 
Carla Santos
Boa tarde, e desde já bem hajam pelo tema debatido. A questão é a seguinte: nós consideramos que mais importante do que pensar se há ou não funcionários a mais, seria prioritário e necessário dotar as estruturas da administração pública com os meios e mecanismos essenciais para a modernização e a eficácia dos serviços públicos, assente sobretudo numa reciclagem de competências e numa melhor redistribuição das funções, serviços e funcionários. Feita esta pequena reflexão, gostaríamos de saber se não consideram que o primeiro passo seria uma melhor gestão e eficácia da prestação do serviço público, no ponto de vista essencialmente do prestador e não do empregador, do princípio da meritocracia, que é a diferenciação pelo mérito, esforço e trabalho, tal como acontece no sistema privado. 

 
Eng.João Proença
Estou em concordância total com o que referiu. Acho que são as questões centrais: o problema da gestão e o problema da formação. Também, de facto, o valorizar a modernização dos serviços públicos. Fala-se muito em modernização mas não se investe. Quando uma empresa se moderniza, tem que investir. Ora, em Portugal discute-se muito modernização, melhor funcionamento de serviços públicos, mas não se discute os investimentos necessários para isso. Muitas vezes associa-se a modernização a compra de computadores. Mas não se formou o pessoal para utilizar os computadores, e muitas vezes os computadores até nem são desencaixotados, ou quando são utilizados são utilizados de forma deficiente! Portanto tem que se discutir os investimentos necessários, tem que se visar de facto uma redução de despesas de funcionamento e tem que se ajustar os efectivos. Um dos problemas centrais em Portugal, em termos de gestão de efectivos, é de facto o esforço de qualificação e de requalificação dos trabalhadores. Porque também há muitos trabalhadores que precisam de ser requalificados, ou seja estão hoje com determinadas formações ou com determinadas funções que, na prática, já não existem ou desapareceram. E como as empresas fazem requalificação dos trabalhadores, também o Estado tem de fazer requalificação de trabalhadores.
 
Eng.Manuel Lancastre
Eu também estou de acordo com o que disse. Eu penso que esse tipo de preocupações devem ser preocupações que devem pautar o dia a dia de um gestor. A questão é saber porque é que primeiro não se melhora o Estado, para depois discutirmos se há ou não funcionários públicos a mais ou para depois fazermos as transformações que são necessárias. Eu penso que não há tempo. Eu julgo que um processo de melhoria e de modernização é fundamental, deve ser contínuo. Faz parte, na prática, das qualidades de um bom gestor assegurar que de facto esses processos existem de forma contínua. Agora, há mudanças que não se compadecem com a perfeição dos organismos. Portanto, infelizmente em gestão, muitas vezes as coisas têm que acontecer em simultâneo e eu penso que a minha reposta concreta relativamente àquilo que perguntou é: não, não é possível ficar à espera, há que agir em todas as frentes em simultâneo.
 
Pedro Ferreira
Muito boa tarde a todos. Queria cumprimentar em especial a mesa e agradecer a presença de ambos os oradores. A nossa questão vai mais no sentido da administração local, uma vez que estamos mais a falar da administração central. Nós gostaríamos de ouvir a opinião de ambos os oradores acerca das formas de eleger o funcionalismo público da administração local, porque de facto tem muita especificidades, e são centenas, as autarquias locais. Portanto, gostaríamos de saber se um plano de mobilidade ou um quadro de excedentários como está agora a ser criado para a administração central, seria possível criá-lo e se seria viável na administração local. Caso não seja, que tipo de medidas é que podem ser tomadas para aligeirar a mesma? Muito obrigado.      
 
Eng.João Proença
Bem, quer dizer que a administração local tem a questão presente que referiu, portanto haverá municípios com trabalhadores a mais e portanto tem que haver alguma mobilidade. Mas também há em Portugal uma questão ao contrário, é que de facto nós temos pouca administração local face à administração central. Por cada efectivo da administração local existem 4 efectivos da administração central ou mais. Enquanto, por exemplo, nos países nórdicos, é ao contrário. Porquê? Porque todo o sistema educativo e todo o sistema escolar, salvo as universidades e hospitais universitários, está tudo ligado à administração local e não à administração central, assegurando uma melhor ligação às populações. Essa questão vai-se pôr mais tarde ou mais cedo. A transferência de algumas funções, transferindo simultaneamente os trabalhadores. Relativamente à questão que refere, concretamente a mobilidade entre a administração local e a administração central, tem um problema: é que há muitos municípios que fazem recrutamentos sobre uma base puramente partidária e, portanto, se se criar mobilidade com a administração central havia o problema de criar uma forma de introduzir na administração central pessoas que eram contratadas para se deslocarem automaticamente para a administração central. Portanto, há alguns problemas e algumas limitações. Há que criar mecanismos, acho que está previsto que se criem alguns mecanismos, algum controle, mas há que criar mecanismos dentro da própria administração local, para haver uma grande avaliação de custos, de benefícios, para haver um melhor funcionamento da administração local. E sente-se de facto que os municípios têm o mesmo problema que a administração central, ou seja, uma má relação entre o autarca e a administração propriamente local e alguma dificuldade e duplicação de meios. Os autarcas tendem a contratar pessoas da sua confiança para a área do urbanismo. Há câmaras também com centenas de arquitectos e engenheiros, que não têm dimensão para ter aquele volume. Por outro lado, as câmaras têm gerido muito os efectivos com privatização, não é bem privatização, é empresas municipais em certas áreas. E essa experiência também não tem sido devidamente avaliada. Muitas vezes as empresas municipais são sobre-custos. É o problema dos autarcas receberem simultaneamente 2 e 3 ordenados, e é o problema de fugir ao controle público, nomeadamente o Tribunal de Contas. Ainda bem que há uns dias, segundo vinha publicado no jornal, saiu a lei que permite ao Tribunal de Contas também intervir no controle desses organismos.   
 
Eng.Manuel Lancastre
Bem muito rapidamente é assim: não há razão para que as metodologias de racionalização e de gestão sejam diferentes na administração local e na administração central, estamos a falar de organismos. Agora, quando olhamos para a administração local, vemos um conjunto muito heterogéneo até de modelos de gestão e por isso obviamente que deverá haver o cuidado de ter essa heterogeneidade e essa diferença em conta. Eu queria aproveitar só esta questão sobre a administração local para dizer que grande parte dos problemas de qualidade do serviço, sobretudo nalguns serviços que são prestados ainda pelo próprio Estado, poderiam ser mais facilmente resolvidos se a sua resolução estivesse mais dependente das administrações locais. E estou a falar de serviços que estão…

Lado B

…Porque é que um Centro de Saúde não há de ser acompanhado mais proximamente por uma autarquia? E este tema, que normalmente se rotula de descentralização de funções, eu penso que é um dos temas centrais onde se fala de melhoria da qualidade de alguns serviços, que ainda são prestados pelo próprio Estado.             
 
Bruno Travassos
Muito boa tarde, em primeiro lugar gostaríamos de cumprimentar o Dr. Manuel Lencastre e o Eng.º João Proença, e dar-lhes os parabéns pelas suas apresentações, sobre um tema que é tão importante para o nosso país. A nossa questão é a seguinte: sabendo que em qualquer organismo a estrutura, a sua estrutura organizacional, deve funcionar como um diferencial competitivo, pela sua dinâmica, pelas suas formas de actuação, pelas suas políticas, como é que consideram que a função pública tem condições para alterar a sua cultura organizacional? Em que sentido, com que estratégias é que isso poderá ser possível? Obrigado.
 
Eng.Manuel Lancastre
Eu tive o privilégio de trabalhar durante um ano em estreita ligação com muitos funcionários públicos, dirigentes e funcionários. Mas também sou um gestor, portanto tenho trabalhado ao longo da minha vida toda em empresas, aos vários e diversos níveis. Aquilo que eu vos posso dizer é que na administração pública se encontra gente tão boa ou melhor do que nas empresas, e gente muitas vezes que veste tanto ou mais a camisola do que a veste também nas empresas. Portanto não há uma diferença muito grande entre aquilo que se encontra num lado e aquilo que se encontra no outro. Mas há aqui um fenómeno estranho na administração pública relativamente às empresas que eu já mencionei: é que em geral, nas empresas, como estão em concorrência, os dirigentes, os chefes dessas empresas, têm sempre a preocupação de ter o exército mobilizado no sentido de vencer a concorrência. E já também observámos aqui, nas múltiplas intervenções, que existe de facto um déficit de gestão do próprio Estado. Portanto, eu não escondo que também encontrei muita gente boa mas muito desmoralizada, desmobilizada e desmotivada. Logo, a resposta a essa pergunta é que é possível de facto e há organismos que funcionam muito bem. É possível desde que os dirigentes e os governantes tenham a capacidade, a competência e a vontade de dirigir bem os organismos que têm. Portanto eu acho que é possível. E não se trata aqui de uma mudança cultural, porque não há nem uma cultura má nem boa, é a cultura que existe. Trata-se da motivação, do aumento da produtividade com base na mobilização das pessoas.
 
Eng.João Proença
Essa também é uma questão extremamente importante. A cultura de organização, motivação. De facto, muitas vezes há um discurso demasiado generalista para a administração pública. E cai-se por vezes facilmente nesses discursos. Há tempos, a Sr.ª ministra da educação fez um discurso extremamente negativo para todos os professores, e eu tive a oportunidade de a criticar fortemente, e até dizendo-lhe directamente: - a Sr.ª está a enfiar um garruço a si própria, porque também é professora. Dentro dos professores há magníficos profissionais, tipo João da Semana, o exemplo que nós temos sempre tradicional na nossa memória. Há de facto muitas vezes organizações que enquadram mal o trabalho dos seus profissionais. As organizações em Portugal, nomeadamente na administração pública, têm ignorado muito a relação custo/benefício e a relação de serviço que prestam directamente ao utente, portanto fecham-se demasiado sobre si próprias. Se calhar, se perguntasse hoje a mais de metade dos dirigentes da administração pública quantos trabalhadores têm, eles nem sabem. Portanto estou a falar uma direcção geral relativamente grande. Não é só o ministro que não sabe o número de trabalhadores que tem. Os próprios organismos não têm a noção. Se eu perguntar a um gestor de qualquer empresa, sabe perfeitamente o número de trabalhadores que tem, é uma gestão muito mais directa. Portanto há aqui um problema do organismo muitas vezes não reagir neste influxo de custo/benefício e também não ter presente a melhor gestão de recursos humanos que tem e como valorizar esses recursos humanos. E há exemplos até perversos. Falou-se há bocado da formação: hoje a formação na administração pública está bastante melhor do que estava há uns anos. Mas eu lembro-me ainda de há uns anos ninguém ir fazer formação. Havia os cursos do INA que eram oferecidos aos organismos, para eles mandarem trabalhadores, e eles mandavam os trabalhadores que não estavam a fazer nada, os piores trabalhadores, aqueles que estavam na prateleira. Quem não fizesse falta podia ir fazer um curso de formação, quem fizesse falta nem pensasse nisso. Ou seja, é uma péssima noção do que é o efeito da formação. Acho que de facto é necessário discutir uma cultura de administração pública que existe, mas que nos últimos anos tem sido muito atacada e tem sido muito destruída. E permitam-me abordar uma questão que ainda não foi referida neste debate, que é a questão dos vínculos, o chamado vínculo estatutário do funcionário público, funcionário ou agente que tem um vínculo público, e o contrato individual de trabalho. É o contrato individual de trabalho que é o contrato normal nas empresas. E tem havido muito no discurso político acabar com o vínculo público, e passar tudo a contrato individual de trabalho. Depois, como este discurso a certa altura já chegava ao absurdo, disseram que ainda há um pequeno núcleo que mantém o vínculo público, as pessoas que trabalham em cargos técnicos, nas inspecções ou nalguns organismos muito especiais, mantêm o vínculo público. O vínculo público é qualquer coisa inerente e fundamental ao funcionamento da administração pública. A administração pública deve ter estabilidade também em termos dos seus quadros. Os quadros não podem estar sujeitos a mudanças. Não pode haver um governo que diz que como a Direcção Geral de Contribuições e Impostos é muito importante, vou lá pôr os meus apaniguados, porque são os que me dão confiança nas funções que desempenham. A função da administração pública tem de ser apartidária, e isso obriga a que haja a noção de quadro e a noção de funcionário público, que é diferente do conceito do contrato individual de trabalho nas empresas. Nós até defendemos o contrato individual de trabalho, por exemplo, nos institutos públicos, e até nalguns em que havia trabalhadores também com vínculos públicos, admitimos a necessidade de haver um único vínculo, mesmo que se assegurassem mecanismos de transição para permitir uma melhor gestão, mas o vínculo público é diferente daquele que é assegurado por um contrato individual de trabalho e essa discussão também tem criado grandes problemas em termos da gestão dos organismos.
 
Rosa Moreto
Muito boa tarde. Eu gostaria de dizer em primeiro lugar que a imagem que os cidadãos em geral têm relativamente à função pública está um pouco, eu diria mesmo bastante denegrida. E dou um exemplo muito concreto: há muita gente que diz da boca para fora: - Só é professor quem não sabe fazer mais nada. Eu como professora não gosto muito de ouvir este tipo de comentários, e outros piores até. A questão é a seguinte: de facto, como em qualquer área de trabalho, há pessoas competentes e há pessoas que se calhar não fazem o seu trabalho da melhor forma. Então gostaríamos de saber o que é que poderá ser feito para que os funcionários públicos, que desenvolvem o seu trabalho da melhor forma e que são competentes, sejam valorizados por aquilo que fazem. Será que passa por uma avaliação da função pública? Obrigado.
 
Eng.João Proença
Está aqui o Carlos Coelho a perguntar-me, em jeito de provocação, porque é que os sindicatos são contra a avaliação do mérito. Os sindicatos não são contra. Mas, por exemplo, para ir parar ao quadro dos excedentes, o tal quadro que falámos há bocado na mobilidade, o governo põe como único critério a avaliação do chefe. Nós dizemos, então o chefe pode decidir quem fica e quem sai, ou seja, isto é a partidarização total. Nos despedimentos colectivos há critérios objectivos que não podem passar pelo chefe, justamente para evitar uma coisa que a Constituição proibiu que é despedimento sem justa causa. Bem, mas essa questão é a questão da imagem. Eu também acho que de facto os sindicatos têm algum papel que tem que mudar. Os sindicatos e os trabalhadores têm que se preocupar com a qualidade do serviço que prestam, e com a imagem que têm perante o exterior em termos de qualidade. E que muitas vezes os sindicatos ainda são vistos pelo cidadão com um papel puramente reivindicativo em termos de condições de remuneração, de condições de prestação do trabalho, e não propriamente preocupado com o funcionamento do serviço. Por exemplo, nas discussões que temos tido internamente com o sindicato dos professores temos vincado muito essa noção, que hoje o sistema educativo é um sistema que funciona melhor do que há 20 ou 30 anos. É um sistema que venceu o desafio da quantidade, o alargamento da escolaridade obrigatória, o maior número de alunos, mas não venceu o desafio da qualidade. E quando não se vencem estes desafios, quem acaba por ser penalizado, nomeadamente em termos de imagem, são os trabalhadores que estão envolvidos. E portanto o trabalhador, até para ter uma maior capacidade reivindicativa, tem de estar muito preocupado com a qualidade do serviço que presta. Mas é evidente que discutir qualidade é sobretudo também um problema de condições de prestação de serviço. É um problema de gestão. Portanto, hoje o problema fundamental do funcionamento do sistema educativo é um problema de gestão. E verificamos isso quando vemos que o sistema educativo envolve um terço dos trabalhadores da administração central, envolve verbas extremamente avultadas, e a gestão é feita de um modo pouco profissional, tanto em termos do ministério como em termos das várias unidades orgânicas. Por exemplo quando foi do Congresso do PSD, o seu líder fez um discurso basicamente com dois desafios. Um deles parece-nos que é um tiro na água porque é muito discutível, aquele das rescisões amigáveis dos trabalhadores, ir buscar dinheiros à União Europeia. Nós dissemos logo na altura, que isso não era possível e portanto que teria de ser discutido de modo diferente. Mas outra questão central e dissemo-lo mesmo no Congresso ao Presidente, é de facto um novo modelo de gestão das escolas e dos hospitais. E muita da imagem dos funcionários públicos passa pelo funcionamento de dois serviços fundamentais para os cidadãos, que são as escolas e os hospitais. E isso implica de facto discutir o modelo de gestão.                 
 
Eng.Manuel Lancastre
Eu até neste ponto que achava que ia estar em desacordo aqui com o Eng.º João Proença, por estarmos a discutir os modelos de gestão das escolas... Enfim, eu também penso que muita, e pegando no caso concreto dos professores, da má imagem que os professores têm, tem a ver com a falta de incentivo que muitos deles têm em trabalhar melhor. Portanto vão à aula, não vão, faltam, não faltam, nada de grave lhes vai acontecer. O que o PSD propôs, por acaso, foi um modelo de gestão totalmente diferente para as escolas. O que o PSD propôs foi que as escolas não devem ser geridas por professores. Hoje as escolas são geridas por professores, obrigatoriamente. O PSD aquilo que diz é o seguinte: uma escola tem que ser gerida por um gestor, nada impede que esse gestor seja professor, agora tem é que ser gestor para que a escola seja bem gerida. E esse gestor tem que ter autoridade sobre a escola, tem que ter graus de liberdade. Portanto, vai-se responsabilizar pela qualidade da gestão da escola, mas tem que ter também os instrumentos que beneficiem ou penalizem quem trabalha pior ou quem trabalha melhor. Logo, este é o modelo que o nosso partido propõe de profissionalização dos modelos de gestão das escolas, dando mais autonomia às gestões no sentido de assegurar uma muito maior qualidade média do próprio ensino. E portanto fico muito satisfeito de saber  que o Eng.º João Proença concorda também com este ponto de vista.            
 
Carlos Dias
Boa tarde, caríssimos oradores, Sr. Eng.º João Proença, Deputado Carlos Coelho, e Sr. Dr. Manuel Lencastre e Daniel Fangueiro. Fala-se em reduzir os funcionários públicos, através de rescisões amigáveis, sem que os mesmos fiquem prejudicados com este processo. Que forma existe de rentabilizar estes mesmos funcionários? Ainda no âmbito da reforma do sistema político, há quem defenda a definição clara dos cargos de carreira e nomeação política; como tal passaria a existir uma relação entre a queda de um governo e o fim de determinadas nomeações. Acha que esse factor levaria a uma melhor gestão pública, nomeadamente através da maior estabilidade das instituições? Obrigado. 
 
Eng.Manuel Lancastre
Bem em primeiro lugar e relativamente às rescisões amigáveis, o PSD acredita, e eu acredito mesmo, que é o primeiro instrumento que deve ser colocado em cima da mesa para decidir a vinculação ou a desvinculação de um actual funcionário público. Rescisão amigável, rescisão por mútuo acordo. Se não houver acordo de uma das partes não há rescisão. Penso que é um mecanismo equilibrado e eficaz, se as condições forem criadas. Relativamente à politização dos cargos dirigentes, estou frontalmente contra por todas as razões que já enunciei. Quando se fala em politização está-se a partir do pressuposto que a selecção é feita com base em critérios políticos, quando a selecção deve ser feita de origem com base em critérios quase que exclusivamente de competência. É muito importante que o dirigente seja o gestor mais competente para colocar à frente do organismo, no sentido de assegurar que o organismo funciona bem. Para além da questão da competência não estar salvaguarda na nomeação política, é também colocado aqui em cima da mesa um factor de instabilidade isto é, quando muda um governo automaticamente vai mudar o dirigente. E a instabilidade também não é amiga da boa gestão.
 
Eng.João Proença
Quanto à questão da redução de efectivos, nós achamos que a grande via é a do controle das admissões, um controle efectivo, e uma redução gradual de efectivos. Portanto como uma grande organização, no Estado há cerca de 20.000 que saem todos os anos, sobretudo por reforma e haveria que encontrar mecanismos de substituir apenas uma parte disso. Por outro, e quando se fala de certo tipo de transferência de funções, deve, de facto, envolver também transferência de número de trabalhadores. Há um problema de gestão financeira do Estado, que é um problema sério. É que o Estado, não pode fazer como uma empresa que, quando tem problemas de efectivos, promove despedimentos colectivos, reformas antecipadas, restruturações, porque há uma Segurança Social que é totalmente à parte da empresa. No Estado a Segurança Social é do próprio Estado. É a Caixa Geral das Aposentações. Os funcionários pagam o mesmo que os restantes trabalhadores mas, na prática, quem paga à Caixa é o Orçamento do Estado. Portanto, quando um trabalhador se aposenta, os encargos diminuem muito pouco para o Estado, porque paga uma reforma correspondente quase ao salário. E se o Estado então substituiu o trabalhador, os encargos aumentaram. Daí também haver sempre esse problema de gestão do Estado. Rescisões amigáveis, eu acho que de facto levantam problemas. Constitucionalmente é proibido despedir funcionários ou agentes, não trabalhadores abrangidos por exemplo por contrato individual de trabalho, avenças ou outro tipo, mas funcionários ou agentes, e daí o tal problema do quadro de excedentes, e encontrar mecanismos de saída. Os mecanismos de saída têm que ser discutidos com muito cuidado porque há sempre o perigo de saírem os melhores, e portanto ver bem como é que se funciona com estes mecanismos para que na prática não fiquem apenas os menos qualificados, ou aqueles menos motivados. Em termos da gestão, relativamente aos dirigentes, eu há bocado referi que, normalmente, quando muda o ministro muda a lei orgânica. E porque é que as leis orgânicas nos últimos anos mudaram tanto? Porque quando muda a lei orgânica caem automaticamente todos os dirigentes. Portanto uma maneira que os ministros arranjaram de poder substituir os directores como muito bem entendessem é mudar a lei orgânica. E podiam substituir os directores gerais, os directores de serviço, os chefes de divisão, portanto abrangia os chefes todos. Portanto, há que acabar com isso. Este governo criou uma lei que também é perversa, mas dizendo que os directores gerais são de confiança política, que quando cai um governo caem automaticamente os directores gerais. O novo governo pode mantê-los ou pode nomear outros, mas cairão automaticamente; já não é preciso mudar a lei orgânica. Isto parece-nos positivo. Agora o que era importante, independentemente de os directores gerais serem ou não de confiança política, era criar uma certa estabilidade na administração. Não é, nomeadamente, admissível que haja actualmente 4 níveis de chefia de confiança política: directores gerais, subdirectores gerais, directores de serviço, chefes de divisão. Portanto, dever-se-ia diminuir brutalmente o número de delegados de confiança política. Era bom que as pessoas fossem admitidas por qualidade. Infelizmente, nos concursos na administração, normalmente só lhes falta a fotografia do candidato a admitir. Então para director geral, ainda mais do que isso. Aliás, há grandes questões relativamente ao concurso nomeadamente para chefes de divisão e directores de serviço justamente porque se caiu nisso, era concursos com fotografia.        
 
Jorge Varela
Muito obrigado. Senhores oradores. Portugal tem actualmente um governo – e isto não é a questão é ainda uma afirmação – que, sendo apoiado pelo Partido Socialista na Assembleia da República, julgo que é pacífico que, pelo menos nesta área, é um governo de direita. A questão que o grupo bege queria colocar a V. Exas. é a seguinte: qual deve ser, na vossa douta opinião, o papel que o PSD, enquanto principal partido da oposição, deve desempenhar na defesa dos interesses e dos direitos dos trabalhadores, nomeadamente dos trabalhadores da administração pública?

 
Eng.João Proença
Estão-me a dizer que me calha responder em primeiro lugar. Que dificuldade! O que é que o PSD deve fazer e o PS, e o governo actual, ser de direita na área da administração. Eu acho que na área da administração é mais aquilo que eu disse há bocado; é o mata e esfola. Ou seja, muitas das medidas do actual governo são mais ou menos medidas recicladas do governo anterior. E portanto os sindicatos tiveram dificuldades em conviver com as medidas de um e de outro. Mas no último ano, de facto, para os trabalhadores da administração pública houve políticas altissimamente penalizadoras. O problema dos regimes de pensão, o problema do congelamento dos salários, este mecanismo de mobilidade e outros. Portanto houve medidas ultra-penalizadoras. E hoje, sente-se uma desmotivação brutal na área da administração. E o que fazer? Como está escrito nos papéis, e se virem depois na Internet o documento, vêm que até certa altura eu falo do consenso político. Consenso político em termos de criar, por exemplo, estabilidade na administração. Achava também, que nalgumas medidas centrais de reforma da administração pública devia haver um maior consenso político, e não haver um governo, seja ele qual for, que se arrogasse o direito, enquanto governo, de governar, de legislar e de fazer. E nesta matéria é perigoso que haja esta instabilidade permanente da administração. Mas acho também que este conceito de reforma da administração tem que ser qualquer coisa que tem que ser assumida como uma reforma dentro de cada unidade orgânica. Não é a reforma por decreto-lei. Eu costumo dar o exemplo da lei de bases do governo Durão Barroso/Bagão Félix. Existia uma lei de bases da Segurança Social. Houve um acordo na Segurança Social celerado por todos os parceiros sociais e pelo governo em 2001. Isto deu origem a uma revisão da lei de bases. Quando entrou um novo governo, a primeira questão foi rever a lei de bases. Andámos largos meses a discutir a revisão da lei de bases. A lei de bases foi revista, foi alterada em 2003. O governo esteve lá vários anos, não publicou uma única medida para a qual precisasse da revisão, que não pudesse publicar de acordo com a lei de bases anterior. Aqui em Portugal há muito este aspecto, não se olhar para aquilo que se pretende fazer, para os resultados concretos a alcançar. Acham que se fazem reformas publicando uma nova lei. E temos que acabar com esta legislação sistemática e com as reformas que só têm a ver com a legislação e não com as práticas. Eu acho que houve algum consenso em matérias positivas, como por exemplo esta questão da avaliação dos serviços, da avaliação dos trabalhadores. O problema foi que nunca se encontrou um método adequado para fazer a avaliação dos trabalhadores, até porque muitas vezes a avaliação estaria ligada à avaliação dos serviços e nunca se fez verdadeiramente a avaliação dos serviços e dos dirigentes, e portanto há um certo número de questões centrais que não têm a ver com a dimensão da administração, porque, como digo, relativamente à dimensão da administração, por vezes, os partidos políticos têm um posicionamento diferente. Poderá não ter a ver com a existência ou não de alguns organismos da administração, muito menos com a nomeação dos dirigentes, mas tem a ver com métodos concretos de gestão e com problemas concretos de gestão relativamente aos quais devia haver maior consenso.
 
Eng.Manuel Lancastre
Agradeço a pergunta. É uma pergunta muito interessante, porque é uma pergunta com uma forte componente ideológica. E posso-lhe desde já dizer que não estou de acordo com a primeira afirmação que fez. Este governo no conteúdo é claramente um governo socialista, e no estilo é um governo autoritário. O PSD tem uma proposta de centro, moderada de direita, relativamente às funções do Estado, que é uma proposta de fundo, que indica claramente a direcção da transferência gradual, cuidadosa, e com bom senso de funções para a iniciativa privada. No conteúdo, estamos aqui a falar de uma diferença fundamental. No estilo, propõe uma forma consensual amigável. Uma rescisão amigável não é um despedimento. Aliás o Eng.º João Proença mais uma vez, concorda com as rescisões amigáveis porque chama-lhe aqui um mecanismo de saída. Mas na prática um mecanismo de saída tem que ser amigável e portanto é uma rescisão amigável. Portanto, do ponto de vista ideológico, este governo é claramente socialista, tem um complexo ideológico tremendo que o impede de sequer tocar no assunto das funções do Estado. E portanto este PRACE, este SIMPLEX, mas sobretudo o PRACE não é mais do que voltar a baralhar para ficar tudo na mesma. Porque as pessoas não vão sair. Vão ficar emprateleiradas e eventualmente com salários menores. Portanto não estamos aqui a falar de uma reforma do Estado profunda, não estamos a falar aqui de uma redução do perímetro do Estado, estamos a falar de manter tudo exactamente como está, mas pior. Não só não resolvem a questão de fundo, como vai ficar tudo como está mas com grande animosidade porque estão a provocar de forma insuportável a administração pública com o estilo autoritário. Portanto, a posição do PSD é radicalmente oposta. Passa pela transferência de funções para a iniciativa privada, e bom senso, cordialidade, educação nos instrumentos que vai utilizar. Obrigado.
 
Rómulo Ávila
Muito boa tarde a todos. Em primeiro lugar e em nome do grupo encarnado quero cumprimentar a mesa, o Dr. Manuel Lencastre e o Eng.º João Proença, sem esquecer, claro, a organização desta universidade, o Presidente da JSD e o amigo Reitor Carlos Coelho. Tendo em conta então que a máquina do Estado não é actualmente lucrativa, e considerando que o Estado está ao serviço da pessoa humana e não ao contrário, ou seja o Estado deve gerir e não criar, como encaram, os dois, claro, a questão actual da privatização das empresas do Estado, o exemplo da EDP, como forma de diminuir os encargos financeiros e diminuir o peso da administração pública, sem hipotecar nunca o serviço que é prestado à sociedade portuguesa, mas dando antes azo à criatividade e à liberdade daqueles que querem fazer o Portugal de amanhã, um Portugal virado para as pessoas. Muito obrigado.
 
Eng.Manuel Lancastre
Eu, que me lembre agora, de privatizações ou novas fases de privatização, temos em cima da mesa a da EDP, da GALP e da REN também. Vamos lá ver, são de facto privatizações. É colocação de capital de empresas na bolsa. Mas são privatizações de empresas altamente reguladas, em sectores muitíssimo regulamentados. Em que temos por exemplo uma entidade reguladora como a ERSE para o sector da energia, aliás são as duas empresas do sector da energia. Aliás as três empresas são do sector da energia. Temos uma entidade reguladora, temos a Autoridade da Concorrência, temos tarifas na REN que são fixadas pela direcção geral, portanto eu diria que é uma privatização de facto com cintos e suspensórios. Mas é de facto uma privatização, não há dúvida nenhuma. Mas aquilo que eu penso é que os direitos dos cidadãos, e dos clientes destas empresas, têm todas as condições para estarem salvaguardados. Aliás é um bom exemplo disso, o Estado deixa de ser executor, sai da gestão e passa a estar concentrado exclusivamente numa boa regulamentação do sector e numa óptima – esperemos nós – fiscalização da forma como o sector funciona. É um óptimo exemplo da visão que o PSD tem para o Estado e para algumas empresas que ainda são públicas. Obrigado.
 
Eng.João Proença
Bem permitam-me que comece por responder um pouco à provocação do Dr. Manuel Lencastre quando diz que eu concordo com as rescisões amigáveis. Relativamente ao discurso do líder do PSD no último congresso, nós dissemos que tínhamos muitas dúvidas quanto ao caminho. Ele apontou as rescisões amigáveis e disse que seriam financiadas pelos fundos comunitários. Na altura, com já referi, dissemos que não nos parecia que os fundos comunitários pudessem ser utilizados nesse quadro, até porque há uma legislação comunitária que diz que as administrações públicas não estão envolvidas pela área comunitária. Funcionam completamente autonomamente. Aliás houve um director a nível intermédio, um director de serviço se não me engano, que foi nomeado no quadro da União Europeia para promover troca de informação entre as administrações públicas, mas praticamente Bruxelas não tem nada a ver com a administração pública. Não significa que não financie, por exemplo, modernização ou formação na área da administração pública portuguesa. Mas propriamente a questão das rescisões, a tal questão de saída amigável, por rescisões amigáveis. Nós achamos que o problema central é um problema de mobilidade. É pôr os trabalhadores nos sítios onde podem ser mais úteis. Se depois se descobrir que há trabalhadores que de facto estão a mais, no fim de um processo, esses trabalhadores devem ter uma saída. No passado, quando foi criado o quadro dos excedentes, e foi criado há 20 e tal anos, normalmente a saída era, para os trabalhadores mais idosos, a reforma antecipada. Portanto admitimos que, neste quadro, no fim, possa haver uma rescisões amigáveis, mas para esses trabalhadores que de facto não foram colocados devidamente e relativamente aos quais portanto se verifica que não tinham qualificações adequadas para os postos de trabalho, ocupar os postos de trabalho disponíveis, nunca no início de um processo. Porque no início de um processo vai ter um efeito altamente perverso. Primeiro é definir politicamente, Ludgero Marques da AEP há uns anos disse, que deviam sair 150.000 funcionários da função pública. Como eu digo, a função pública é a educação, é a saúde, é isto ou aquilo, digam-me lá de onde é que saem? Querem diminuir o número de polícias? Querem diminuir o número de professores? Querem diminuir o número de médicos? Não basta dizer que saem 150.000. E o conceito das rescisões amigáveis tal como vem anunciado pelo PSD, é exactamente o mesmo. Tem que se definir que vamos promover rescisões amigáveis, e que saem todos. E normalmente saem os melhores. Houve uma lei que há uns anos foi criada, que era a lei que permitia trabalhadores considerados excedentários nos serviços pedirem a reforma antecipada. Para tal, tinha que um serviço declarar que esse trabalhador estava a mais e, portanto, não era necessário no serviço, ou seja, que o serviço não o ia substituir. A lei foi criada com esse fim, e estava mais ou menos correcta. O que é que isso deu? A certa altura toda a gente pedia. E, por exemplo, os médicos saíram esmagadoramente. Não saíram para a reforma. Saíram para trabalhar no sector privado. E outras situações. Temos de ter algum cuidado na gestão da administração e identificar claramente os objectivos e depois chegar lá. Quanto a nós, portanto, o problema das rescisões não é um problema à partida. Pode ser um problema depois de explorar a questão da mobilidade, o problema de excedentes, dos trabalhadores não colocados, dos trabalhadores que não foi possível requalificar.

Segunda questão, as privatizações. Nós na UGT, relativamente às privatizações, sempre tivemos uma posição muito descomplexada, e num tempo em que era muito difícil discutir esta questão, até porque a Constituição proibia as privatizações. No início dos anos 80 houve uma grande discussão no quadro do ministério das finanças. Até foram os primeiros anos da Constituição. A Constituição foi criada em 76 e houve uma grande discussão com o governo da altura. O ministro era o Dr. Hernani Lopes. Foram as chamadas discussões das 100 horas. E uma das discussões que pela primeira vez foi assumida em termos de poder político/governo/parceiros sociais foi a discussão das privatizações. E a posição da UGT foi clara. A nós não nos interessa quem é o dono do capital, interessa-nos é como é que o capital é utilizado. E também como é que, relativamente a monopólios naturais, existe, de facto, um controlo do interesse público. E portanto não nos preocupa tanto o problema da privatização das empresas públicas, nomeadamente a EDP. O problema é de facto o poder das entidades reguladoras. Há uns anos não existiam, agora já existem, funcionam relativamente bem, embora às vezes com algumas decisões discutíveis e portanto há que ver bem essa questão. É evidente que no sector energético, há um problema de organização e isso é uma questão central. Essa questão, na prática, tem levantado muitas dúvidas, até pela maneira como os sucessivos governos vêm conduzindo o problema da reestruturação do sector, dúvidas essas que não têm sido devidamente clarificadas. Agora, uma questão diferente a clarificar, é a privatização de empresas ou serviços públicos em áreas de prestação claramente de serviço público. E eu dava aqui 3 exemplos: a questão das águas, a questão do saneamento básico e a questão dos transportes urbanos. São 3 áreas em que, de facto, se levantam muitas dúvidas sobre se estão garantidos os interesses dos utentes. E achamos que, prioritariamente, deve haver uma maior intervenção das autarquias locais. Continuamos a não perceber porque é que a Câmara de Lisboa não tem nada a ver com a gestão da Carris e do Metro e porque é que a Câmara do Porto não tem nada a ver com a gestão do Metro. Embora o Metro do Porto é diferente em termos de uma gestão, as Câmaras municipais já têm uma participação. Mas, por exemplo, a câmara municipal do Porto não tem nada a ver com os transportes colectivos do Porto. É administrado pelo governo central. E isso julgo que é uma má decisão. Portanto havia que reforçar a intervenção das autarquias nesta gestão ou até entregar-lhes, em determinadas condições, a gestão. Agora, a privatização das águas e do saneamento básico, também é outra área em que normalmente pode levar a um crescimento de custos. A questão não é a privatização, aqui é um problema de uma melhor gestão, que garanta melhor o interesse público.
 
Helder Fonseca
Boa tarde a todos. Em primeiro lugar quero saudar a mesa, em especial o Sr. Dr. Manuel Lencastre e o Eng.º João Proença. Em seguida passaria à pergunta que o Grupo Verde acha pertinente, e que é a seguinte: tendo em conta a afirmação do Dr. Manuel Lencastre – Estado a mais, gestão de menos -, gostaríamos de saber a opinião dos dois oradores sobre a medida anunciada pelo governo, para os gestores públicos, que poderão receber incentivos financeiros até 50% da remuneração fixa, caso cumpram ou ultrapassem os objectivos de gestão contratualizados com o Estado. Obrigado.

 
Eng.João Proença
E se não cumprirem serão penalizados? O problema em Portugal é que só se criam benefícios, não se criam sanções. É evidente que uma gestão por objectivos nos parece uma gestão positiva e que ligar os resultados da gestão à remuneração também pode ser positivo, mas não pode é haver apenas um espírito de benefício e recusar completamente um espírito de penalização. Um gestor é nomeado por 4 anos, ao fim de 1 ano verifica-se que não cumpriu os objectivos, devia poder ser demitido sem qualquer indemnização. É que em Portugal, em certa medida, criaram-se vantagens exageradas, nem tanto em termos de salários mas quanto à maneira como se fazem rescisões e outras, para os gestores públicos. E mesmo em termos das decisões internas. Há tempos, o ministro da saúde condenava o facto de alguns gestores hospitalares, e para além de terem comprado as grandes viaturas, terem também decidido sobre as remunerações adicionais a conceder a si próprios. São muitas vezes criados vícios neste sistema e, portanto, achamos que um sistema de benefícios tem de estar necessariamente ligado a um sistema de penalizações e, sobretudo, ter presente claramente como é que vão ser definidos os objectivos e como é que é feita a avaliação de serem ou não atingidos.
 
Eng.Manuel Lancastre
Eu não queria tanto comentar aqui se é mais 50%, estando de acordo obviamente que se houver algum benefício tem que haver uma penalização, mas eu queria insistir no seguinte: mais importante do que o incentivo, é assegurar que a pessoa que está à frente do lugar é a pessoa certa. E muitas vezes o recrutamento destas pessoas deve ser alargado. Provavelmente, muitas vezes a pessoa certa vai estar no âmbito do Estado, mas pode não estar. Ora, se a preocupação do Estado é ter a pessoa certa no lugar certo, o Estado vai ter de competir pelas melhores pessoas com a iniciativa privada. E se para competir pelas melhores pessoas com a iniciativa privada for necessário ter em conta, com moderação e com muito cuidado, a componente salarial, então que isso seja feito. Agora, se há um benefício também tem que haver uma penalização.
 
Dep. Carlos Coelho
Bom, iremos dar início às questões livres. Eu pedia a todos que o queiram que levantem o vosso braço.

- O Bruno Givã. O João Verde. O Bruno Travassos. O João Veiga. A Isabel Costa Belo, do Grupo Bege.

- Bem por proposta do Eng.º João Proença, há aqui mais...

- A Tânia Jesus, do Grupo Cinzento.

- Bem, eu receio que não vá ser possível, temos imensos inscritos. Isto só demonstra que o tema, de facto, é interessante e que suscita a vossa participação. Há 15 inscritos, nós temos poucos minutos. De qualquer forma, vamos tentar fazer grupos de 3 questões, e vamos pedir a cada orador para ser muito curto, têm 1 minuto. É pergunta rápida, não é com considerandos, é ir ao ponto. E vamos pedir aos nossos dois convidados que respondam também brevemente, para ver se podemos atender à maior parte das questões. Enquanto o Dr. Lencastre não está aqui, há alguém que queira fazer uma pergunta só ao Eng.º João Proença? Muito bem, tem a palavra. Como é que se chama?  Joana, muito bem.

 
Joana Lopes
Muito boa tarde. Gostaria evidentemente de saudar a mesa, em particular os convidados, saudando de uma forma especial o Eng.º João Proença que deu um exemplo de democracia ao máximo nível ao estar aqui perante uma plateia de social-democratas. Dizia há pouco que a privatização do serviço público é evitável e deu como exemplo a privatização do notariado. Se me permite, eu alteraria a designação para liberalização do notariado, porque o notário é agora um profissional liberal, mas continua a ser um oficial de justiça e a dar fé pública e, como tal, delegatário da fé pública do Estado, que é o que o Estado lhe confere. Gostaria também de lhe dizer que discordo dos números que apresentou relativamente aos funcionários, isto porque ainda não estão sequer atribuídas metade das licenças desta reforma, que foi quantitativamente a reforma maior da administração pública que alguma vez foi feita, e já estão preenchidos mais de 25%. Estou a falar tanto de notários como de funcionários do notariado. O que eu gostaria de lhe perguntar é a seguinte: neste momento para se fazer uma escritura, por exemplo, no concelho de Lisboa, a justiça é mais célere, é mais eficaz, as pessoas têm melhores condições, o acesso de deficientes motores é garantido, e é possível fazê-la em 2 dias no caso da documentação ser legal, evidentemente, em vez de estarmos há espera 5 meses. Portanto, estando a segurança jurídica garantida, essa reserva clara à privatização do serviço público não é um contra-senso? Não leva exactamente ao contrário, ou seja, continuar a criar uma administração pública bolorenta - peço perdão - e pesada? Se podemos de alguma forma agilizá-la e prestar efectivamente um melhor serviço público, não é isso que nos interessa? É isso que eu queria perguntar. Obrigado.                 
 
Eng.João Proença
Obrigado. Agradeço as suas palavras, e acho que há alguma confusão, por minha culpa certamente. Eu falei no caso do notariado no quadro da externalização de funções sem aumento de custos. Não falei em termos de privatização de um serviço público, porque é um serviço público muito especial, justamente a existência dos notários. E falei da externalização de funções como um exemplo errado de um modo como foi feita a externalização de funções. Nem eu pessoalmente, nem a UGT, nunca nos pronunciámos contra a privatização, ou o que quiser chamar, do notariado - ou liberalização, como referiu, do notariado. Agora o modo como foi feita foi 100% errada. Porquê? E como é que devia ser feita? É evidente que se um notário é privatizado deveria ficar com todos os trabalhadores. Agora devia-se garantir aos trabalhadores o direito de poder voltar ao serviço público. O problema é que se criaram condições para que 70% ou 80% dos trabalhadores se mantivessem na administração pública, e só 15 ou 20 é que foram. Portanto, é evidente que em termos de emprego isto foi óptimo, criou novos postos de trabalho. Em termos de administração pública criou um custo. E também é evidente que há outras questões que ainda não estão suficientemente clarificadas. Essa privatização, ou o que quiser chamar, do notariado foi em termos de receitas da administração pública. Causou diminuição de custos ou aumento de custos? E isso não está claramente provado. Têm havido avaliações, avaliações que normalmente parecem apontar que para o utente custou mais dinheiro, visto que passou a pagar IVA e outras questões; para a administração pública provavelmente tem menos receitas. Mas, portanto, vamos lá ver quando for feita a avaliação clara do sistema. Mas o que nós temos que dizer é que sempre que há externalização de funções, deve procurar garantir-se que essa externalização de funções traz um claro benefício em termos de custos da Administração Pública e também em termos de gestão do pessoal. E consideramos que não está isso provado na área do notariado.
 
Dep. Carlos Coelho
Bom, só avisar que temos cerca de 28 minutos para concluir este debate. Iremos fazer agora grupos de 3 questões para os nossos oradores e formular mais uma vez o pedido de que fossem o mais concisos, objectivos, por forma a podermos completar todas as perguntas que aqui estão e fazer com que todas as pessoas que estão inscritas possam fazer a questão aos nossos oradores, e ao mesmo tempo de se respeitarem uns aos outros no sentido de dar tempo a todos para poderem intervir. O objectivo de estarmos a pedir que sejam mais concisos e mais objectivos é simplesmente na finalidade de poderem intervir cada vez mais alunos em cada debate. Portanto pedimos que lutassem para isso e que cumprissem esta nossa missiva em relação a isto, o.k.?
 
José Alberto Rodrigues
Ora muito boa tarde a todos. Muito rapidamente, 2 em 1. Nós não podemos confundir a estabilidade do quadro da administração pública com o comodismo e a estaticidade desses mesmos colaboradores. Portanto, quando se ouve as pessoas dizerem: “Boa, finalmente entrei na função pública portanto nunca mais saio daqui.” Não é isso que eu quero para o nosso país. Eu quero jovens que tenham interesse em ter uma mobilidade grande a nível do mercado de trabalho, e que não estejam a pensar em ficar estáticos a partir dos 22, 23 anos, até aos 65 anos, a fazer a mesma coisa durante toda a vida. Portanto não podemos pensar que a estabilidade é a mesma coisa que comodismo. Outro ponto: eu sou perito de recursos humanos na área da saúde, portanto trabalhei directamente nesta questão das parcerias público/privadas e tive que ir aos hospitais falar directamente com as pessoas. E apercebi-me que não há objectivos definidos, não há uma avaliação de desempenho rigorosa, não há uma avaliação global nem particular do capital humano. E pior: o regime corporativista e proteccionista da função pública não permite responsabilizar os gestores intermédios, nem tão pouco os gestores de topo. É essa a questão que eu deixo. É esta a reflexão que eu deixo também.
 
Para já muito boa tarde a todos. Gostaria de saber a vossa opinião acerca do congelamento dos salários. Para os professores, hoje em dia, se calhar, é uma obrigação ir dar uma aula - e não um gosto como era, se calhar, há uns anos atrás - devido ao congelamento dos salários. Gostaria de saber qual é a vossa opinião, Srs. Engenheiros. Boa tarde, Obrigado.
 
José Baptista

Muito boa tarde Dr. Manuel Lencastre e Dr. João Proença. Muito obrigado pela vossa presença. Magnífico Reitor e companheiro Daniel Fangueiro. A minha questão vem na sequência do que disse a companheira Joana Barata Lopes relativamente ao notariado. A minha mãe é notária, o pai da Joana Barata Lopes é o Bastonário da Ordem dos Notários. O notariado foi, a maioria do tempo, privado em Portugal. Deixou de o ser quando não havia condições económicas no país para se assegurar a sustentabilidade do sistema. O PSD lançou esta tradição de novo e o PS lança a conta gotas novos notários para a privatização mas, por outro lado, tira-lhes trabalho, tirando-lhes rendimentos, que é uma coisa que não passa pela cabeça de ninguém. Ao contrário – e peço-lhe desculpa mas são os dados que eu tenho – as receitas não diminuíram minimamente para o Estado. Aliás, a receita de emolumentos e de honorários foi para o Estado. Só que quem deixou de a receber foi o Ministério da Justiça e quem passou a receber foi o Ministério das Finanças. E a grande diferença é esta. Sr. Eng.º João Proença, a minha mãe tem um cartório privado que não tem nenhum funcionário! Sabe porquê, Sr. Eng.º? Nenhum funcionário do Estado. Sabe porquê? Porque os funcionários da minha mãe boicotaram totalmente o sistema, para o cartório iniciar funções (exactamente no dia seguinte ao dia em que tomou posse em Lisboa) sem uma única escritura marcada. Porquê? Porque os funcionários queriam ordenados astronómicos, superiores ao ordenado de um ministro. Aliás, há notários, por vários pontos do país, que para terem clientes tiveram que levar os funcionários que estavam nos cartórios. Porque todos sabemos como é que funcionam os cartórios públicos actualmente em Portugal. E esta é uma verdade que ninguém pode refutar. Além das taxas que foram incluídas nas escrituras e das taxas de honorários, foi incluída uma taxa que existe em todos os produtos, que é o IVA. E o IVA, agora que está nas escrituras, à taxa legal, é o Estado que o recebe. O Estado não perdeu receita alguma. E esta é maior verdade que se pode dizer. Quanto à comunicação social, que é um ponto essencial, está totalmente contra os notários. Há alguns dias o Bastonário da Ordem dos Notários fez um comunicado e o Expresso lembrou-se de ir buscar declarações do Sr. Secretário de Estado e comparar com um excerto da declaração do Bastonário, como se o Bastonário estivesse a favor do que o Secretário de Estado disse. Que é a coisa mais alucinante que há. Eu peço imensa desculpa por ter ocupado este tempo, eu não estou aqui como delegado pela Ordem dos Notários, mas eu acho que isto tinha que se pôr em cima da mesa, porque os colegas têm o direito de saber o que é que se passa com os notários de Portugal. Muito obrigado. 

Peço desculpa, peço desculpa. Há uma pergunta que eu não fiz. Relativamente aos funcionários... eu não fiz a questão. Não acha, que por este boicote ao sistema privado, os funcionários deviam ter sido punidos pelo que fizeram? Não acha que o Estado está a ir contra aos notários privados que investiram? Esta é a questão que eu faço.

 
Eng.Manuel Lancastre
Muito bem. A questão do vínculo é uma questão de discordância. Um funcionário público, por uma questão de justiça relativa, não deve ter um tratamento privilegiado em relação a um colaborador da iniciativa privada. Mas eu penso que felizmente tudo caminha para uma igualização destes dois tipos de vínculos. E, obviamente, que sou absolutamente favorável à mobilidade e à não total estabilidade. Com a total estabilidade corre-se o risco de que se transforme em comodismo. As pessoas têm que estar instaladas mas não completamente. E por isso estou absolutamente de acordo que um jovem que entre no seu mercado de trabalho não entre numa função para o resto da vida e vá experimentado algumas funções se tiver possibilidade de o fazer. A questão dos objectivos estarem definidos ou não é mais um dos males da forma como estamos. É mais um dos males da deficiente gestão da máquina da Administração Pública, mais uma consequência desse mal. Mas uma entre várias outras. Mas estamos de acordo que era óptimo que a lei 10/2004, da avaliação dos funcionários públicos, estivesse implementada e fosse eficaz.

Relativamente ao congelamento dos salários, obviamente que não é desejável que os salários sejam congelados por decreto. A questão é: é ou não necessário? Há muitas coisas que não são desejáveis, mas que conjunturalmente se tornam necessárias. E, relativamente a isto, não quero fazer aqui mais qualquer tipo de comentário porque eu penso que da forma como a questão foi colocada (se no limite achamos desejável), então não, eu não acho desejável. Agora a questão tem é que ser colocada sobre se é ou não necessário, e o que é que poderá ser feito para que essa situação seja desbloqueada.

Relativamente aos notários: perdem trabalho e, portanto, perdem rendimentos. O modelo de privatização foi aquele que foi... Pode não ter sido óptimo, mas foi aquele que foi colocado em cima da mesa. Provavelmente não foi também implementado de forma óptima mas nada nesta vida é absolutamente óptimo. Agora o que é um facto é que temos notários privados. E penso que quem tem acesso ao notário privado - não querendo dizer que não existem notários ainda públicos que funcionam muitíssimo bem - gosta. Marcar e ser recebido a horas, ter um cafezinho à sua espera, qualidade de serviço, etc. A profissão de notário é uma profissão ingrata porque, com esta tendência para simplificar os actos administrativos, é natural que há coisas que deixam de ser feitas nos notários e, portanto, a questão da compensação relacionada com as expectativas iniciais para quem iniciou uma actividade destas pode e deve ser colocada por quem representa os interesses dos notários, em diálogo construtivo com o próprio Estado. Obrigado.
 
Eng.João Proença
Começando pela questão dos notários, consideramos que é uma questão que deve ser devidamente avaliada, dentro em breve. É fundamental garantir a melhor prestação do serviço, e aparentemente o serviço na sua globalidade melhora. É fundamental também verificar se alguns pressupostos foram ou não cumpridos e eu continuo a considerar que a questão dos trabalhadores foi mal gerida. Isto não tem nada a ver com os notários particulares mas sim com a maneira como o Estado definiu o quadro de ligação entre os trabalhadores afectos a um dado notário, a uma dada unidade orgânica. Quero citar um exemplo: há uns anos, quando eu era dirigente sindical, o Instituto de Emprego tinha problemas sérios de gestão porque tinha trabalhadores que tinham vindo da Administração Pública e tinham o estatuto de funcionários públicos, promoções, remunerações, etc., tudo como funcionário público, e tinha os trabalhadores do contrato individual de trabalho que eram todos os que iam sendo contratados no futuro. Eu sugeri - e conseguiu-se um decreto-lei nesse sentido - que se permitisse a todos os trabalhadores da função pública optarem temporariamente pelo regime de contrato individual de trabalho, podendo voltar à situação de origem em determinadas condições. E criaram-se condições para todos optarem. E um organismo que era ingerível, com dois regimes de pessoal totalmente diferentes, passou a nunca mais ter problemas. Isto já foi há mais de uma dezena de anos e nunca mais houve problemas de gestão deste tipo. Portanto, estes problemas de gestão devem estar presentes em certo tipo de decisões. Nós defendemos o contrato individual de trabalho, por exemplo, nos institutos públicos. Defendemos o contrato individual de trabalho em todas as funções que não tenham a ver com o exercício da autoridade do Estado, com o exercício de funções de soberania. E o Estado tem definido muito mal o que é o contrato individual de trabalho e o que é esse tal regime estatutário. Passar do regime estatutário para o regime puro e simples do contrato individual de trabalho, é pôr em causa o conceito de administração pública. E não existe em mais nenhum país europeu este conceito da igualdade total. A diferença entre contrato individual de trabalho e regime estatutário não pode significar privilégios. Aí estamos de acordo! Mas são duas coisas diferentes. Não é um problema de privilégio, são duas coisas diferentes. A outra questão tem a ver justamente com a mobilidade. Nós temos de distinguir duas coisas: a mobilidade voluntária e a mobilidade forçada. Será que os jovens desta sala defendem a mobilidade forçada dos contratos a prazo? Todos serem toda a vida contratados a prazo, e portanto poderem ser despedidos a qualquer momento? É isso que está em causa. Essa é a mobilidade forçada. Porque a outra é a mobilidade voluntária. Eu estou num dado organismo mas quero mudar porque vou melhorar para melhor. É necessário criar mecanismos de mobilidade voluntária. Por exemplo, na Administração Pública havia um mecanismo que proibia completamente a mobilidade: eu se saísse perdia o direito à reforma entretanto acumulado. Isso acabou quando se criou um regime de pensão unificada. Diga-se, de passagem, que isto também existia no sector bancário. Eu estava num banco, tinha a minha pensão garantida pelo banco. Eu saía do banco para o banco ao lado e perdia todos aqueles anos. Porque não havia portabilidade dos fundos de pensões. Portanto, deve criar-se mobilidade nas sociedades e nas organizações, mas acho que devemos distinguir entre mobilidade forçada e mobilidade voluntária.

A última questão: congelamento de salários. Registo aqui que o PSD está de acordo com o Governo. É evidente que nós estamos contra. Estamos contra o congelamento dos salários tal como foi feito. De qualquer modo registamos que o congelamento dos salários foi feito por vários governos em vários anos. O último caso nem foi tanto um congelamento dos salários. Os salários até aumentaram em 0,5% ou coisa do género. Eu, já há uns anos que não tinha aumento de salário e tive um aumento de 1,5%. Mas a questão de congelar tudo o que é progressão nos escalões e nas carreiras é mais complicada. O Governo garantiu que era por ir negociar o novo sistema de carreiras até ao final deste ano. Estamos para ver, estamos para ver... Já se fala em continuar o congelamento dos escalões e isso parece-nos profundamente negativo. Parece-nos a destruturação total da Administração Pública. Significa que um funcionário público, faça o que fizer, nem vai ter aumento de salário, nem vai ter qualquer tipo de benefício futuro em termos de progressão de carreira porque a carreira está congelada não se sabe até quando.
 
Carla Fernandes
Boa tarde. A minha pergunta prende-se com a privatização das escolas, vista do ponto de vista dos alunos. Será que a privatização das escolas não iria melhorar a qualidade das instalações, dos serviços prestados, dos materiais, evitando também as escolas provisórias, muitas delas construídas em madeira, e com mais de 15 anos? Obrigado.
 
Isabel Costa Belo
Boa tarde. A minha questão é praticamente igual à da minha colega. Como docente, coloco a seguinte questão: num futuro próximo será solução o sector da educação vir a ser privatizado, perante a realidade e as dificuldades sentidas nas escolas?
 
Tomás Ribeiro
Obrigado. Parece-me que hoje pelo menos uma coisa ficou clara: que este tema é quase monopólio dos engenheiros. Primeiro foi o Eng.º António Guterres, e agora o Eng.º Manuel Lencastre e o Eng.º João Proença, juntamente com o Eng.º José Socrates, vêm comprovar esta teoria. Parece-me claro! Depois, apelando ao meu poder de síntese, e regressando um pouco no debate, parece-me que contrariar e evitar as parcerias público/privadas é um sintoma daquele famoso complexo de esquerda, que ainda hoje se manifesta em Portugal. Aliás, recordo com saudade os tempos em que se discutia seriamente o cheque educação. Recordo com saudade o tempo em que, de facto, as pessoas encaravam as parcerias público/privadas como uma alternativa séria e sólida. Eu penso que deve haver parcerias em todas as situações em que seja possível criar um mercado com concorrência, portanto em que não haja nem monopólio natural nem algumas situações especificas, como por exemplo o sistema prisional que pelas suas características, nomeadamente o facto de ser virado de ser virado para a reabilitação social, não poder ser sujeito a uma parceria público/privada. Até porque aos privados interessaria haver cada vez mais criminosos porque assim ganhariam cada vez mais dinheiro. Portanto, fora esta situação e mais uma ou duas, penso que as parcerias público/privadas serão sempre uma óptima solução. Em relação à minha pergunta: na senda do que disse o Prof. Jorge Braga de Macedo, que nos últimos anos foi feita uma análise comparativa a propósito do poder discricionário dos vários ministros das finanças na União Europeia, tendo-se chegado à conclusão que, em Portugal, o Ministro das Finanças tem muito menos possibilidades executivas e conjugando isso com o facto de haver funcionários públicos (algo que quer o Eng.º Manuel Lencastre quer o Eng.º Manuel Proença reconheceram) será que isso não inviabiliza uma verdadeira reforma da Administração Pública? Obrigado.
 
Eng.João Proença
Vamos abordar o problema da privatização das escolas. Nós estamos num sector em que há competição público – privado. No ensino primário, secundário, superior, há uma competição entre sector público e sector privado. Não é um sector reservado à Administração Pública. Salvo a Universidade Católica, as universidades públicas são consideradas as melhores e os alunos querem sobretudo ir para as universidades públicas. É um sector onde há propinas e há a questão da selecção da escola e, sendo os alunos a escolher, normalmente escolhem as públicas por serem melhores. Então e uma escola? (estamos a falar do ensino obrigatório). Então eu iria privatizar o ensino obrigatório?! Que eu saiba é a proposta do CDS. E o cheque educação é batalha - há muito - do CDS: dizer que o Estado devia pagar um cheque educação a cada pessoa, e a pessoa escolhia uma escola pública ou uma escola privada. O problema é que o ensino obrigatório deve ser gratuito e devem ser criadas as condições para que as pessoas tenham acesso ao ensino gratuito. Não é solução, passar um cheque educação e um pai ter que pagar um complemento. Se não tem dinheiro para o complemento, o aluno não vai à escola. Será que por a escola ser privada é melhor gerida? Não está demonstrado. Mas se é melhor gerida e se é mais lucrativa, então criem a escola privada. Não está proibido. Onde é que está a proibição? Porque é que não a criam? Porque é que querem a privatização da escola pública? Porque é que não criam a escola privada, visto que essa é claramente uma área de livre iniciativa? Nós defendemos - e bati-me muito como deputado no início dos  anos 90 – que é fundamental acabar com este conceito de o Estado financiar brutalmente os lares de idosos e criar condições através de um cheque serviço para os idosos poderem ter apoios em sua casa. Isso iria dinamizar a iniciativa privada e fomentar algumas iniciativas. Houve municípios que apostaram claramente nisso. É uma aposta que tem que ser feita, relativamente a certo tipo de serviços, fomentar certo tipo de iniciativas. Já agora também uma boca para os engenheiros. Há pouco tempo um jornal que estava a fazer um inquérito perguntou-me quem é que eu considerava o pior governante. Como não sei quem é o responsável da Administração Pública (se é o das Finanças se é o da Administração Interna) eu digo que o pior governante é o Secretário de Estado da Administração Pública que é um doutor, o Dr. João Figueiredo. Isto, perante as políticas ruinosas que vinha conduzindo e que continua a conduzir. Nós não podemos dizer que as funções executivas do Ministro das Finanças consistem em dizer claramente que os ministros podem fazer isto ou aquilo. Ele pode dizer que o ministro da economia pode admitir 20 funcionários em 2006 e é responsabilizado pelos 20. É o governo que decide no seu todo, por proposta do Ministro das Finanças mas não é o Ministro que tem de autorizar - uma a uma – as 20 contratações, autorizar que o Ministro admita um para motorista, outro para investigador... isto parece absurdo! Eu acho que, na área das privatizações, há um conceito de, em certas áreas, privilegiar o sector privado. Por exemplo, na questão das creches (o ensino pré-escolar), claramente o Estado está a deixar a administração directa e está a fomentar a iniciativa privada, mesmo que seja iniciativa autárquica. Por vezes também na área da acção social, há pouca iniciativa privada e demasiado poder público encapotado, porque quem financia verdadeiramente essas instituições - que se dizem privadas - é o poder público através de contratos-programa. É o Estado que financia as IPSS e as Misericórdias. Devia criar-se condições para uma maior autonomia e não para uma dependência tão directa do financiamento público.
 
Eng.Manuel Lancastre
Obrigado. Eu penso que o sector da educação é, de facto, muito rico e muito daquilo que nós estivemos aqui a conversar pode ser projectado neste sector, no sentido de avaliar até que ponto é que o sector está ou não globalmente preparado para um processo transferência para a iniciativa privada. É um sector muito complexo porque, de facto, a iniciativa privada tem campo aberto mas, provavelmente, não tem vontade de se mover, geograficamente, para locais onde acha que não vai ter rentabilidade. E portanto, é um sector que, por questões geográficas, pode não funcionar. E não funcionando há direitos fundamentais que não são assegurados e por isso é fundamental que o Estado mantenha uma intervenção forte. E, nesse sentido, aquilo que o PSD propõe é apenas uma profissionalização da gestão. Apenas uma profissionalização da gestão no âmbito do Estado. Não quer dizer que, em alguns casos, não possam ser adoptadas outro tipo de soluções, se existirem condições para tal.

Relativamente ao congelamento de salários - e o PSD não se pronunciou nesta matéria - é indesejável e nem sequer é sustentável porque está totalmente relacionada com a motivação de quem exerce a sua profissão. Agora relativamente a esta questão, por uns pagam todos. E provavelmente paga quem não tem a maior responsabilidade relativamente ao problema. A solução passa por um compromisso político de quem gere o orçamento de Estado. E portanto cabe ao governo decidir se sim ou não, até quando e em que condições.

Relativamente à questão das parcerias público/privadas, obviamente são desejáveis, em contexto específicos, como aqui foi dito. E para finalizar gostava de insistir numa tecla, uma vez que isto é uma universidade de Verão do PSD. Falou-se aqui das funções do Estado e falou-se aqui da questão do excesso de funcionários públicos. É fundamental que isto fique bem assente: a posição do PSD é totalmente distinta da posição do PS que é uma posição socialista relativamente às funções do Estado. A posição do é manter tudo como está. Mas ao mesmo tempo que mantém cria uma tremenda confusão. Portanto mais valia não fazerem rigorosamente nada. Nós somos pela evolução, com os pés bem assentes na terra, e com respeito por quem trabalha dentro do Estado. Era tudo o que eu tinha para dizer. Agradeço, mais uma vez, imenssíssimo à plateia e o convite que amavelmente me fizeram. Muito obrigado.   
 
Dep. Carlos Coelho
Eu é que agradeço em nosso nome, ao Eng.º João Proença e ao Eng.º Manuel Lencastre... João, por amor de Deus...
 
Eng.João Proença
Eu não tinha a noção que era a última intervenção portanto queria repetir o agradecimento. Queria também dizer que, relativamente à distinção entre PS e PSD, nomeadamente nesta área de clarificação das funções do Estado, vou verificar melhor se realmente o PSD defende pura e simplesmente o Estado fiscalizador. Porque nos parece uma coisa profundamente negativa, sobre todos os pontos de vista, e inaceitável. Nós vamos receber o líder do PSD, na Segunda-feira na UGT e há uma proposta do PSD que nós achamos que deve ser ponderada e analisada e vimo-lo dizendo: o regime de capitalização da Segurança Social. Outra coisa totalmente diferente que não nos passa pela cabeça é a privatização da Segurança Social. Esta discussão é uma questão central. Relativamente ao PS, e sobretudo, relativamente ao Governo, parece-nos que neste programa de reestruturação da Administração Pública, a tal Comissão de Sábios apresentou uma proposta que não se sabe bem o que é. Não define quais são as funções do Estado que interessa manter, propõe a extinção de organismos - eu próprio faço parte de um organismo a extinguir, não pelo PRACE mas pelos laboratórios do Estado. Portanto, há de facto clarificações que são fundamentais. Mas continuo a dizer: há que ter presente que o tema das funções do Estado é uma discussão permanente, em que o quadro geral é definido pela Constituição, aprovado pelo PS e pelo PSD e depois na sua aplicação prática há nuances que vão evoluindo no tempo mas que têm que ter sempre presente a necessidade fundamental de uma melhor administração. Muito obrigado.   
 
Dep. Carlos Coelho
Em nosso nome agradeço ao Secretário Geral da UGT e ao Vice-presidente do PSD o facto de terem aceite o nosso convite, e de se terem prestado a responder às nossas perguntas. Peço ao Alexandre Picoto e aos Avaliadores que venham aqui para os procedimentos que se seguem. Eu vou com o Daniel acompanhar os nossos convidados à saída, e regresso dentro de 1 minuto.

 
Dep. Carlos Coelho
Três coisas breves. Primeiro: à saída quando depositarem o vosso voto, vão recolher um impresso para quem estiver interessado em inscrever-se na visita a Castelo de Vide - que se fará amanhã -  para termos uma ideia de quantas pessoas são, para articular com a Câmara Municipal os guias turísticos, uma vez que vai ser um passeio a pé. Precisamos de ter uma ideia de quantos é que estão interessados e portanto pedia para preencherem e devolverem até ao final do jantar.

Segunda coisa: eu estive a ler com atenção as sugestões e os achei curiosos, e agradeço a vossa participação. Há alguns que vamos adoptar em posteriores edições e outros que vamos tentar ver se adoptamos já. Há no entanto um conjunto grande de sugestões para colocarmos on line os power points das apresentações. É seguramente culpa nossa não ter ficado claro que isso já está on line. Vocês já podem fazer o donwload, os power point e os filmes do Falar Claro, todos eles. Havia pessoas que pediam alguns filmes em particular (de Jerónimo de Sousa, etc.). Os filmes estão lá, e portanto isso já está. Os power points desta sessão que acabámos de fazer já estão on line, e portanto esses elementos todos podem ser obtidos. Peço desculpa se não tinha sido claro porque, o conjunto de sugestões neste sentido, significa que não tinha sido claro. Agora espero que tenha ficado. Recorda-me o Paulo Colaço que algumas entrevistas a que vocês não têm acesso agora, terão acesso mais tarde. Há mais algumas sugestões que também as vamos aceitar como a de juntarmos todos estes contributos num CD ROM. Não será possível dar-vos nesta semana mas quando vos dermos os certificados de participação, os diplomas da Universidade, vamos dar-vos um CD ROM com as actas da universidade, com tudo aquilo que vocês fizeram, tudo aquilo que aqui aconteceu, fotografias, etc., e também com algumas das coisas que vocês não se apercebem que estão a acontecer, mas que se forem à Intranet vão aperceber-se. Por exemplo, o Paulo colaço, pelo JUV, faz muitas entrevistas - aliás alguns de vocês já foram entrevistados oralmente - e pequenas transcrições aparecem no JUV. Ora os registos dos depoimentos orais, designadamente dos participantes mas também dos nossos convidados, vão estar disponíveis na Intranet, a partir desta noite. É giro ver porque, se vocês não sabiam passam a saber, o Paulo Colaço é um bocado atrevido - alguns de vocês já devem ter percebido – e, por exemplo, à saída apanhou o Eng.º João Proença e o Eng.º Manuel Lencastre, juntou-os, pôs o gravador à frente dos dois e disse: “Bem, agora digam lá, qual dos dois é que ganhou o debate”. Tem a sua piada ver como é que eles reagem. Eu não sei como é que eles reagiram porque ouvi-o fazer a pergunta mas vim cá para dentro. Mas hoje à noite irei à Intranet, saber qual foi a resposta que eles deram.

Finalmente, antes de irem para o lanche e antes de, depois de retomarem às 17h30 os vossos trabalhos de grupo: o vosso trabalho de grupo desta tarde vai ser diferente. Vamos pedir-vos apenas uma coisa, o que significa que, se gerirem bem o tempo, vão ter mais tempo para trabalhar no programa do PSD. O vosso trabalho de grupo vai ser escrever um press release, uma nota à imprensa, sobre o debate que acabaram de ouvir. Este é o cenário: nós vamos ter que enviar para a comunicação social, esta noite, um comunicado a retratar aquilo que aconteceu aqui esta tarde no debate entre o Eng.º João Proença e o Eng.º Manuel Lencastre, e são vocês vão fazer esse press release. Os 10 press releases vão ser enviados hoje, assim que tiverem acabado os trabalhos de grupo, a um jornalista profissional, que os vai pontuar e vai dizer quais foram os 3 melhores, justificando a sua opção. Todos os 10 vão ser publicados na Intranet com as respectivas pontuações, e o JUV publicará 1, 2 ou 3. Vamos ver ainda qual é o espaço que temos para isso. Portanto haverá uma distinção no JUV e todos serão integrados na Intranet. Os press releases não podem exceder os 1.500 caracteres sem espaços. Como sabem há 2 contabilidades: uma com espaços e outra sem espaços. O que nos interessam são os caracteres e não os espaços, portanto interessa-nos a conta mais pequena: 1.500 caracteres é o limite para o press release. É esse o trabalho de grupo para esta tarde. Até já. Muito obrigado.